O processo de
destruição da Amazônia continua ocorrendo de maneira criminosa. Além de ser um
atentado especista e ecocida contra a biodiversidade, o desmatamento amazônico
contribui para o aquecimento global, a diminuição das chuvas da região Sudeste
e para a falta de água em São Paulo e até no rio São Francisco.
O Instituto Imazon
divulgou em outubro de 2014 (antes do segundo turno das eleições presidenciais)
os dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) que detectaram 838
quilômetros quadrados (km²) de desmatamento na Amazônia Legal em agosto e
setembro deste ano, segundo reportagem da Agência Brasil. Isso representou um
aumento de 191% em relação ao mesmo período do ano passado, quando os alertas
indicaram 288 km² de desmatamento. O instituto, fundado em 1990, promove o
desenvolvimento sustentável na Amazônia por meio de estudos, apoio à formulação
de políticas públicas, disseminação ampla de informações e formação
profissional.
Porém, ainda segundo
a Agência Brasil, o governo brasileiro não referendou os dados e o Ministério
do Meio Ambiente (MMA) informou que os dados do instituto Imazon não são
oficiais. Em nota, o MMA disse que os números oficiais do desmatamento na
Amazônia Legal são do Projeto de Monitoramento da Floresta Amazônica por
Satélites (Prodes), sistema do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)
que é divulgado uma vez por ano em novembro, mês escolhido por anteceder a
Conferência das Partes de Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas,
que este ano será em Lima, no Peru, de 1º a 12 de dezembro.
Na ausência de dados
oficiais sobre a destruição da Amazônia, o debate sobre o desmatamento e suas
consequências não foi realizado de maneira adequada durante a campanha
eleitoral. Mais uma vez o meio ambiente foi relegado para segundo plano.
Todavia, a crise ecológica é uma realidade iminente e o Brasil vai ter que
enfrentar urgentemente os desafios colocados por anos de constantes
“malfeitos”.
No dia 31 de outubro,
o jornal Folha de São Paulo (FSP) divulgou estudo do biogeoquímico Antonio
Nobre, do Inpe, mostrou que 20% da floresta já foi desmatada e outros 20% estão
degradados, mostrando que a floresta amazônica está entrando em pane. A área de
corte raso já equivale aos territórios da França e Alemanha juntos. “Estamos
indo direto para o matadouro”, diz o cientista.
O relatório do
cientista Antônio Nobre (publicado a pedido de ONGs ambientalistas coordenadas
pela ARA – Articulação Regional Amazônica), revisou 200 estudos sobre o cenário
de pesquisa na área e concluiu que a floresta já dá sinais de desgaste em seu
papel de bombear umidade do oceano para o interior da América do Sul. Isto é,
pode estar em risco o papel de “bomba d’água biótica” que a floresta exerce,
demonstrado por trabalhos anteriores.
O relatório de
Antônio Nobre, intitulado “O Futuro Climático da Amazônia”, diz que a Amazônia
pode se transformar em uma savana no futuro, impulsionada pelo aquecimento
global. Segundo o autor, falando à FSP, existe uma subestimação do
desmatamento, pois “os trechos de vegetação que já perderam boa parte de suas
árvores e sua biodiversidade, aparecem como floresta intacta em fotos de
satélites”.
Pelas contas do
pesquisador do INPE, a Amazônia perdeu 42 bilhões de árvores nos últimos 40
anos, desmatamento que representa cerca de duas mil árvores por minuto e tem
impacto direto na crise da água. Uma árvore grande da Amazônia chega a evaporar
mil litros de água em apenas um dia. Para Antônio Nobre, se calcularmos todas
as árvores da bacia amazônica, a quantidade de vapor que vai pra atmosfera
corresponde a 20 bilhões de toneladas de água por dia (mais que o Rio Amazonas
coloca no Oceano Atlântico no mesmo período).
A destruição da floresta
significa o esvaziamento do rio voador amazônico, uma corrente a jato de baixa
altitude que tem cerca de 200 a 300 quilômetros de largura, milhares de
quilômetros de extensão e carrega um enorme volume de água e umidade da
Amazônia para a região Sudeste. Desta maneira, o desmatamento da Amazônia
representa o enfraquecimento dos “rios voadores”, fundamentais para o
equilíbrio climático do Brasil.
A consequência é que
as chuvas dentro do bioma e também num polígono ao sul do continente podem não
chegar com a mesma regularidade. Ou seja, menos floresta na Amazônia significa
menos chuva na região sudeste, a mais populosa e a responsável pela maior parte
do PIB brasileiro. Isto coloca em xeque o modelo “Extrai-Consome-Polui” que tem
usado e abusado dos recursos naturais e desrespeitado os direitos da água de
ser limpa e livre.
Reportagem da FSP, de
02/11/2014, mostra que a seca que assola o Sudeste atinge ao menos 133 cidades
e vai além dos pesadelos domésticos para seus 27,6 milhões de habitantes. Elas
reúnem 23% do PIB brasileiro. O Estado de São Paulo deve ter um declínio de
11,71% na moagem de cana. Em Paulínia (SP), a multinacional química Rhodia
chegou a recorrer por um mês a um rodízio em quatro de suas 22 unidades. O
setor têxtil também é atingido. Segundo Rafael Cevone, presidente da Associação
Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção, há unidades inteiras paradas.
Para piorar, o preço dos caminhões-pipa dobrou nos últimos meses (de R$ 600
para R$ 1.200 por 10 mil litros).
Dados anteriores do
Prodes do INPE, de 1988 a 2013, mostram que o desmatamento atingiu o montante
de 402.663 km², sendo que a Amazônia Legal brasileira possui (a) uma área de
5.217.423 km². Essa área desflorestada é maior do que a soma dos territórios
dos estados de São Paulo (248.209 km²), Rio de Janeiro (43.696 km²), Espírito
Santo (46.078 km²), Alagoas (27.768 km²), Sergipe (21.910 km²) e Distrito
Federal (5.801 km²). No total, as seis Unidades da Federação possuem uma área
de 393.462 km² menor, portanto do que os 403 mil km² destruídos da Floresta
Amazônica entre 1988 e 2013. Outros 400 mil km² foram destruídos entre 1965 e
1988.
Mas em vez de
recuperar e reflorestar o que foi destruído, muitas pessoas no Brasil comemoram
que as taxas de desmatamento nos últimos anos saiu de algo em torno de 25.000
Km2 para 5.000 Km2. Ou seja, a destruição estaria menos
pior.
Mas reportagem do
Greenpeace mostra que o setor agropecuário nacional pegou carona nesse cenário
pseudo positivo e passou a repetir um discurso de que, graças às técnicas
“modernas e ambientalmente sustentáveis”, essa queda foi possível. Grandes
expoentes do agronegócio chegaram a afirmar que não é mais necessário desmatar
para ampliar a produção agrícola. Infelizmente a realidade é outra, pois o
Greenpeace realizou um sobrevoo de monitoramento no norte do estado do Mato
Grosso e Leste de Rondônia, confirmando a paisagem de destruição: desmatamentos
de pequena e grande extensão, produção de soja e criação de gado em áreas
embargadas pela justiça, incêndios em áreas de florestas – inclusive dentro de
terras indígenas – e extração ilegal de madeira estão entre os principais
crimes e irregularidades flagradas.
“A falta de
governança na Amazônia, aliada à certeza de impunidade trazida pela anistia
dada pelo código florestal e ao alto preço das commodities, continua a
impulsionar a expansão da fronteira agrícola sob a floresta”, afirma Rômulo
Batista, da campanha da Amazônia do Greenpeace. Do “nortão” do Mato Grosso ao
sul de Rondônia, o que resta de floresta está sob séria ameaça.
Reportagem de Marcelo
Leite, na FSP, de 07/11/2014 confirma que o desmatamento na Amazônia disparou
em agosto e setembro de 2014. Em agosto, foram desmatados 890,2 km², um salto
de 208% sobre os 288,6 km² do mesmo mês de 2013. Em setembro foram 736 km², 66%
mais que em setembro do ano passado. A taxa de aumento combinada foi de 122%.
Segundo o mesmo
jornalista: “O governo federal já conhecia esses dados antes do segundo turno
da eleição presidencial, realizado no último dia 26. Adiou sua divulgação para
não prejudicar a votação da presidente Dilma Rousseff (PT), candidata à
reeleição. As análises mensais do sistema de alertas de desmatamento Deter
estavam prontas pelo menos desde 14 de outubro no INPE (Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais). No dia 24, foram encaminhados pelo diretor do Inpe,
Leonel Fernando Perondi, ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação”.
Portanto, o aumento do desmatamento é oficial e tudo indica que a presidenta
Dilma vai deixar, no seu último ano do primeiro mandato, um desmatamento maior
do aquele ocorrido em 2010.
Por tudo isto, o
Brasil surpreendeu a comunidade internacional ao não assinar, em setembro de
2014, o acordo de combate ao desmatamento apresentado durante a Cúpula do
Clima, em Nova York, que contou com a presença de 120 chefes de Estado. Para conseguir
apoio do agronegócio, o governo brasileiro não apoiou o documento que propõe
reduzir pela metade o corte de florestas até 2020 e zerá-lo na década seguinte.
Com esta medida, entre 4,5 bilhões e 8,8 bilhões de toneladas de CO2 deixariam
de ser liberadas para a atmosfera — o equivalente à remoção de um bilhão de
carros das ruas até 2030. A Declaração de Nova York, como foi batizada foi
elaborada por um grupo de países europeus e endossado por 32 Estados e segue
aberto para adesões até dezembro de 2015, quando acontece a Conferência de
Paris. Também China e Índia, que estão entre os maiores desmatadores do mundo,
rejeitaram o documento. O Brasil deu um passo atrás ao não assinar um documento
importante em um momento em que o desmatamento cresce na Amazônia.
A destruição dos
ecossistemas brasileiros é coisa séria. O Brasil já destruiu 93% da Mata
Atlântica e mais de 50% do Cerrado. Na Amazônia entre a destruição (corte raso)
e degradação (retirada de madeira de lei e danos parciais) o montante do estrago
chega a algo como 40%. Pode-se estar chegando ao ponto de não retorno. Além do
holocausto biológico, o Brasil e o mundo podem sofrer muito com a destruição da
floresta amazônica. O presente e o futuro das gerações das diferentes espécies
dependem da reversão deste quadro de colapso dos ecossistemas brasileiros.
Talvez a população brasileira vá ter que “morrer de sede” para perceber o
quanto é importante respeitar e recuperar as florestas e as matas que formam o
verde da bandeira nacional. (ecodebate)
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