Medo da morte e desespero marcam os sobreviventes do
desastre entre os tuneis 10 e 11 da pista norte.
O terror tomou conta das pessoas que atravessavam a rodovia
dos Imigrantes quando a enxurrada ameaçou arrastar carros, caminhões e ônibus
para fora da estrada na noite de sexta-feira, em um desfiladeiro na Serra do
Mar.
Medo da morte, impotência e desespero marcaram os
sobreviventes do desastre entre os túneis 10 e 11 da pista norte. Uma carreta,
que virou em “L”, segurou a avalanche de veículos e evitou uma tragédia maior.
“Você vê um tronco passando e parece brincadeira. Mas daí,
de repente, perde o controle de tudo. Estava chovendo mais do que o normal, mas
nunca imaginaria que fosse acontecer aquilo”, afirmou o engenheiro João
Hohendorff, de 36 anos.
“Fiquei entre um caminhão e um ônibus. Poderia ser pior?
Poderia, mas Deus não permitiu.”
Segundo o taxista Leonardo Bressan Neto, de 58 anos, foi
tudo muito rápido. “A lateral do túnel estava despejando muita água e cascalho.
Aí, do nada, desceu o morro. Tronco, lama, pedra, tudo. Foi só o tempo de pular
uma mureta para me proteger”, disse. “Ainda voltei depois para socorrer outras
pessoas”, contou ele à reportagem.
A carreta de uma cervejaria serviu de barragem e evitou que
mais carros fossem carregados.
“Foi acumulando, encobrindo e formou um dique de barro,
pedra e lama na frente do caminhão. Depois, as pessoas começaram a correr,
desesperadas”, disse o dono de transportadora Francisco Vitor Beltramini, de
51, que voltava de Santos para Araçatuba.
“Quando parou de descer a enxurrada, o pessoal tentou
liberar a saída, tirando paus e pedras do caminho. Veio todo mundo descendo,
por 4 km, debaixo de chuva pesada. De mãe carregando bebê de colo até pessoas
mais velhas, todas a pé”, disse o supervisor de manutenção Marco Túlio
Marcelino, de 42 anos, que retornava de Santos para São Paulo, onde mora.
Muita água
Segundo o carreteiro Irineu Anderson Leme Vieira, de 47
anos, o volume de água chegou à altura do para-brisa de seu caminhão.
“A carroceria pulava com as pedras que passavam debaixo
dela. Ouvi um pessoal gritando ‘tem gente presa lá’. Acho que era a mulher que
morreu.”
Com a mulher e a filha de 11 anos, o encarregado Benedito
Emílio de Andrade, de 68, também viveu momentos de terror. “A enxurrada quebrou
o vidro do meu carro. Minha mulher e minha filha ficaram desesperadas. Depois
que elas conseguiram sair, me salvei passando por cima dos outros carros até
chegar à boca do túnel. Daí, voltei para tentar ajudar quem precisava.”
Já o taxista Antonio de Melo, de 66 anos contou que a água
só não entrou em seu carro porque ele ficou por cima dos outros.
“Sou caminhoneiro também, já rodei em tudo quanto é lugar e
nunca vi uma coisa dessas. Só estou de pé por Deus. Era para já estar em outro
mundo.”
Ainda não há prazo para reabrir rodovia
Até ontem não havia prazo para liberação da pista norte da
Rodovia dos Imigrantes, sentido capital, fechada nesta sexta por um
deslizamento de terra no km 52. O acidente matou Lilian Aparecida de Souza, uma
moradora de São Paulo de 43 anos, arrastou 23 carros e uma carreta e levou
pânico a motoristas. Segundo o governador Geraldo Alckmin (PSDB), a pista só
será liberada após vistoria do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). “É
preciso verificar se houve danos em estruturas, pontes e túneis”, disse, após
visitar o local. “Será aberto o mais rápido possível, mas com segurança.”
O diretor-superintendente da Ecovias, José Carlos Cassaniga,
informou que a concessionária trabalha para liberar a pista ainda no fim de
semana e que todas as vítimas serão indenizadas. Disse que a Ecovias não tem
plano de contingência para o tráfego em dias de chuva forte na Imigrantes, só
de monitoramento. Mas a empresa estuda criar bloqueios. “Em casos extremos, pode
ser viável fazer comboio ou coisa assim.”
De acordo com ele, a Ecovias já sabia que chovia muito na
serra desde as 15h de sexta, duas horas antes do acidente, mas a pista não foi
fechada. Em 12h, caíram 183,4 milímetros de chuva na Serra do Mar - a média
diária no mês é de 30 mm. Outra solução estudada é fazer uma escada para
escoamento da água sobre o Túnel TA 10/11, levando a enxurrada diretamente ao
rio que corre sob a ponte na entrada do túnel. “Uma das conversas é essa”,
disse o secretário de Transportes, Saulo Abreu, lembrando que a Ecovias pode
ser multada, caso seja constatada irregularidade. (jcnet)
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