Agricultura urbana: Fazendas verticais em edifícios começam a surgir
Projetos de fazendas verticais, onde é possível produzir alimentos em edifícios, começam a surgir pelo mundo; no Brasil, ideia já ganha adesão
Cultivar alimentos como hortaliças e frutas em espaços urbanos pode parecer coisa de visionário. Mas a ideia de se construir fazendas verticais, embora inusitada, começa a tomar força em vários projetos ao redor do mundo – até mesmo no Brasil. Ainda na faculdade, o arquiteto paulistano Rafael Gringberg Costa resolveu estudar a questão e de suas pranchetas saiu um projeto de revitalização para os Edifícios São Vito e Mercúrio, no centro de São Paulo.
Seu projeto propõe utilizar a estrutura dos edifícios – atualmente em processo de demolição pela Prefeitura de São Paulo – para produzir alimentos em sistema de hidroponia (onde as plantas são cultivadas na água), com aproveitamento da luz solar. O arquiteto vai além: propõe tratar as águas do poluído Rio Tamanduateí, que corre ao lado, para cultivar os alimentos em seu projeto de fazenda vertical. “Esses cultivos podem ser feitos o ano inteiro, sem preocupação com mau tempo ou seca”, diz o arquiteto. Segundo ele, a grande motivação para a construção de fazendas verticais é ecológica. “Tais fazendas podem estar localizadas em áreas urbanas onde a maioria da população vive. Assim, a agricultura se torna um sistema integrado – o alimento é cultivado, transportado e consumido na própria área urbana”, diz. Os benefícios, segundo ele, seriam a redução das emissões de gases de efeito estufa decorrentes do transporte dos alimentos, além do aproveitamento total dos edifícios urbanos.
A escolha dos Edifícios São Vito e Mercúrio para abrigar uma fazenda vertical, segundo o arquiteto, foi em razão da falta de soluções para os prédios. “Todas as tentativas de revitalização dos dois edifícios deram errado porque eles não são apropriados nem para moradia nem para comércio. Estão isolados entre duas avenidas com alta densidade de tráfego”, diz Costa.
O arquiteto chegou a protocolar o projeto há quase um ano na Prefeitura. Ainda aguarda um horário na subprefeitura da Sé para discutir o processo. Também apresentou o projeto ao Ministério Público e tem feito o mesmo em conferências de arquitetura e urbanismo.
Estufas
O conceito de agricultura indoor não é novo – numerosos cultivos, como morangos, tomates, pimentas e ervas – são feitos por meio de estufas e abastecem supermercados em todo o mundo. “Japão, Escandinávia, Estados Unidos e Canadá têm indústrias de estufas prósperas. Mas até hoje nenhum edifício foi efetivamente construído para esse fim”, diz ele.
Nos EUA, existem vários projetos de fazendas verticais, mas nenhum deles saiu do papel. Um dos mais conhecidos é o Dragonfly (libélula, em inglês), um projeto do escritório de arquitetura Vincent Callebaut Architectures. A proposta é construir, na Ilha Roosevelt, em Nova York, um colosso de 132 andares e 600 metros de altura, com capacidade para abrigar 28 diferentes plantações.
O americano Dickson Despommier, professor da Universidade de Columbia, nos EUA, é o maior estudioso das fazendas verticais e reuniu vários projetos no seu livro Vertical Farms, ainda sem edição no Brasil. Despommier calcula que uma fazenda vertical com uma base equivalente a um quarteirão e 30 andares poderia fornecer alimentos para atender as necessidades de 10 mil pessoas.
Um dos principais argumentos para os projetos de fazendas verticais é o de que a população do planeta, além de estar crescendo, está em acelerado processo de migração para os centros urbanos. Segundo as Nações Unidas, 80% da população viverá em cidades até 2050. Com base na tecnologia atual, serão necessários 1 bilhão de hectares de terra adicionais para acomodar o cultivo de alimentos para alimentar uma população de 9,15 bilhões de pessoas.
Para Paulo Pellegrino, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), a ideia de produzir alimentos em torres construídas para esse fim pode funcionar no Brasil, mas ainda não é uma necessidade.
“Os projetos de fazendas verticais são ideais para países muito urbanizados, com baixa oferta de terras agricultáveis e clima inóspito, como Japão, Holanda”, diz. Para a realidade brasileira, o urbanista defende o aproveitamento dos telhados para cultivos e também a agricultura urbana em áreas ociosas. “Isso reduziria a ocorrência das ilhas de calor e a impermeabilização do solo nas grandes cidades.”
Na avaliação de Luiz Henrique Ferreira, diretor da Inovatech, empresa especializada em projetos de construção sustentável, a ideia é inovadora. “O mérito do projeto é propor soluções inovadoras para 2050 em diante”, diz. No entanto, Ferreira acha que os projetos de fazendas verticais têm poucas chances de emplacar no Brasil, porque o País, sendo eminentemente agrícola, não sofre com escassez de áreas cultiváveis, como outros países. “Resolver o enorme déficit habitacional é mais importante neste momento.” (EcoDebate)
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