Enquanto
nas salas climatizadas da Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações
Unidas sobre a Mudança do Clima (COP21), em Paris, tudo vai hipoteticamente
bem, obrigado, do lado de fora, a realidade é bem outra. Essa constatação vem
por meio de dados do recente “Índice
Global do Risco Climático”, publicado pela organização não governamental
(ONG) Germanwatch, que registra a morte de aproximadamente 525 mil pessoas em
ocorrências de 15 mil eventos extremos, em duas décadas (1995-2014). No ano de
2014, as precipitações, inundações e deslizamentos de terra foram as principais
causas de danos.
Além
de ceifar vidas, o prejuízo econômico gerado por essas catástrofes são na ordem
trilhonária, de US$ 2,97 trilhões. As nações mais afetadas foram Honduras,
Mianmar e Haiti seguidas por Filipinas, Nicarágua e Bangladesh. Neste recorte,
América Central e Ásia concentram os efeitos mais catastróficos, nesses últimos
anos. As principais vítimas: os mais pobres, reforçando que a injustiça
socioambiental não é só teoria, mas uma realidade contemporânea indiscutível.
O
processo de adaptação ainda é muito lento, um novo desenho geográfico começa a
se formar, principalmente nos últimos anos, na Europa. Países como a Sérvia,
Bósnia e Herzegovina estão apresentando os efeitos das mudanças climáticas e do
Aquecimento Global. A afirmação é de Sönke Kreft, um dos principais
pesquisadores do levantamento. Os países insulares, como Tuvalu, no Pacífico, continuam
a implorar por apoio, para que não desapareçam sob o aumento do nível do mar.
No
campo das negociações, ano após ano, o embate é sobre quem arca com a maior
parte dos custos de adaptação e mitigação (redução de danos), nesses países com
poucos recursos. Uma das maiores fontes em negociação nas COPs, instituída
desde 2010, é o Fundo Verde do Clima (GCF), que tem a meta de estabelecer a
quantia de US$ 100 bilhões anuais a partir de 2020 aos países mais pobres, sem
ainda conseguir computar este recurso e decidir quais critérios de repasse. O
dilema que envolve a maior parte dos 195 países envolvidos na conferência é
quem paga a conta da aceleração do desequilíbrio climático, desde a Revolução
Industrial, que imprime um modelo de desenvolvimento ultrapassado e nocivo.
Segundo
anúncio da coordenação do GCF, já foram aprovados recursos para serem aplicados
em oito projetos distribuídos em Bangladesh, nas Ilhas Fiji, no Malaui, nas
Maldivas e no Peru. Mas existe uma quantidade enorme de nações com sua população
em extremo risco, como descrito acima.
E
fora das mesas de negociação da COP-21, algumas iniciativas são inspiradoras,
como da coligação “Restauração Africana (AFR100)”, de dez países
africanos (Etiópia, Libéria, Madagáscar, Malawi, Níger, Quênia, República
Democrática do Congo, Ruanda, Togo e Uganda) com nove financiadores e 10 apoios
na área técnica, que prevê a restauração de 100 milhões de hectares de
florestas degradadas até 2030 (cada ha equivale a um campo de futebol).
Todas
as ações cada vez mais proativas são exemplares, já que pelo aspecto
científico, agora as previsões são menos favoráveis e chegam na casa do aumento
de até 3,5°C na temperatura média da Terra até o final do século
comparativamente ao período pré-industrial, 1,5°C a mais ao limite tolerável,
segundo os pesquisadores do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas
(IPCC). É como se nós, seres vivos, estivéssemos expostos a uma roleta russa.
Brasil:
muito a melhorar
Todos
os compromissos voluntários já anunciados por boa parte das nações, incluindo o
Brasil, não dão conta dessa espiral ascendente. A proposta brasileira para
conter o aquecimento global é reduzir em 37% as emissões de Gases do Efeito
Estufa (GEEs) do País em relação ao ano de 2005. Naquele ano, as emissões totalizaram
2,1 gigatoneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2eq). O
País também se propõe a restaurar 12 milhões de hectares de florestas até 2030.
Na
lista do “Índice Global do Risco Climático”, o país figura em 82º lugar e se a
análise é referente ao ano passado, passa a 21º. De acordo com analistas, os
esforços têm de ser maiores, fazendo o cruzamento do combate ao desmatamento
com a mudança para uma matriz energética mais limpa. As políticas internas em
muitas áreas ainda são controversas no país.
Em
estudo recente da Organização Mundial da Saúde (OMS), com a Convenção-Quadro e
o Ministério da Saúde, além de outras organizações, foram analisados os efeitos
das mudanças climáticas na saúde do brasileiro, e aí a preocupação aumenta.
A
complexidade é tanta que estima-se que se a situação continuar do jeito que
está, as inundações resultantes do aumento do nível do mar afetarão 618 mil
brasileiros entre os anos 2070 e 2100. Pensar em longevidade também será
difícil, já que a perspectiva é que morrerão, devido a causas associadas ao
aumento de temperatura, 72 idosos acima de 65 anos por 100 mil habitantes em
2080, sendo que hoje esta proporção é de 1 para 100 mil anualmente. A vida está
em xeque aqui e no mundo e depende em grande parte de um documento de quase 50
páginas discutido a portas fechadas. O “clima” do lado de fora é muito mais
urgente. (ecodebate)
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