Descarte inadequado de lixo e entulho em área de recarga compromete Aquífero Guarani.
Análise
de amostras de sedimento da Lagoa do Saibro, área de recarga do aquífero, em
Ribeirão Preto, identificou a presença de vários contaminantes.
Lagoa do Saibro, área de recarga do Aquífero
Guarani.
O
hábito da população de descartar objetos e materiais em qualquer local,
principalmente em rios, lagos, lagoas e mares, pode comprometer o meio ambiente
e também a população que vive nas redondezas, como é o caso da Lagoa do Saibro
(foto ao lado), em Ribeirão Preto.
A
Lagoa do Saibro, localizada na Zona Leste de Ribeirão Preto, é de importância
vital, pois é área de recarga do Aquífero Guarani, uma das maiores reservas de
água doce da América do Sul, e que faz o abastecimento público de várias
cidades, incluindo Ribeirão Preto. Mas nem a importância da Lagoa do Saibro a
fez escapar do péssimo hábito da população de descartar lixos e entulhos em
qualquer lugar.
Estudo
realizado na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto
(FFCLRP) da USP, em parceria com a Universidade de Brasília (UnB) e a Companhia
Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB), analisou amostras de sedimento da
Lagoa do Saibro e identificou a presença de vários contaminantes, compostos
químicos chamados éteres difenílicos polibromados (PBDEs). Os PBDEs estão
presentes em diversos bens de consumo, como colchões, estofamento de móveis e
automóveis, carpetes, computadores, equipamentos eletrônicos, nylon, adesivos e
isolantes de fios. Os valores encontrados de PBDEs na lagoa foram semelhantes
aos de lagoas próximas a regiões industrializadas.
Pesquisa
identifica compostos orgânicos que podem causar problemas na tireoide e no
fígado e comprometem o desenvolvimento neurológico.
Segundo
o professor Daniel Junqueira Dorta, da FFCLRP e orientador da pesquisa, a
contaminação da lagoa está relacionada ao descarte inadequado de produtos que
possuem os PBDEs, uma vez que a área não é industrial. “Infelizmente, como pode
ser observado por reportagens sobre essa lagoa, diversos bens de consumo já
foram retirados da lagoa, como armários e até mesmo carro. Além disso, o esgoto
e a água de chuva que desembocam ou já desembocaram na lagoa podem trazer tais
compostos”, afirma.
Segundo
Dorta, as principais fontes de contaminação pelos PBDEs são pelo ar, por meio
da poeira, e pela dieta, por meio do consumo de peixes, por exemplo, que vivem
na área contaminada. “Devido às características físico-químicas, os PBDEs
contaminam preferencialmente o sedimento e ambientes com maiores concentrações
de gorduras; entretanto, nada impede que esses compostos também estejam
presentes na água e contaminem quem a consumir”, diz.
O
pesquisador lembra que o composto pode colocar em risco a saúde da população.
“Na literatura pesquisas já demonstraram que os PBDEs podem induzir o
crescimento anormal de órgãos reprodutivos femininos, ter efeitos neurotóxicos,
alterações endócrinas e deficiência de aprendizagem e memória”. “Estamos
avaliando no laboratório a toxicidade deste composto, que tem mostrado
capacidade de induzir danos às células e induzir morte celular”, esclarece o
professor.
Reserva de água no Aquífero Guarani.
Reserva de água no Aquífero Guarani.
Brasil não cumpre Convenção de Estocolmo
Em
2001, na Convenção de Estocolmo, vários países, incluindo o Brasil, assinaram
tratado que visava ao controle ou restrição da produção e consumo dos compostos
presentes na lista de poluentes orgânicos persistentes (POPs), ou seja, que não
se degradam facilmente.
Segundo
Dorta, os PBDEs estão presentes na lista de POPs, entretanto, diferentemente de
outros países europeus, no Brasil não há leis que regulamentam a proibição
desses retardantes de chamas nem estão incluídos em análises de rotina de
amostras ambientais. “É necessário que o Brasil crie políticas públicas para
controlar e proibir a produção e uso desses compostos, pois além de
contaminarem o meio ambiente, não são fáceis de se degradarem”, alerta.
O
professor ainda relembra: “Concentrações altas já foram observadas até em ursos
polares, que vivem bem distantes dos locais de produção, utilização ou
descarte, o que demonstra a alta estabilidade desses compostos no ambiente e
também a capacidade de se deslocarem para locais distantes das fontes de
emissão”, observa o orientador.
No
Brasil, existem poucas pesquisas que avaliam os PBDEs em qualquer tipo de
amostra, seja ela ambiental ou biológica, porém no mundo todo existem vários
grupos que avaliam esses compostos. “Nosso trabalho é muito relevante quando se
pensa em preservação de uma fonte de água tão importante e, também, na
preservação da saúde da população ribeirão-pretana”, conta Dorta.
Entre
as próximas etapas da pesquisa está a avaliação dos mecanismos de ação tóxica
dos PBDEs. “Além da nossa observação nas células, também analisaremos amostras
de leite materno para ter uma avaliação da exposição humana a esses
compostos”, conclui o professor.
Lixão
Lixão
A
tese Risco da exposição aos congêneres de éteres
difenílicos polibromados (PBDE-47, -99, -154, -209): Efeitos citotóxicos,
genotóxicos, mutagênicos e quantificação ambiental, do Programa de Pós-Graduação em Química da FFCLRP da
USP, foi defendida no último mês de outubro pela pós-graduanda Alecsandra
Oliveira de Souza. (ecodebate)
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