Ex-ministro de Minas e Energia diz que política de
construir usinas de menor impacto ambiental terá custo nos próximos anos.
Ministro de Minas e Energia no governo Fernando
Henrique Cardoso, o engenheiro e economista Francisco Gomide apresentou um
relatório à Agência Nacional de Águas (ANA) e ao Ministério do Meio Ambiente no
qual alerta para um déficit de grandes reservatórios no País. Para ele, se for
mantida a política de optar por usinas do tipo fio d'água - que opera sem
reservatório-, problemas de abastecimento e falta de controle de cheias, entre
outros, serão sentidos nas próximas décadas.
Como o sr. vê a política de evitar os grandes
reservatórios?
Há uma campanha equivocada contra barragens e
reservatórios feita por entidades que promovem a consciência ambiental, o que é
muito positivo, mas que investe contra alguns alvos errados. O Brasil está
abrindo mão de riquezas naturais importantes, na forma de seus recursos
hídricos. A questão de dimensionamento do número de reservatórios é científica.
Mais reservatórios deixariam o País menos
vulnerável?
Sim, este dimensionamento pode ser projetado com a
segurança que você quiser. O problema é que se você constrói como no Brasil,
com a tradição de usinas novas a fio d'água e com o volume de armazenamento dos
reservatórios existentes, fica cada vez mais difícil atender ao mercado crescente.
É uma política equivocada que só vai ficar aparente daqui a 20 ou 30 anos.
De quantos reservatórios o País precisa para evitar
riscos?
Não falamos em número de reservatórios, o certo
seria em volume. O trabalho que fiz traz uma série de comparações, mas, em
particular no setor elétrico, eu diria que os reservatórios estão ficando
pequenos demais, pois são equivalentes a apenas quatro meses de fluxo normal. É
muito pouco, deveriam equivaler a muito mais.
Existem exemplos em outros países que se possa aplicar
aqui?
Os reservatórios americanos, por exemplo, equivalem
a 165 dias da vazão média. Foram construídos há mais de 30 anos e não há
evidências de que foi um erro. Se, por exemplo, todos os rios secassem de uma
hora para outra por lá, os reservatórios aguentariam por 165 dias.
Comparativamente, no Brasil, nós temos só 47 dias. E temos isso porque na
década de 1950 alguns dirigentes iluminados fizeram a opção por
hidreletricidade com grandes reservatórios. Desses 47 dias, 42 vêm do setor
elétrico. Se não tivessem feito essa opção lá atrás, o armazenamento brasileiro
seria de apenas 5 dias. Há 10 anos, paramos de projetar. O governo jogou a
toalha e desistiu de enfrentar organizações ambientais equivocadas.
Em que outros fatores os reservatórios podem ser
úteis?
Há milhares de anos os reservatórios servem para
administrar os chamados eventos hidrológicos extremos. Mas moramos em um país
que acha que não precisamos de obras de infraestrutura. O reservatório guarda
água em um momento em que há excesso para ajudar na estiagem. Com o uso para
irrigação, também pode aumentar a capacidade agrícola, que sobe
exponencialmente.
O principal argumento contra os grandes
reservatórios é o impacto social e ambiental causado pelos alagamentos.
Como o sr. vê este aspecto?
O problema é que os movimentos ambientais vão
contra todas as obras. O equívoco que se comete, na minha opinião, é a ideia de
que obras de infraestrutura causam impactos ambientais intoleráveis. Toda e
qualquer obra causa impacto, mas não se pode abrir mão delas. A natureza se
ajusta. As pessoas não aceitam a tese de que esse ajustamento é possível, de
que se pode realocar a população que está na área do reservatório, de que o
interesse público é maior que o particular.
O sr. acha que o custo ambiental é menor com os
reservatórios?
O que estamos dizendo é: 'Segurem as
hidroelétricas, mas, como o consumo segue crescendo, vamos usar as térmicas'. A
térmica pega um naco do volume de energia e opera na base, opera sempre. Não
sou contra, mas deve ser usada com bom senso. Como complementar é uma beleza,
pois o caro é apenas o combustível, não a instalação.
Como o sr. vê a polêmica em torno da construção de
Belo Monte, cuja principal crítica recai sobre o reservatório?
É uma obra lógica, mas que é obrigada a ser cortada
até que as entidades ambientais aceitem. Aí já não é uma obra defensável, pois
foi castrada, e não se pode mais dar uma opinião. (OESP)
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