A decisão da Sabesp
de manter descontos nas tarifas de água cobradas de 500 grandes consumidores de
São Paulo, mesmo em meio à maior crise hídrica em décadas, provoca críticas de
especialistas, que consideram o formato inadequado e um estímulo ao consumo de
um bem escasso.
EL PAÍS publicou
documento que revela 294 desses grandes clientes premium, que por consumirem
pelo menos 500 metros cúbicos – ou 500.000 litros, o consumo médio mensal de
128 pessoas – pagam pela água bem menos do que o valor de tabela aplicado para
as atividades comerciais e industriais que desempenham. Os contratos, chamados
de demanda firme, foram desenhados em 2002 para fidelizar grandes clientes com
a Sabesp e desestimulá-los a encontrar fontes alternativas de água.
“Mesmo que não
houvesse uma crise, não se poderia estimular o consumo da água. É um atentado
contra o meio ambiente”, afirma Carlos Zuffo, professor da Unicamp e
especialista em recursos hídricos. Ele argumenta que um recurso vital como a
água não pode ser tratado a partir da mesma lógica de mercado utilizada para
outros serviços.
“Esses contratos vão
na contramão da política de evitar o desperdício. Não se pode estimular o uso
excessivo de água, e sim a utilização racional do recurso hídrico”, segue
Zuffo. Para ele, é inaceitável que esse regime especial da Sabesp contivesse
penalidade para quem consumisse menos do que a cota mínima acordada. A
exigência só foi abandonada em março de 2014, quando a crise hídrica já estava
em curso.
Para José Galizia
Tundisi, presidente do Instituto Internacional de Ecologia e um dos maiores
especialistas em recursos hídricos do Brasil, a Sabesp deveria renegociar os
contratos. “A Sabesp teria que renegociar com esses clientes. Não há duvida de
que essa negociação deve ser considerada no ápice da crise. Não é questão de
que seja justo ou injusto, mas a conta da água deve ser para todos”, afirma
ele. “Quem gasta mais deveria pagar mais.”
A lista com clientes
premium, com o respectivo consumo e tarifas pagas, foi enviada pela própria
Sabesp à CPI municipal que investiga os negócios da companhia com a Prefeitura
de São Paulo. No documento, com data de dezembro de 2014, há condomínios de
luxo, bancos, hospitais, shoppings, igrejas, indústrias, supermercados,
colégios, clubes de futebol, hotéis e entidades como a Bolsa de Valores de São
Paulo, a concessionária da linha 4 do Metrô, a Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos ou a SPTrans. O consumo médio destes 294 clientes representa
1,23% do total do município, segundo cálculos da Sabesp incluídos no documento
enviado a CPI.
Para o shopping
Eldorado, por exemplo, cada mil litros de água custam R$ 6,27, enquanto os
clientes do setor comercial que não assinaram esse contrato pagam R$ 13,97. Um
desconto de mais de 55%.
Para o presidente do
Conselho de Sustentabilidade da FecomercioSP, José Goldemberg, é compreensível
que seja vantajoso e lucrativo para a Sabesp vender grande quantidade de água
para certos clientes a preços menores, mas esses contratos já não deveriam
estar vigentes em plena crise hídrica.
“As grandes empresas
devem ser desencorajadas a consumir tanta água, não o contrário. Mesmo que não
agrade alguns comerciantes e que eles reclamem, é necessário mudar o mais
rápido possível esses contratos. As empresas precisam adotar medidas de reuso
de água”, explica Goldemberg. (ecodebate)
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