A
maior parte dessas emissões é resultado do desmatamento — segundo o MapBiomas
Alerta, 98% do desmatamento na região tem indícios de ilegalidade
Segunda
edição do SEEG Municípios revela quanto cada cidade emitiu e em quais setores;
os dez maiores emissores no setor agropecuário não estão entre aqueles com
maior PIB.
Oito
dos dez municípios que mais emitem gases de efeito estufa no país estão na
Amazônia, onde o desmatamento é a principal fonte de emissões. Altamira e São
Félix do Xingu, no Pará, lideram a lista, seguidos por Porto Velho (RO) e
Lábrea (AM). São Paulo e Rio de Janeiro são os únicos de fora da Amazônia entre
os campeões de emissões, na quinta e oitava posições, respectivamente. Em 2019,
os dez municípios emitiram juntos 198 milhões de toneladas brutas de dióxido de
carbono equivalente (MtCO2e), mais do que todas as emissões de
países como Peru e Holanda. É o que revela a segunda edição do SEEG Municípios,
uma iniciativa do Observatório do Clima.
O
SEEG calculou as emissões de gases de efeito estufa de todos os 5.570
municípios brasileiros. O levantamento cobre duas décadas (2000-2019) e inclui
mais de uma centena de fontes de emissão nos setores de energia, indústria,
agropecuária, tratamento de resíduos e mudança de uso da terra e florestas.
As
emissões em Altamira (PA), líder do ranking, atingiram 35,2 MtCO2e
em 2019. Se fosse um país, o município do Pará seria o 108º do mundo em
emissões, à frente de Suécia e Noruega, segundo dados do CAIT, o ranking global
de emissões do World Resources Institute.
O
estudo mostra que, na última década, as emissões na Amazônia se concentraram no
sudoeste do Pará, em Porto Velho (RO) e Lábrea (AM). A maior parte dessas
emissões é resultado do desmatamento — segundo o MapBiomas Alerta, 98% do
desmatamento na região tem indícios de ilegalidade.
A
Amazônia encabeça o ranking de emissões per capita. Dos dez municípios com mais
emissões por habitante, 6 são de Mato Grosso, 3 do Pará e 1 do Amazonas. Em
Novo Progresso (PA), por exemplo, epicentro do desmatamento no eixo da BR-163,
foi registrada a décima maior emissão por habitante do país: 580 toneladas de
CO2e por ano, ou seja, 14 vezes a emissão de um cidadão do Qatar, o
país com maior quantidade de carbono per capita do planeta. É como se cada
morador de Novo Progresso tivesse mais de 500 carros rodando 20 km por dia com
gasolina. A média global é de 7 toneladas de CO2e ao ano por
habitante.
Por
outro lado, municípios amazônicos extensos com muitas áreas protegidas também
têm grandes remoções de carbono — quando subtraídas as remoções das emissões
totais, chega-se às chamadas emissões líquidas. O campeão de remoções é
Altamira, o maior município do país em área, que teve remoções de 25,7 MtCO2e
em 2019. O levantamento destaca a importância de criar e manter Unidades de
Conservação (UC) e Terras Indígenas (TI).
Emissões
x PIB Agropecuário
Em 2019,
o setor agropecuário foi o maior emissor em 67% dos municípios brasileiros, com
destaque para a fonte gado de corte.
Nesta
edição, o SEEG cruzou dados de emissão com o valor do PIB Agropecuário nos
municípios, levantado pelo IBGE. O levantamento mostra que os dez municípios
mais emissores em 2019 não estão entre aqueles com maior PIB Agropecuário. Ou
seja: as emissões não resultam em ganhos econômicos para os municípios.
Os
dez com maior PIB Agropecuário possuem o perfil de emissões e de uso do solo mais
relacionados com atividades de produção agrícola, diferentemente dos dez que
mais emitem, que têm atividades relacionadas com a pecuária. Isso demonstra
como as escolhas de uso da terra influenciam as emissões nos municípios.
O
levantamento também aponta que, de 2000 a 2019, entre os dez municípios mais
emissores, houve aumento de 2,13 milhões de hectares de pastagem (em vez do
aproveitamento de áreas já abertas). Mais da metade (56%) encontra-se em algum
estágio de degradação. Isso indica o potencial de recuperação dessas áreas, que
podem se tornar mais produtivas e contribuir para a remoção de carbono, quando
bem manejadas e sem a abertura de novos pastos.
Dos
dez municípios que mais emitiram no setor em 2019, a maior parte das emissões
foi gerada no bioma Amazônia (64%), seguido por Pantanal (18%), Cerrado (11%) e
Pampa (7%). No Pantanal, apenas dois municípios, Corumbá (MS) e Cáceres (MT),
são responsáveis, juntos, por 49% das emissões no bioma.
Os
municípios que mais emitiram no setor são os que apresentam os maiores rebanhos
bovinos (corte e leite): o processo de digestão dos animais — a chamada
fermentação entérica — maior responsável pelas emissões de metano (CH4),
principal gás de efeito estufa do setor.
São
Félix do Xingu, no Pará, que tem o maior rebanho do país, foi o que mais emitiu
em 2019, totalizando 4,5 MtCO2e, seguido por Corumbá (MS) e Vila
Bela da Santíssima Trindade (MT), com 3,6 MtCO2e e 2,4 MtCO2e,
respectivamente.
Energia
O
setor de energia, em especial por causa dos transportes, se destaca como maior
fonte de emissão nas grandes cidades, principalmente as capitais.
São
Paulo lidera as emissões, com 11,9 MtCO2e, seguido por Manaus (7,5
MtCO2e) e Rio de Janeiro (5,6 MtCO2e).
Florianópolis
é a capital do carro: apresenta a maior taxa por habitante de emissões
derivadas do transporte rodoviário individual (774 kg de CO2e),
seguida por Campo Grande (665 kg de CO2e) e Brasília (636 kg de CO2e).
São Paulo tem mais carros circulando, mas apresenta também grande malha de
transporte coletivo (dois terços da população paulistana usam transporte
coletivo ou se deslocam a pé), o que reduz as emissões per capita.
Município
com o maior número de termelétricas no país, Manaus é o que mais emite no
recorte por energia elétrica, com 5,02 MtCO2e.
Levantamento
do Iema (Instituto de Energia e Meio Ambiente) mostra que em Macaé (RJ), uma
das cidades onde está prevista a expansão de termelétricas, a qualidade do ar
já é inadequada, com concentração de poluentes como o ozônio acima do nível
recomendado pela OMS.
O
estudo também mostra que Cuiabá é a cidade com maior capacidade instalada para
geração de energia solar no país, seguida por Brasília. No caso de processos
industriais, o município capixaba de Serra, que abriga uma siderúrgica, lidera
as emissões que puderam ser alocadas nos municípios, com 9 MtCO2e,
seguido por Ipatinga (MG), com 4,5 MtCO2e.
Resíduos
O
setor de resíduos, embora represente apenas 5% das emissões brutas do Brasil, é
uma fonte de emissões importante para as cidades — especialmente as mais
populosas. O Rio lidera esse setor, com 5,5 MtCO2e, seguido por São
Paulo, que, apesar de ter quase o dobro da população, emite 4,6 MtCO2e,
devido ao aproveitamento energético do biogás que é gerado em aterros
sanitários.
“Esta
segunda edição dos dados de emissões dos municípios brasileiros consolida o
entendimento da dinâmica das emissões de gases de efeito estufa no nível local
no Brasil e o enorme desafio que será reverter as emissões de forma que sejam
negativas nas próximas décadas. Sem os municípios e políticas locais de redução
de emissões não há esperança para a meta de limitar o aquecimento global em
1,5°C até o final do século”, afirma Tasso Azevedo, coordenador geral do SEEG.
Os dados completos estão disponíveis na plataforma seeg.eco.br. A seguir, destaques do SEEG Municípios.
SETOR DE MUDANÇA DE USO DA TERRA E FLORESTAS
Os
dez maiores emissores (todos da Amazônia) representam 21% das emissões
nacionais do setor.
A
região Norte é responsável por 60% das emissões brutas nacionais do setor, mas
é a que apresenta maior queda por conta das remoções em áreas protegidas.
A
região Centro-Oeste é responsável por 21% das emissões brutas nacionais do
setor, mas lidera o ranking em emissão líquida com 27 MtCO2e a mais
que a região Norte e é responsável por 49% das emissões líquidas no setor.
A
queima de resíduos florestais representa 8% das emissões brutas nacionais do
setor. A maior parte das emissões é proveniente do desmatamento de vegetação
nativa primária em todas as regiões do país.
A
Amazônia do Maranhão e a região do Matopiba se destacam no Nordeste: os 10+
representam 18% das emissões brutas da região. Matopiba é a região de expansão
da agropecuária no Cerrado (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia).
A
perda de campos sulinos no bioma Pampa é responsável pela maior parte das
emissões brutas na região Sul.
SETOR
DE AGROPECUÁRIA
Em
2019, o setor foi a maior fonte emissora de gases de efeito estufa em 67% dos
municípios brasileiros.
Dos
dez municípios que mais emitiram em 2019, sete estão na Amazônia.
A
fonte mais emissora no setor foi o gado de corte: isso ocorreu em 89% dos
municípios.
Dos
dez municípios que mais emitiram em 2019, a maior parte das emissões foi gerada
no bioma Amazônia (64%), seguido por Pantanal (18%), Cerrado (11%) e Pampa
(7%).
Apenas
dois municípios, Corumbá (MS) e Cáceres (MT), representam sozinhos 49% das
emissões no bioma do Pantanal.
São
Félix do Xingu (PA) foi o que mais emitiu em 2019, totalizando 4,51 MtCO2e.
Os
municípios que mais emitem no setor agropecuário são os que apresentam os
maiores rebanhos bovinos (corte e leite). Houve aumento da área de pastagem
entre os mais emissores.
No
quesito emissões acumuladas no período 2000-2019, o município de Corumbá (MS) é
o primeiro do ranking, com total acumulado de 74,5 MtCO2e, seguido por São
Félix do Xingu (PA) e Ribas do Rio Pardo (MS), com 73,7 e 49,9 MtCO2e,
respectivamente.
Os dez municípios que mais emitiram no setor em 2019 não estão entre aqueles com maior valor de PIB Agropecuário. Os dez municípios com maior PIB Agropecuário apresentam emissões mais relacionadas com a agricultura, diferentemente dos dez que mais emitem, com atividades de pecuária. Sinal do potencial para produzir com baixas emissões nesses locais.
SETORES DE ENERGIA E DE PROCESSOS INDUSTRIAIS
São
Paulo lidera as emissões no setor de energia com 11,9 MtCO2e,
seguido por Manaus (7,5 MtCO2e) e Rio de Janeiro (5,6 MtCO2e).
Municípios
mais populosos, como as capitais, têm no setor de energia sua principal fonte
de emissão, sobretudo devido ao consumo de combustíveis fósseis nos
transportes.
Florianópolis
apresenta a maior taxa de emissões por habitante derivadas do transporte
rodoviário individual (774 kg de CO2e), seguida por Campo Grande
(665 kg de CO2e) e Brasília (636 kg de CO2e).
Município
com o maior número de termelétricas no país (a gás e a diesel), Manaus é o que
mais emite no subsetor de geração de energia elétrica.
Cuiabá
é a cidade com maior capacidade instalada para geração de energia solar no país,
seguida por Brasília.
Em
Macaé (RJ), uma das cidades onde está prevista a expansão de termelétricas, a
qualidade do ar é inadequada, com concentração de poluentes como ozônio acima
do nível recomendado pela OMS.
O setor de processos industriais é marcado pela escassez de dados de atividades que permitam estimativas mais precisas de suas emissões associadas. Serra (ES), que abriga uma siderúrgica, lidera as emissões que puderam ser alocadas nos municípios neste setor, com 9 MtCO2e, seguido por Ipatinga (MG), com 4,5 MtCO2e.
SETOR DE RESÍDUOS
As
emissões do setor se concentram em capitais e cidades mais populosas: 50
municípios contribuem com 38% das emissões (são aqueles com emissão maior do
que 200 mil toneladas de CO2e). RJ e SP lideram o ranking.
A
principal fonte de emissão no setor é a disposição final de resíduos sólidos em
aterros sanitários, “controlados” ou lixões: foram 56 MtCO2e em
2019. Rio de Janeiro lidera disparado o ranking, com 701 kg de CO2e
por habitante, seguido por Fortaleza (530 kg de CO2e), Manaus (464 kg de CO2e)
e Recife (453 kg de CO2e). No país, a emissão média per capita foi
de 271 kg de CO2e em 2019.
Uma
importante medida para a redução de emissões no setor é a captura do biogás gerado
em aterros sanitários, No Brasil, de acordo com projetos reportados na
plataforma de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo da Convenção-Quadro das Nações
Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), apenas 49 aterros sanitários apresentam
recuperação de metano — responsável pela captura de 418 mil toneladas de CH4
(11,7 MtCO2e), que representa cerca de 12% das emissões totais do
setor.
Vinte
dois municípios apresentam emissões negativas no setor: isso ocorre porque a
estimativa de emissão é realizada com base na quantidade de resíduos gerados em
cada cidade, enquanto a recuperação de metano (seja por meio de queima ou
aproveitamento energético em aterros sanitários) é baseada na localização do
aterro. No geral, são municípios que integram regiões metropolitanas e
recuperam o metano proveniente da disposição final de municípios vizinhos.
Outro
subsetor de destaque no setor de resíduos é o de tratamento de efluentes
líquidos domésticos, com a emissão de 25 MtCO2e. Assim como
apresentado para a disposição final, as cidades mais populosas também são as
que mais contribuem para as emissões neste subsetor. Destaca-se que, apesar de
Fortaleza, Manaus, Recife e Belém apresentarem uma contribuição significativa
nas emissões pelo tratamento de efluentes domésticos (4ª, 6ª, 9ª e 11ª posição
no ranking, respectivamente), essas cidades apresentam baixa taxa de acesso aos
serviços de saneamento.
Outro
aspecto importante em termos de redução é a recuperação de metano em estações
de tratamento de esgoto: houve destruição ou aproveitamento de cerca de 94 mil
toneladas de CH4, com destaque para Curitiba, Brasília, Belo
Horizonte, Campinas, Uberlândia, Recife e Londrina, que investem em rotas de
tratamento por meio de reatores anaeróbios.
Sobre
o SEEG: O Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa foi
criado em 2012 para atender a uma determinação da PNMC (Política Nacional de
Mudanças Climáticas). O decreto que regulamenta a PNMC estabeleceu que o país
deveria produzir estimativas anuais de emissão, de forma a acompanhar a
execução da política. O governo, porém, não as produziu. Os inventários
nacionais, instrumentos fundamentais para conhecer em detalhe o perfil de
emissões do país, são publicados apenas de cinco em cinco anos.
O
SEEG (seeg.eco.br) foi a primeira iniciativa
nacional de produção de estimativas anuais para toda a economia. Ele foi
incorporado ao Observatório do Clima em 2013. Hoje, é uma das maiores bases de
dados nacionais sobre emissões de gases estufa do mundo, compreendendo as
emissões brasileiras de cinco setores (Agropecuária, Energia, Mudança de Uso da
Terra e Florestas, Processos Industriais e Resíduos).
As estimativas são geradas segundo as diretrizes do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), com base nos Inventários Brasileiros de Emissões e Remoções Antrópicas de Gases do Efeito Estufa, do MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações).
Sobre o Observatório do Clima
– Fundado em 2002, é a principal rede da sociedade civil brasileira sobre a agenda climática, com mais de 70 organizações integrantes, entre ONGs ambientalistas, institutos de pesquisa e movimentos sociais. Seu objetivo é ajudar a construir um Brasil descarbonizado, igualitário, próspero e sustentável, na luta contra a crise climática. Desde 2013 o OC publica o SEEG, a estimativa anual das emissões de gases de efeito estufa do Brasil. (ecodebate)