As
mudanças climáticas têm sido debatidas há décadas, mas “justiça climática” é um
conceito relativamente novo. O que significa esse termo e como esse movimento
se diferencia de outros movimentos ambientais?
Mudanças
climáticas como um assunto ético e político
No
início da década de 1980, nos Estados Unidos, um novo movimento surgiu após
vários protestos e processos judiciais contra o lixo tóxico e a poluição em
bairros pobres e zonas rurais. O movimento por justiça ambiental, como era
chamado, buscava justiça para as pessoas que foram desproporcionalmente
afetadas pela degradação ambiental e era liderado por diversos grupos
marginalizados que acreditavam que suas comunidades eram as mais prejudicadas.
Esse movimento era diferente do movimento ambientalista mais amplo, que
centrava-se na degradação ambiental e, com frequência, ignorava os seus
impactos nas comunidades e nos bairros mais pobres. O movimento por justiça
ambiental procurou livrar o mundo do racismo ambiental – um problema que não
era sequer levado em consideração pela maior parte dos ambientalistas.
À
medida que as mudanças climáticas se tornaram um problema mais urgente, o
movimento ambientalista mais amplo tomou para si a responsabilidade de tentar
mitigar os impactos do aquecimento global e de educar as pessoas sobre como o
meio ambiente seria afetado. Ao mesmo tempo que as consequências para os seres
humanos sempre foram uma preocupação para os ambientalistas, esse não era
necessariamente o seu foco, principalmente quando falamos de grupos
marginalizados.
Consequentemente, esforços e campanhas para ajudar ecossistemas podem acabar prejudicando comunidades pobres e indígenas e podem não conseguir chegar à raiz da degradação climática, o que é ainda mais importante.
Consequentemente, esforços e campanhas para ajudar ecossistemas podem acabar prejudicando comunidades pobres e indígenas e podem não conseguir chegar à raiz da degradação climática, o que é ainda mais importante.
O
movimento por justiça climática é a resposta do movimento internacional por
justiça ambiental às mudanças climáticas. Ele vê as mudanças climáticas como
uma questão complexa de justiça social, e não apenas como um problema
ambiental. Enquanto os ambientalistas podem considerar que as mudanças
climáticas sejam o simples resultado de um sistema industrial com pouca
regulamentação, a justiça climática acredita que elas sejam o produto da
desigualdade e de um sistema econômico obcecado pelo crescimento em prol do
crescimento. O racismo e o classismo estão intrinsecamente conectados às
mudanças climáticas, e esses problemas não podem ser ignorados.
O
poder das pessoas
Um
fator importante para os movimentos por justiça ambiental e climática é que
ambos são movimentos de base, que enfatizam a necessidade de envolver as
comunidades na organização de suas próprias ações e nas decisões sobre seus
próprios futuros. Embora a justiça climática frequentemente envolva pressionar
grandes corporações e governos, essa pressão vem das pessoas, e não de cima.
Acredita-se na capacidade das comunidades de influenciarem os poderosos, mais
do que nos próprios poderosos. Em outras palavras, a justiça climática é movida
pelo poder das pessoas.
A
organização, em contraposição à ação individual, é a estratégia de base do
movimento por justiça climática. Já vimos muitos exemplos desse tipo de
organização ao redor do mundo, especialmente quando nos aproximávamos da Cúpula
de Paris. Alguns poderão lembrar do que diz o livro de Naomi Klein, This
Changes Everything (“Isto Muda Tudo”, em português): grupos e comunidades
indígenas estão se tornando cada vez mais ativos na luta contra os interesses
dos combustíveis fósseis.
Justiça
climática ao redor do mundo
Oleoduto
Keystone XL
Recentemente,
a justiça climática ganhou as manchetes do mundo todo quando ativistas conseguiram
impedir a continuidade do oleoduto Keystone XL, que levaria petróleo das areias
betuminosas de Alberta, no Canadá, até as refinarias no Golfo do México. Uma
rede popular massiva envolvendo povos originários, fazendeiros e outros grupos
locais começou a campanha contra o oleoduto em 2010. O movimento se estendeu
por anos, com ativistas trabalhando incansavelmente tanto contra o oleoduto
quanto contra a extração das areias betuminosas, por meio do ativismo de base e
de ações diretas não violentas, parecido com o que se viu no fim da década de
1960. No final de 2015, Barack Obama finalmente rejeitou o oleoduto.
Bloqueio
do porto de Newcastle, na Austrália
As
nações das Ilhas do Pacífico estão entre os locais mais vulneráveis no mundo
aos impactos das mudanças climáticas. Em outubro de 2014, líderes de 12 nações
das Ilhas do Pacífico – os chamados Pacific Climate Warriors (“Guerreiros do
Clima do Pacífico”, em português) – formaram um bloqueio no maior porto de
exportação de carvão do planeta, usando canoas tradicionais feitas no local.
Como parte do movimento da 350 Pacífico, os 30 ativistas conseguiram impedir a
saída de oito dos 12 navios previstos para deixarem o porto durante o período
do bloqueio.
Desinvestimento
Em
escala mais ampla, ativistas e organizações do mundo todo têm pressionado as
instituições para que deixem de investir em fundos que apoiam os combustíveis
fósseis e em corporações que os extraem. O movimento de desinvestimento,
liderado pela 350.org, já conseguiu que mais de 500 instituições se
comprometessem a retirar mais de US$ 3,4 trilhões de investimentos em
combustíveis fósseis – com contribuições significativas por parte de grupos e
fundações religiosas. Isso representou um golpe duro para a indústria dos
combustíveis fósseis, e os investidores estão pensando duas vezes a respeito de
questões éticas e de segurança antes de colocar seu dinheiro na extração de
carvão, petróleo e gás.
Os
valores da justiça climática
Os
valores do movimento por justiça climática são semelhantes aos valores dos
grandes movimentos por justiça social: comunidade, grupos marginalizados, poder
popular e igualdade. Isso é percebido em suas ações, local e globalmente. A
justiça climática é uma forma ativa e integrada de enfrentar os desafios
causados pelas mudanças climáticas, pelo capitalismo e pela injustiça. Pessoas
comuns podem fazer a diferença em suas comunidades e no mundo! (ecodebate)
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