Apenas
10% dos 500 mil litros de óleo descartados ao mês no Brasil são reciclados
De acordo com
dados da Associação Brasileira das Indústrias de Óleo (Abiove), o Brasil produz
mais de três bilhões de litros de óleos vegetais por ano, cada família consome,
em média, 4 litros por mês e descarta 1 litro.
Ao contrário da maioria, Maria José dos
Santos Rodrigues, que mora com o marido e os filhos em um barco, às margens do
rio Negro, toma o cuidado de coletar o óleo de cozinha utilizado no preparo de
alimentos e descartá-lo corretamente.
Embora produtos
químicos e dejetos humanos despejados nos igarapés e rios de Manaus por meio da
rede de esgoto sejam grandes responsáveis pela contaminação das águas, os
resíduos sólidos, garrafas PETs e óleo de cozinha residual também fazem parte
da lista dos maiores vilões do meio ambiente.
De acordo com
dados da Associação Brasileira das Indústrias de Óleo (Abiove), o Brasil produz
mais de três bilhões de litros de óleos vegetais por ano, cada família consome,
em média, 4 litros por mês e descarta 1 litro. Isso significa que mais de 500
mil litros de óleos são descartados pelas famílias manauaras todos os meses,
revelou uma estimativa com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE).
Em Manaus,
existem apenas 62 estações de tratamento de esgoto em bairros e conjuntos
residenciais. O que não é tratado ou reciclado vai parar nos igarapés, que por
sua vez deságuam no rio Negro. “Basta um pingo de óleo para causar um dano irrecuperável.
Esse óleo, em grande quantidade, cria uma película sobre a água que, além de
contaminar córregos e rios, agride a vegetação e causa a mortandade de peixes”,
explicou a presidente da Associação Brasileira para a Sensibilização, Coleta e
Reciclagem de Óleo Comestível (Eco Óleo), Célia Marcondes.
Um litro de
óleo pode contaminar até 25 mil litros de água potável, segundo a Abiove. A
solução para evitar tantos danos ao meio ambiente é apenas uma: investir na
reciclagem de óleo usado. “Separar esse óleo é uma simples atitude. Na
reciclagem, este poluidor pode virar uma série de produtos, como biodiesel,
velas, ração para animais, sabão, entre outras coisas”, informou Célia
Marcondes.
Coleta precária
Mas, para que
isto aconteça, é preciso criar mecanismos para agregar interesses entre
doadores e coletores de óleo de cozinha. A empresa responsável pelo
abastecimento de água e rede de esgoto da cidade, Manaus Ambiental, ainda não
possui programas que incentivem a coleta de óleo de cozinha, embora seja
comprovado que o descarte de óleo nas pias também causa prejuízo às tubulações
por conta dos entupimentos.
A cidade conta
com pontos de coleta do óleo de cozinha instalados nos cinco Postos de Entrega
Voluntária (PEVs). Mas em apenas dois deles, o da praça do Dom Pedro, na Zona
Centro-Sul, e na Lagoa do Japiim, na Zona Sul, as doações são mais frequentes.
“Falta
divulgação da reciclagem, que é muito tímida em Manaus. Tem gente que até quer
fazer a separação, mas não sabe para onde destinar. Não existe incentivo do
poder publico e também falta conscientização da população”, comentou Maria do
Carmo Soares, do projeto Somando Lixo e Cidadania.
Moradora há 13
anos de um flutuante localizado às margens do rio Negro, na Manaus Moderna, a
dona de casa Maria José dos Santos Rodrigues sabe bem do que Maria do Carmo
está falando. Ela, que mora com o marido e quatro filhos em um barco, vive,
literalmente, “ilhada” por todo tipo de poluição. Apesar da convivência com a
sujeira e da ausência de coleta de lixo, Maria José procura fazer a parte dela,
coletando resíduos e até o óleo vegetal usado pela família. Ela garante que
tudo vai para uma lixeira comunitária, perto dali. “Pena que a maioria não
pensa assim. Pra onde você olhar é lixo boiando. Tem muita gente que, por morar
na beira do rio, joga de um tudo na água, desde óleo de cozinha até geladeira
velha. Não entendem que a natureza vai devolver tudo pra eles da próxima vez
que o rio encher. É esperar para ver”.
Exceções não
fazem a regra, mas a diferença
Morar em locais
inóspitos não é uma escolha de quem reside “no alagado”, chamado popularmente
de “bodozal”, em alusão à espécie de peixe cascudo que reside nas áreas
alagadas. Para o pensionista Genésio Filho, 48, que mora na orla do Educandos,
Zona Sul, trata-se de uma necessidade.
“Eu pago IPTU
todos os anos, mesmo morando em uma área que não nos oferece nenhum tipo de
serviço básico e ainda por cima é cheia de lixo. Mas a culpa pela poluição não
é da prefeitura, e sim dos moradores que contaminam o próprio local onde
vivem”, ressalta.
Todos os
domingos, ele sai de casa para retirar milhares de sacos plásticos que são
jogados no igarapé. “Eu só conheço mais dois moradores daqui que prezam pelo
meio ambiente e colaboram com a limpeza”, relata.
Como o caminhão
coletor de lixo não consegue ter acesso à orla, especialmente durante os meses
de cheia, quando parte das ruas vai para o fundo do rio, os funcionários da
limpeza pública também não descem, ainda que os moradores paguem seus impostos.
Genésio, por
exemplo, paga R$ 35 de IPTU, mas não é beneficiado com a coleta do lixo. Por
isso, ele separa os resíduos em sacolas diariamente, e, quando os filhos vão à
escola, pede para que eles levem os resíduos para a rua mais próxima onde há o
serviço de coleta. Mas ele, infelizmente, ainda é exceção. “Não nos custa nada
levar o lixo e jogar no lugar certo, já que não passam para recolher”.
O que você fz
com seus PET’s?
Do montante de
lixo produzido em Manaus, o que se aproveita para a reciclagem ainda é pouco:
cerca de 0.2%. Cada habitante de Manaus consome, mensalmente, cerca de 3
garrafas PEts de 2 litros, conforme cálculos baseados na Pesquisa de Orçamentos
Familiares do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Somando todos
os moradores da cidade, são consumidos aproximadamente 12 milhões de litros por
mês. Se convertidos em garrafas PETs de 2 litros, somariam 6 milhões
mensalmente. Só no ano passado, quase 109 milhões de litros de garrafas PETs
foram envasados no Polo Industrial de Manaus.
A Prefeitura de
Manaus gasta quase R$ 1 milhão por mês para limpar os igarapés, que todos os
meses são ‘inundados’ com 2,1 mil toneladas de todo tipo de lixo.
Mesmo com a
Política Nacional de Resíduos Sólidos, que determina incentivo à indústria da
reciclagem, nenhum dos órgãos procurados, como a Secretaria Municipal de
Limpeza Pública (Semulsp), Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa)
e Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieram) souberam mensurar a
quantidade total de PETs que são reciclados mensalmente em Manaus.
Mas, de acordo
com o coordenador da Arpa, Raul Lima, aproximadamente 20 toneladas por mês são
levadas para as indústrias de reciclagem. Ao todo, são 500 catadores na cidade
que trabalham com a coleta de resíduos. O que não vai para a indústria, vira
artesanato. Mas a maior parte ainda acaba no aterro, ou pior: nos igarapés.
A legislação á
falha, afirma Sérgio Bringel
"O
processo de despoluição de nossos igarapés envolve vontade de fazer do poder
público. Não é um processo simples de se fazer. Até mesmo por conta do uso
indevido do solo, que causa a expansão urbana sem nenhum plano, e muitas vezes
o governo dá anuência porque não faz nada para evitar isto. São pouquíssimos os
bairros que contam com o serviço de saneamento básico. Todos foram feitos de
qualquer jeito. Faltam políticas públicas voltadas ao monitoramento destas
águas, evitando a contaminação", afirma Sérgio Bringel, do setor de
recursos hídricos do Inpa.
"Mas eu,
que faço parte do Conselho de Recursos Hídricos do Estado, nunca mais ouvi
falar nesta pasta, muito menos políticas ou estudos sobre nossos cursos
hídricos. A nossa própria legislação é falha. Nesses rios há contaminação por
produtos químicos, dejetos humanos e lixo. Isto pode causar grandes problemas e
doenças hídricas como febre tifóide e micose. O óleo também causa um estrago
muito grande ao meio ambiente, pois a água e óleo não se misturam. Também é uma
questão de saúde pública. Mas nossos políticos não têm consciência ambiental.
Debater o tema de contaminação dos recursos hídricos é importante para
preservamos o futuro. Temos vários problemas e repito: precisamos de
legislações específica. Políticas públicas precisam ser criadas e discutidas
por todos nós”, completou.
Blog: Alcyneia
Cunha - Fundadora da Arpa
"Trabalho
com reciclagem há 20 anos. Virei catadora por necessidade. Recolhia resíduos na
praça da Igreja dos Remédios, no Centro, e lá mesmo dormia quando não tinha
dinheiro para voltar para casa. Sempre foi uma vida difícil, mas me apaixonei
pelo que faço. Apareceram outras oportunidades de emprego, mas com o tempo eu
percebi que eu exercia esta atividade não apenas para tirar o sustento da minha
família, mas por amor ao meio ambiente. Fundar esta associação foi um sonho que
se realizou", afirma.
"Mas fico
triste quando vejo toneladas de materiais reaproveitáveis sendo jogados nos
nossos igarapés. Se as pessoas soubessem que isto, para nós que trabalhamos com
reciclagem, vale ouro, elas não agridiriam tanto o meio ambiente assim. Além da
conscientização de cada um, que é primordial para a preservação do meio em que
vivemos, falta vontade do poder público de apoiar os catadores e incentivar o
nosso trabalho. Falta educação ambiental. Isto precisa começar nas escolas e
dentro de casa. Para que, no futuro, nossos netos possam conhecer a natureza,
ter o ar puro para respirar e água para beber", finalizou.
Busca rápida
Mais de 13 mil
litros só nas bancas de pastel
Um dos maiores
grupos de reciclagem de Manaus, a Associação de Reciclagem e Preservação
Ambiental (Arpa), recebe semanalmente 3 mil litros de óleo de cozinha no PEV do
Dom Pedro, o que ainda é pouco. Um levantamento feito no Centro apontou que 13
mil litros de óleo usado em frituras somente nas barracas de pasteis são
jogados fora.
Saiba mais:
Reuso
Das 500
toneladas de óleo que as famílias manauaras descartam mensalmente, apenas 10%
são recicladas. O gerente de coleta da empresa Masseg Serviços, pioneira no
ramo e responsável pelo projeto Papa Óleo, Silas Matos, informou que, por mês,
90 toneladas são coletadas de restaurantes e associações de catadores em Manaus
e transformados em biodiesel. Emprego. Os outros 100 litros são usados por
cooperativas e associações que produzem sabão e pastas de limpeza. (uol)
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