Mudança do clima aumentou risco de incêndios
florestais na Austrália, aponta novo estudo.
Incêndios florestais na Austrália.
De acordo com cientistas, as chances de episódios
como os incêndios recentes no sudeste da Austrália acontecer aumentaram ao
menos 30% por conta da mudança do clima causada pelas emissões antropogênicas
de gases de efeito estufa.
A mudança do clima causada pela humanidade
contribuiu para criar condições meteorológicas propícias para os incêndios
florestais no sudeste da Austrália do final de 2019 e começo de 2020, aponta
uma análise feita pelo World Weather Attribution, um grupo internacional que
reúne renomados cientistas da área de clima.
Os pesquisadores concluíram que a mudança do clima
causada pela elevação da concentração de gases de efeito estufa na atmosfera da
Terra aumentou as chances da Austrália passar por episódios extremos de
incêndio florestal em ao menos 30% – mas esse valor pode ser ainda maior, já
que a tendência de calor extremo é um dos principais fatores nesse processo e
os modelos climáticos ainda subestimam essa tendência na análise.
“As alterações climáticas fazem parte da paisagem
atual da Austrália. O calor extremo é claramente influenciado pelas mudanças
climáticas causadas pelo Homem, que podem influenciar as condições de fogo”,
diz Sophie Lewis, pesquisadora da University of New South Wales, na Austrália.
“Temos evidências de que as estações de fogo na Austrália se tornaram mais
prolongadas e intensas, e as temperaturas extremas têm desempenhado um papel
importante nisso”.
Se as temperaturas globais se elevarem até 2°C, o
estudo aponta que as condições para episódios como esse na Austrália se
tornarão ao menos quatro vezes mais comuns como resultado da mudança do clima.
O estudo de atribuição observou o Fire Weather
Index, que mede as condições meteorológicas relacionadas ao risco de incêndios
florestais nas áreas no sudeste da Austrália que foram as mais afetadas pelos
incêndios em 2019/2020. Ele comparou as condições atuais, com pouco mais de 1°C
de aquecimento global, com o clima observado por volta do ano 1900, usando
registros e modelos climáticos.
Os pesquisadores também examinaram o calor extremo e
a seca meteorológica (períodos de precipitação extremamente baixa), que são
elementos importantes no Fire Weather Index. Uma semana de temperaturas
quentes, como aquela vivida no sudeste australiano em dezembro de 2019,
tornou-se ao menos duas vezes mais provável por conta da mudança do clima
causada pela humanidade. Ondas de calor como aquela observada na Austrália em
2019/2020 são agora mais quentes em cerca de 1-2°C do que as registradas por
volta de 1900.
Períodos de precipitação extremamente baixa são mais
relevantes para o clima de incêndio do que as tendências de precipitação média,
que são um motor da seca agrícola. Os extremos secos anuais tornaram-se um
pouco mais comuns no sudeste da Austrália, com 2019 sendo o ano mais seco desde
1900, embora a tendência esteja dentro do intervalo esperado das flutuações
climáticas naturais. Os pesquisadores não foram capazes de ligar diretamente o
recente recorde de baixa pluviosidade anual nem o mês mais seco da estação de
incêndios com a mudança do clima. Outros aspectos da seca não incluídos no
estudo, como baixo suprimento de água e solos secos, são influenciados pelas
temperaturas altas e, por isso, estão ligados à mudança do clima.
As condições de incêndios descritas pelo Fire
Weather Index desde 1979 pioraram mais rapidamente do que as simuladas pelos
modelos climáticos. O risco climático do fogo aumenta em grande parte devido a
eventos de calor mais intenso. Os modelos climáticos subestimam essa tendência
no sudeste da Austrália, como pesquisas anteriores também apontaram em outras
partes do mundo. Assim, enquanto os modelos climáticos mostram que a mudança
climática causada pela humanidade aumentou em pelo menos 30% as chances da
Austrália ter registros extremos do Fire Weather Index, os pesquisadores
concluíram que o verdadeiro aumento poderia ser muito maior, com base na sua
análise observacional e na subestimação das tendências de calor extremo.
“Descobrimos que os modelos climáticos lutam para
reproduzir esses eventos extremos e suas tendências de forma realista. No
entanto, eles sempre subestimam o aumento das chances de risco extremo de
incêndio, como a Austrália viu nos últimos meses”, aponta Geert Jan van
Oldenborgh, do Instituto Real Meteorológico dos Países Baixos. “Isso significa
que sabemos que o efeito é maior que os 30% de aumento observado, o que já é
uma influência significativa do aquecimento global”.
Outras ligações entre mudança do clima e o risco de
incêndio na Austrália estavam além do escopo do estudo, tais como fontes de
ignição e estações de incêndio prolongadas que diminuem a janela para a redução
segura do risco de incêndio.
Estudos de atribuição como esse são importantes para
analisar o efeito da mudança climática global sobre eventos meteorológicos
locais. “Diante de incêndios como estes, a questão não é apenas se o clima em
transformação está tendo um efeito sobre o fogo, mas como essas mudanças estão
afetando esses eventos e sua probabilidade”, explica Friederike Otto, da
University of Oxford no Reino Unido. “Nossa pesquisa apontou que a mudança
climática é, de fato, um fator importante nesses episódios em âmbito local. Por
isso, precisamos continuar testando nossos modelos climáticos no mundo real, de
modo a fornecer informações com maior confiança sobre riscos climáticos no
nível local, na escala em que as pessoas vivem e tomam decisões”.
Para Maarten van Aalst, do Centro Climático da Cruz
Vermelha e Crescente Vermelho Internacional, episódios como os incêndios
recentes na Austrália reforçam as dificuldades que eventos climáticos extremos
impõem às pessoas, especialmente aquelas mais vulneráveis. “As alterações no
clima já estão tornando o trabalho humanitário mais difícil. Estamos
enfrentando riscos maiores e mais surpresas. Este estudo mostra que esses
riscos crescentes também se refletem em perda maciça como a que observamos na
Austrália na virada para o ano de 2020. Pessoas e comunidades têm sido
duramente atingidas e a recuperação pode levar muitos anos. Os riscos
climáticos crescentes significam que a adaptação e a resiliência são críticos,
mas por si só não são suficientes – reduzir emissões é crucial”.
Sobre o World Weather
Attribution (WWA)
O World Weather Attribution (WWA) é um grupo de
colaboração internacional que analisa e comunica a possível influência das
mudanças climáticas em eventos climáticos extremos, tais como tempestades,
chuvas extremas, ondas de calor, períodos de frio e secas.
Mais de 230 estudos examinaram se as mudanças
climáticas tornaram mais prováveis determinados eventos climáticos. Um estudo
recente do mesmo grupo descobriu que a mudança climática tornou mais provável a
onda de calor recorde de junho na França. Também constatou que a chuva na
tempestade tropical Imelda, que atingiu o Texas em setembro, foi tornada mais
provável e intensa pelas mudanças climáticas.
Os incêndios florestais em toda a Austrália em
2019-20, particularmente ao longo da costa sudeste, queimaram mais de 11
milhões de hectares (uma área maior que a Irlanda ou Coreia do Sul), destruíram
quase 6.000 edifícios e mataram pelo menos 34 pessoas e mais de 1,5 bilhão de
animais. Os custos econômicos dos incêndios podem chegar a 100 bilhões de
dólares, de acordo com estimativas separadas.
Incêndio atinge área florestal em Nova Gales do Sul,
na Austrália.
Fumaça tóxica põe maior cidade australiana em alerta
por incêndio florestal. (ecodebate)
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