É desejável desacelerar o
ritmo do envelhecimento populacional?
A resposta não é clara, pois
o envelhecimento populacional pode ser visto de formas diferentes:
Visão positiva: Aumentar a
expectativa de vida é um sinal de desenvolvimento e progresso de uma sociedade.
Visão preocupante: Um ritmo
acelerado de envelhecimento causa desafios significativos para os sistemas de
saúde, previdência social e mercado de trabalho, tornando a transição mais
difícil.
Como promover um
envelhecimento saudável e de qualidade?
Para lidar com as
consequências do envelhecimento populacional, é necessário investir em:
Políticas públicas: Incluem a
criação de programas de assistência social e auxílio ao idoso, a inclusão de idosos
no mercado de trabalho e a criação de políticas de prevenção a doenças.
Cuidados de saúde:
Prevenção: Promover hábitos
de vida saudáveis, como alimentação balanceada e prática regular de exercícios
físicos.
Cuidado integrado:
Acompanhamento médico por meio de uma atenção primária de qualidade e o uso de
tecnologia para o cuidado remoto podem evitar hospitalizações desnecessárias e
o uso excessivo de medicamentos.
Integração social e
profissional:
Mercado de trabalho: Fomentar
o desenvolvimento de programas de treinamento para que profissionais mais
velhos possam se manter competitivos e para incluí-los em funções que se
adaptam às novas tecnologias.
Bem-estar: Garantir que os
idosos tenham acesso a atividades culturais, sociais, mobilidade e equipamentos
de atenção e cuidado.
Por que o envelhecimento não
deve ser o alvo principal?
Em vez de tentar desacelerar um processo natural, a sociedade deve focar em adaptar-se a ele, buscando soluções que garantam um futuro com mais saúde e bem-estar para todos.
Como aproveitar o bônus demográfico da longevidade para impulsionar crescimento sustentável e combater mitos sobre o envelhecimento.
Dados da ONU mostram que
população brasileira idosa pode ser motor de desenvolvimento econômico até
2060, contrariando visões pessimistas sobre transição demográfica
No dia 01 de outubro se
comemora o Dia Internacional das Pessoas Idosas e o Dia Nacional do Idoso. É
uma boa data para se refletir sobre o processo de envelhecimento do mundo e do
Brasil, que está passando por um profundo e rápido processo de mudança da
estrutura etária. Pela primeira vez na trajetória humana há mais idosos de 60
anos e mais no mundo do que crianças de 0 a 4 anos. Em breve os 60+ vão superar
os jovens de 0-14 anos.
O envelhecimento populacional
é a consequência inexorável da transição demográfica, que ocorre em função da
redução das taxas de mortalidade e natalidade. Não custa lembrar que a
transição demográfica é a maior conquista material e cultural da história da
humanidade.
Durante mais de 200 mil anos
– desde o surgimento do Homo sapiens – até o final do século XVIII, as taxas de
mortalidade eram elevadas e a expectativa de vida ao nascer da população
mundial girava em torno dos 25 anos. A mortalidade infantil era extremamente alta,
a mortalidade materna era um perigo para todas as mulheres grávidas e apenas
cerca de 5% dos sobreviventes chegavam ao grupo etário 60+.
Mas tudo isto mudou e a
expectativa de vida mundial se aproximava de 75 anos (3 vezes maior do que os
25 anos do passado) e já ultrapassou 76 anos no Brasil. Quando as pessoas
percebem que vão viver mais tempo, elas têm um incentivo maior para investir em
educação e saúde. Isso ocorre porque o período para colher os frutos desses
investimentos, como maiores salários e melhor qualidade de vida, se estende.
O aumento da expectativa de
vida fortalece os laços familiares e permite uma maior contribuição dos
indivíduos em diferentes estágios da vida:
• Apoio e Cuidado
Intergeracional: Avós e bisavós podem desempenhar um papel ativo no cuidado e
educação dos netos e bisnetos, oferecendo apoio emocional, financeiro e
prático. Isso libera os pais para se concentrarem em suas carreiras e no
desenvolvimento econômico.
• Estabilidade Familiar:
Famílias com membros mais velhos saudáveis podem se beneficiar da experiência e
do conselho desses membros, contribuindo para a tomada de decisões e a
resolução de problemas.
• Herança de Conhecimento: O
conhecimento cultural, as tradições e as histórias familiares são preservados e
transmitidos de geração para geração, fortalecendo a identidade familiar e
social.
Uma população com maior
expectativa de vida é um ativo valioso para a sociedade como um todo:
• Engajamento Cívico:
Indivíduos mais velhos e saudáveis podem continuar a participar ativamente da
vida cívica, seja através do voluntariado, da participação em associações
comunitárias ou da contribuição para o debate público.
• Capital Social: Pessoas que
vivem mais tempo têm a oportunidade de construir redes sociais mais amplas e
duradouras, promovendo a coesão social e o apoio mútuo na comunidade.
• Inovação e Mentoria:
Profissionais mais experientes podem atuar como mentores para as gerações mais
jovens, transmitindo habilidades, conhecimentos e valores. Essa troca de
experiências impulsiona a inovação e o desenvolvimento em diversas áreas.
A relação entre maior
longevidade e crescimento econômico é amplamente reconhecida:
• Força de Trabalho
Qualificada: O investimento em capital humano, impulsionado por uma maior
expectativa de vida, leva a uma força de trabalho mais produtiva e inovadora.
Isso resulta em maior produção de bens e serviços.
• Consumo e Poupança:
Indivíduos que esperam viver mais tendem a poupar mais para a aposentadoria, o
que pode aumentar a disponibilidade de capital para investimentos. Além disso,
uma população maior e mais longeva também representa um mercado consumidor mais
robusto.
• Geração de Renda: Pessoas
que trabalham por mais tempo contribuem com impostos e outras receitas para o
governo, que podem ser reinvestidas em infraestrutura, saúde e educação,
criando um ciclo virtuoso de desenvolvimento.
Mas a queda das taxas de
mortalidade é apenas uma das pernas que sustentam o avanço do envelhecimento
populacional. A outra perna é a redução das taxas de natalidade. Com o aumento
da sobrevivência do número de filhos, as famílias perceberam que não precisavam
ter inúmeras crianças para garantir o número ideal de filhos. Além disto, na
sociedade urbano-industrial os casais possuem outras prioridades além da
reprodução. Desta forma, a natalidade cai não por escassez de recursos, mas sim
por abundância de alternativas.
A queda das taxas de
natalidade e fecundidade é um fenômeno com profundas implicações para o
enriquecimento de famílias, da sociedade e da economia. Longe de ser apenas uma
diminuição no número de nascimentos, ela desencadeia uma série de mudanças
positivas que promovem o desenvolvimento humano e econômico.
Otimização do Tempo e
Investimento em Capital Humano. Com menos filhos, os pais podem dedicar menos
tempo e recursos às tarefas domésticas relacionadas à reprodução e criação de
um grande número de crianças. Isso se traduz em:
• Menos Tempo em Cuidado
Direto: A necessidade de cuidar de múltiplos filhos demanda um tempo considerável
em atividades como alimentação, higiene, supervisão e transporte. Com menos
filhos, esse tempo é drasticamente reduzido.
• Mais Oportunidades para o
Trabalho Remunerado: Principalmente para as mulheres, a diminuição da carga
doméstica da reprodução libera tempo para buscar educação formal, ingressar ou
permanecer no mercado de trabalho e progredir em suas carreiras. Isso aumenta a
renda familiar e a contribuição para a economia.
• Aumento do Investimento por
Criança: Em vez de distribuir recursos escassos entre muitos filhos, as
famílias com menos crianças podem investir mais em cada uma delas. Isso
significa melhores oportunidades educacionais, desde a educação infantil até o
ensino superior, e acesso a cuidados de saúde de maior qualidade. Esse investimento
“da quantidade para a qualidade” resulta em indivíduos mais bem preparados para
o mercado de trabalho e para a vida em sociedade, elevando o capital humano da
nação.
A relação entre a queda da
natalidade e o empoderamento feminino é fundamental para:
• Autonomia Reprodutiva:
Menos filhos significam que as mulheres têm maior controle sobre seus corpos e
suas escolhas reprodutivas. Isso lhes permite planejar suas vidas de forma mais
eficaz, perseguir objetivos pessoais e profissionais.
• Participação no Mercado de
Trabalho: Ao serem liberadas das demandas de grandes famílias, as mulheres têm
mais tempo e energia para se dedicar aos estudos e ao trabalho. Isso não só
contribui para a renda familiar, mas também promove a igualdade de gênero,
desafiando papéis sociais tradicionais e ampliando as oportunidades femininas
em diversas áreas.
• Liderança e Inovação: Com
mais mulheres capacitadas e engajadas no mercado de trabalho, a sociedade se
beneficia de uma maior diversidade de talentos e perspectivas, impulsionando a
inovação e o desenvolvimento em todos os setores.
Mobilidade Social Ascendente.
Famílias menores, em geral, possuem maior potencial para promover a mobilidade
social ascendente de seus membros:
• Concentração de Recursos:
Ao ter menos filhos, os pais podem concentrar seus recursos financeiros e tempo
em cada criança, oferecendo-lhes melhores condições de vida, educação de
qualidade e acesso a oportunidades que podem ser decisivas para o sucesso.
• Menos Competição por
Recursos Dentro da Família: Em famílias grandes, os recursos (sejam eles
financeiros, tempo dos pais ou acesso a bens) precisam ser divididos entre mais
pessoas, o que pode diluir o investimento em cada indivíduo. Famílias menores
reduzem essa competição.
• Acesso a Melhores Redes e Oportunidades: Com um foco maior na qualidade de vida dos filhos, os pais podem investir em experiências, atividades extracurriculares e redes sociais que ampliam o horizonte de seus filhos e lhes abrem portas para o futuro, facilitando a ascensão social.
Benefícios Macroeconômicos e Sociais. Em um nível mais amplo, a queda da natalidade, especialmente quando acompanhada de uma força de trabalho produtiva, pode gerar um “bônus demográfico”:
• Aumento da Renda Per
Capita: Com menos bocas para alimentar e mais pessoas em idade produtiva, a
renda média por habitante tende a aumentar, levando a um maior poder de compra
e bem-estar.
• Melhora nos Serviços
Públicos: Governos podem investir mais em educação, saúde e infraestrutura por
cidadão, já que há menos demanda por serviços básicos para uma população em
rápido crescimento. Isso qualifica a força de trabalho e melhora a qualidade de
vida geral.
• Crescimento Econômico
Sustentável: Uma população mais bem-educada e saudável, combinada com o aumento
do investimento em capital humano, impulsiona a produtividade e a inovação,
fundamentais para um crescimento econômico sustentável a longo prazo.
É importante notar que,
embora a queda da natalidade traga muitos benefícios, ela também apresenta
desafios. No entanto, o foco no investimento em capital humano, no
empoderamento das mulheres e no investimento nas novas gerações pode mitigar
esses desafios, transformando-os em oportunidades para um futuro mais próspero
e equitativo. Não existe país rico e com elevado bem-estar da população com
altas taxas de natalidade. A queda da fecundidade é necessária para a Agenda
2030 da ONU e as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Desta forma, famílias com menor número de filhos são essenciais para o progresso
social e ambiental das nações.
Diante de tantas vantagens da
transição demográfica e da transição da fecundidade, cabe perguntar se vale a
pena aumentar a fecundidade das mulheres brasileiras hoje, para desacelerar o
processo de envelhecimento no futuro?
Há diversas pessoas que
defendem a ideia de aumentar o número de filhos por mulher para evitar que o
número de idosos ultrapasse em muito o número de crianças nas próximas décadas.
Evidentemente, esta postura traria um dilema ético e um potencial conflito de
gerações, pois teríamos de explicar para estas crianças que elas vieram ao
mundo não com um projeto próprio, mas sim vieram à luz com a incumbência de
cuidar dos idosos.
A idade mediana da população
brasileira em 2024 era de 34,4 anos (ou seja, metade da população tinha menos
de 34,4 anos e a outra metade estava acima desta idade). Na hipótese média da
TFT, que é a projeção mais provável, a idade mediana da população brasileira
ficaria em 46,3 anos em 2060. Se a taxa de fecundidade cair, como na hipótese
baixa da TFT, a idade mediana ficaria em 50,7 anos em 2060. E se a taxa de
fecundidade subir, como na hipótese alta da TFT, a idade mediana ficaria em
41,6 anos.
Portanto, sem dúvida, o
aumento da fecundidade teria o efeito de desacelerar o envelhecimento da
população. Contudo, o maior número de filhos por mulher também teria o efeito
de aumentar a razão de dependência demográfica.
O gráfico abaixo mostra que a razão de dependência estava em torno de 44,3 idosos de 65 anos e mais para cada 100 pessoas em idade ativa de 15-64 anos. Na hipótese média da TFT, a razão de dependência ficaria em 67,2 idosos 65+ para cada 100 pessoas 15-64 anos. Na hipótese baixa da TFT, a razão de dependência ficaria em um valor menor, de 65 idosos 65+ para cada 100 pessoas 15-64 anos. Na hipótese alta da TFT, a razão de dependência ficaria em um valor maior, de 70 idosos 65+ para cada 100 pessoas 15-64 anos.
Portanto, se o Brasil passasse a adotar políticas pronatalistas para aumentar as taxas de fecundidade, este fato teria o efeito de reduzir a idade mediana em relação ao valor que se chegaria em 2060, na hipótese de TFT média. Ou seja, haveria uma pequena desaceleração do processo de envelhecimento populacional. Porém, haveria um aumento da razão de dependência demográfica, acelerando o fim do 1º bônus demográfico.
Na prática, aumentar as taxas
de fecundidade para manter uma estrutura etária perpetuamente jovem seria o
mesmo que descobrir o elixir da eterna juventude, o que só ocorre nos contos de
fada. Ao invés de jogar a “carga do envelhecimento” sobre as novas gerações, o
mais correto seria romper com a ideia de que o envelhecimento populacional é
sinônimo de incapacidade e dependência.
Assim, ao invés das políticas
públicas tentarem interromper o envelhecimento (incentivando ou forçando o um
aumento do número de filhos e netos), o melhor seria buscar as oportunidades
geradas por este processo de mudança na composição intergeracional. O mais
apropriado seria aproveitar todo o potencial da população em idade ativa e
também criar condições para que o Brasil invista em idosos ativos, saudáveis,
com altos níveis educacionais e com ótima qualidade de vida, para aproveitar o
2º bônus demográfico (bônus da produtividade) e o 3º bônus demográfico (ou
bônus da longevidade), no sentido de impulsionar a economia prateada.
Entre a população de 15 a 64 anos, no primeiro semestre de 2025, o Brasil tinha mais de 7 milhões de desempregados (desemprego aberto), tinha cerca de 18 milhões de pessoas subutilizadas, tinha cerca de 10 milhões de jovens que nem estavam na escola ou no mercado de trabalho (geração nem-nem), tinha cerca de 40 milhões de trabalhadores na informalidade, além de grande desperdício do potencial do trabalho feminino. Se houvesse aproveitamento de toda esta força produtiva as condições de vida e o equilíbrio fiscal teriam consideráveis melhoras.
E se o envelhecimento não fosse inevitável, mas uma doença curável?
Se essa ideia controversa
ganhar aceitação, poderá mudar radicalmente a maneira como tratamos o
envelhecimento.
Acima de tudo, é preciso
mudar o olhar sobre a mudança da estrutura etária. É preciso abandonar a visão
do envelhecimento associado a custo, declínio e inatividade e sim como uma fase
de autonomia, funcionalidade e protagonismo. Segundo relatório do FMI (abril de
2025), houve avanços significativos nas capacidades físicas e cognitivas da
população 60+. Os velhos de hoje são mais saudáveis e funcionais do que
gerações anteriores da mesma idade. O relatório afirmar que, em termos
cognitivos, “os 70 são os novos 50”.
O relatório “The Path to 2075
– The Positive Story of Global Aging” do grupo Goldman Sachs (20/05/2025)
mostra que a transição para o prolongamento da vida ativa já está encaminhada,
sendo que a vida ativa média aumentou em 4 anos nas economias desenvolvidas,
compensando o aumento da razão de dependência demográfica.
Como mostrei no artigo
“Decrescimento populacional e aumento do bem-estar na Sérvia”, publicado no
Ecodebate (Alves, 17/07/2024), o envelhecimento populacional da Sérvia não
provocou estagnação econômica e aumento da pobreza. Ao contrário, a renda per
capita da Sérvia mais que dobrou entre 2000 e 2025, mesmo com decrescimento da
população em idade ativa e da população total do país.
Portanto, envelhecer com saúde e atividade não é apenas viver mais, mas viver melhor — individual e coletivamente. Aproveitar esse novo ciclo exige combater o etarismo e promover políticas que valorizem a longevidade como um ativo estratégico. Prolongar uma vida saudável, colaborativa e feliz é, além de um imperativo ético, uma escolha inteligente para o desenvolvimento sustentável e para a convivência intergeracional.
Mais expectativa de vida, longevidade e envelhecimento da população.
Ao invés de aumentar as taxas
de fecundidade, o melhor seria garantir a autonomia, a independência e a
capacidade colaborativa das gerações prateadas de 50 anos e mais, que serão
maioria da população brasileira no final do atual século. O futuro do Brasil
vai depender cada vez mais da população idosa. (ecodebate)








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