A transição
demográfica é um fenômeno sincrônico com o desenvolvimento econômico. Depois da
Revolução Industrial e Energética que teve início no final do século XVIII,
houve um grande aumento do padrão de vida médio da população mundial (a
despeito das desigualdades) e um grande avanço no sistema de saúde, na higiene
e no saneamento básico (os avanços foram maiores no acesso à água tratada e
menores na canalização e no tratamento do esgoto).
Ou seja, o
desenvolvimento econômico propiciou aumento da renda e do padrão de consumo e,
também, nas conquistas da medicina e na saúde pública. Isto provocou uma grande
redução das taxas de mortalidade. A esperança de vida ao nascer da população
mundial estava abaixo de 30 anos no final do século XIX e chegou a 66 anos no
ano 2000. A mortalidade na infância global estava pr volta de 400 por mil no
século XIX e chegou a 40 por mil no final do século XX. O tempo médio de vida
mais que duplicou em 100 anos. Isto nunca havia acontecido antes (nos 200 mil
anos do Homo sapiens) e, provavelmente, nunca acontecerá novamente.
Os seres
humanos pararam de morrer como “mariposas” e passaram a viver mais tempo nas
idades produtivas, contribuindo para o crescimento da renda individual,
familiar e nacional. Há uma relação de retroalimentação neste processo, pois o
aumento da renda per capita reduz as taxas de mortalidade e, potencialmente,
aumenta o retorno das pessoas para a economia. Enfim, os ganhos macroeconômicos
e microeconômicos se somam para aumentar o padrão de vida da população e
aumentar a riqueza das nações.
Algo
semelhante ocorre com o desenvolvimento econômico e a transição da fecundidade.
O primeiro efeito do aumento da renda é abaixar a taxa de mortalidade infantil
e elevar a proporção de filhos sobreviventes. Desta forma, as mulheres (e os
casais) atingem o número desejado de filhos muito antes do fim do período
fértil. Assim, após certo lapso de tempo decorrido para reduzir
consistentemente as taxas de mortalidade infantil, inicia-se a transição (de
altos para baixos níveis) da taxa de fecundidade total – TFT.
O
desenvolvimento econômico contribui para a redução das taxas de fecundidade por
meio dos seguintes mecanismos:
1) redução
da mortalidade infantil e aumento da proporção de filhos sobreviventes para
satisfazer o tamanho ideal de família em menos tempo;
2) aumento
dos níveis educacionais dos pais, permitindo que eles tenham acesso às
informações sobre a melhor maneira de garantir a autodeterminação reprodutiva;
3) aumento
das oportunidades de emprego assalariado, especialmente para as mulheres,
criando projetos de carreira e sucesso profissional em vez de manter a mulher
segregada nas infinitas tarefas da maternidade e do espaço doméstico;
4) aumento
do padrão de consumo e diversificação da cesta de bens e serviços o que eleva o
custo de oportunidades de ter filhos;
5)
alteração da relação custo/benefício dos filhos, o que modifica os
investimentos na prole, possibilitando o “trade-off” da quantidade para a
qualidade dos filhos;
6) aumento
do grau de cobertura da previdência social (pública e privada), o que diminui a
dependência dos idosos em relação aos filhos; etc.
Por tudo
isto, não é de se estranhar que os países mais ricos são aqueles com menores
taxas de fecundidade. Aliás, atualmente, não existe nenhum país rico (com IDH
acima de 0,850) em que a TFT esteja acima do nível de reposição (2,1 filhos por
mulher). A queda da fecundidade é um pré-requisito para o enriquecimento das
nações. O gráfico acima mostra a estreita relação entre o nível de renda
(medido pelo PIB per capita) e a taxa de fecundidade total. O gráfico mostra
não só as médias de cada país, mas as desigualdades dentro dos países. O
resultado é claro: existe uma relação inversa entre renda e fecundidade: quando
a renda sobe diminui o número médio de filhos e quando a fecundidade cai a
renda per capita sobe.
Outro
fenômeno importante mostrado no gráfico é que alguns países conseguiram reduzir
a fecundidade mesmo em um quadro de baixa renda per capita. Ou seja, a redução
da TFT pode ocorrer mesmo diante de um cenário nacional de baixo
desenvolvimento. Como a queda da fecundidade abre uma janela de oportunidade
demográfica (bônus), se esta for bem aproveitada, ela pode impulsionar o
crescimento da renda per capita e do bem-estar.
A Tailândia
é um exemplo de país que conseguiu reduzir as taxas de fecundidade antes do
desenvolvimento econômico. O gráfico abaixo mostra que a TFT tailandesa estava
acima de 6 filhos por mulher em 1960 e caiu para um patamar abaixo do nível de
reposição (2,1 filhos por mulher) em 1990. Na atual década 2010-20 a TFT da
Tailândia está em torno de 1,4 filhos por mulher.
A transição
da fecundidade na Tailândia começou quando o país era fundamentalmente rural e
de baixa renda. Não temos dados da renda per capita nas décadas de 1960 e 1970,
mas observa-se que em 1980 a renda per capita da tailandesa era de somente US$
1,6 mil, segundo dados do FMI em poder de paridade de compra (ppp, na sigla em
inglês).
Mesmo sendo
um país de baixa renda e rural, a Tailândia apresentou um rápido crescimento
econômico nas últimas 4 décadas e deve apresentar uma renda per capita acima de
US$ 20 mil no ano 2020. Aliás, em 2017, a Tailândia já tinha uma renda per
capita maior do que a renda brasileira, apesar da renda per capita brasileira
ter sido três vezes maior do que a tailandesa, em 1980. A Tailândia soube
aproveitar o bônus demográfico e pode se tornar um país de renda alta.
O que todos
estes dados mostram é que a transição da fecundidade é um fenômeno essencial
para a elevação da renda per capita e para o aumento do bem-estar geral de uma
nação. Infelizmente ainda existem muitas “escoras culturais pronatalistas” que
dificultam a queda da TFT em muitos países.
Os setores
antineomalthusianos se vangloriam de propagar a resistência aos métodos contraceptivos
modernos e de combater a autodeterminação sexual e reprodutiva, mas a única
coisa que conseguem é uma vitória pírrica, pois evitar a transição demográfica
é o mesmo que condenar uma nação a um eterno estado de pobreza. (ecodebate)
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