quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Nosso lixo de cada dia

A Natureza, como sempre, é sábia. Não exatamente isso. Ela é a resultante de 3,7 bilhões de anos de exercício da dinâmica evolucionária dos seres vivos, fundamentada na força de atração ou repulsão dos átomos. Ela se definiu, fundamentalmente, pelas condições temporais do meio ambiente da ocasião, provocando o ajustamento ou perecimento das espécies surgidas em seu bojo, com o consequente aprimoramento e fortalecimento da Vida planetária. Atualmente, a Natureza tem uma experiência de adaptação de mais de três bilhões de anos. Isso deveria causar grande inveja ao infantil e arrogante “homo sapiens” que tem existência aproximada de 50 mil anos. Não só inveja. Respeito, admiração, aprendizado e submissão, tal como a emoção vivencial da criança perante o pai ou a do adulto ante Deus. A Natureza, “quando viu que seu trabalho de criação estava pronto”, ofereceu esse Paraíso ao homem, juntamente com as potencialidades da razão. Daí em diante, tudo ia bem até que alguém inventou a propriedade da terra, não percebendo que isso equivalia a mutilar seu Paraíso e esquecendo que a terra não o acompanharia na morte. Pelo contrário, ela o engole na sepultura. Em consequência, foi preciso inventar o dinheiro, inicialmente representado pelo ouro extraído da terra, que gerou a noção material de valor, produzindo uma volúpia de posse tão forte e infinita que passou a governar o mundo até os dias atuais. No planeta, o corpo de tudo que tem vida – produtos orgânicos – se recicla naturalmente. A Natureza o faz em ritmo próprio, reduzindo-o ao ponto inicial de outro ciclo vivencial; automaticamente e de graça. Um animal qualquer pode comer uma banana e jogar a casca no chão que ela, com a intervenção dos microorganismos, volta à mineralização, alimento básico do reino vegetal e, consequentemente, de toda a cadeia alimentar. As folhas de uma árvore que caem sob a copa no outono são, da mesma forma, mineralizadas, voltando a alimentar a Vida. Em princípio, tudo que existe na biosfera é orgânico ou será metabolizado para a finalidade. Os metais, associados a um sal, fazem parte das condições vitais, mas puros – chamados metais pesados – constituem veneno. O ecossistema aceita em seus domínios produtos inorgânicos, mas dentro de certas condições e quantidade que não prejudiquem o equilíbrio ambiental. No entanto, a atividade fabril moderna joga no ambiente os metais pesados e diversos subprodutos químicos, envenenando nossos meios básicos de vida. É a irracionalidade sobrepujando o conhecimento. Isso tem nome: suicídio. Dizem os informes estatísticos que o descarte mundial aumentou em 7,7% de 2008 para 2009, percentual superior ao aumento populacional. Claro! O modernismo, com suas tecnologias de conforto, produz bens em quantidade suficiente para atender aos desejos crescentes de consumir, consumir, consumir, o que redunda em mais lixo, lixo, lixo. Potencialmente, tudo o que é produzido hoje pelas indústrias será lixo num futuro em curto, médio ou longo prazo, dependendo do desgaste ou dos caprichos e potencialidades do desejo humano. Vejamos em nossa casa quanto lixo potencial está guardado. A manipulação química em grande escala dos combustíveis fósseis, materiais radioativos e dos compostos inorgânicos, extraídos da crosta terrestre, introduz no paraíso terrestre elementos estranhos – em quantidade enorme – que deturpam as condições mínimas para a existência dos seres vivos. Isso equivale a dizer que as atividades industriais estão destruindo o paraíso, o que pode ser visto ou deduzido por qualquer humano capacitado para se informar e pensar. Boiando no oceano Pacífico Norte acha-se a maior concentração de resíduos do mundo, equivalente ao Estado do Paraná, constituído principalmente de material plástico descartado pelos irresponsáveis do mundo e que são muitos; justamente o excesso populacional. Ouve-se com muita frequência a expressão “jogar fora”. Isso não existe. Emprega-se geralmente essa frase no sentido de destruir. Nada se destrói; muda-se algo de lugar ou se o transforma. Essa é a lei física. Lixo é definido como tudo o que não tem utilidade. Basicamente, só não é lixo o alimento dos seres vivos. O mais é ou o será. Incinerando-o, ele não é destruído. É transformado em gases venenosos e cinza que, mais cedo ou mais tarde, se depositarão sobre a terra, ocasionando a dispersão do que ainda continua a ser lixo por muito tempo. A Natureza o transforma no final, mas no ritmo dela, completamente incompatível com a pressa da modernidade. Enquanto o progresso se move a 100 km/h, a Natureza age ao compasso de 0,1 cm/h. Essa defasagem é mortal. Segundo informes estatísticos, um brasileiro produz em média 4 k de lixo inorgânico por mês. Os americanos, 10 k por mês. O mundo, 5 k. Isso equivale à produção mensal mundial de 33.500.000 toneladas de entulhos, representando uma sobrecarga enorme para o meio ambiente. E cada vez, esta civilização equivocada produz mais lixo. Até quando? A modernidade americana, representada pelo seu povo, “joga fora” computadores, geladeiras, automóveis, ao tempo em que compram outros novinhos, atualizados pelo último lançamento, procedendo assim ao acúmulo crescente de lixo e manutenção do vício de consumir. No Brasil, já vemos nas grandes cidades o descarte de objetos em bom estado, como sapatos, televisores, colchões, roupas, pelo simples fato de que eles estão fora da moda. Pensando bem – sem conotação metafórica –, o planeta está se transformando num imenso lixo. (EcoDebate)

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