Eventos climáticos atípicos
aumentam mortalidade de árvores em florestas tropicais.
Estudos sobre a dinâmica
florestal, realizados pela Embrapa, nos estados do Acre e Amazonas, comprovam
que eventos climáticos atípicos como El Niño e La Niña elevam as taxas de
mortalidade de árvores e afetam o desenvolvimento das florestas em áreas
tropicais. Resultados de 20 anos de pesquisa revelaram que com a ocorrência
desses fenômenos, a média de mortalidade de árvores subiu de 2% para 5%, em
função do déficit hídrico causado por esses fenômenos.
Segundo o pesquisador da
Embrapa Acre Marcus Vinício d’Oliveira, em florestas não manejadas da Amazônia
a mortalidade de árvores varia entre 1% e 2% por ano. Mesmo em áreas bem
manejadas, após o corte florestal é esperado um aumento na mortalidade de
árvores, que cessa com o tempo. Nas florestas estudadas foram identificadas
taxas superiores a 5%, com maior incidência em árvores maiores.
“Ao contrário de uma redução paulatina,
observamos picos de mortalidade, apesar do uso de técnicas adequadas de manejo.
Em diversas localidades, esse aumento ocorreu em um período de tempo superior a
dez anos, após a extração madeireira. Portanto, acreditamos não estar associado
à atividade de manejo florestal, mas a períodos mais longos de seca,
decorrentes da passagem do El Niño e La Niña nesse intervalo de tempo”, relata.
Árvores de grande porte são
mais vulneráveis.
Os estudos também mostraram
que espécies florestais com diâmetro superior a 50 centímetros são mais
susceptíveis aos efeitos de eventos climáticos. “Situações de estresse hídrico
alteram os mecanismos hidráulicos das árvores. No interior do tronco da planta,
a pressão que possibilita o transporte da seiva bruta das raízes para as folhas
diminui. Em árvores de grande porte, essa redução é mais acentuada, podendo
resultar na vaporização de líquidos pela formação de bolhas, fenômeno conhecido
como cavitação, que causa a falência hidráulica e pode levar a planta à morte”,
explica o pesquisador Luís Cláudio de Oliveira.
As pesquisas também revelaram
que a elevação do índice de mortalidade de árvores influencia a taxa de meia
vida da floresta, ou seja, o tempo estimado para substituição de metade da sua
população original. Segundo Marcus d’Oliveira, nas áreas manejadas, foco do
estudo, esse tempo ficou em torno de 20 anos, enquanto em florestas não
manejadas, com mortalidade anual de até 2%, estima-se que o processo de
regeneração demore entre 35 e 70 anos.
“Por outro lado, a elevada
mortalidade de árvores abre clareiras na floresta que aumentam a disponibilidade
de luz e diminuem a competição por nutrientes. Isso permitiu o ingresso e
estabelecimento de novas plantas, fator que favoreceu a regeneração da floresta
e o ganho de biomassa em árvores menores, com diâmetro entre 20 e 50
centímetros”, afirma.
Efeitos climáticos são
maiores do que se imaginava
Estudos sobre dinâmica de
crescimento em florestas tropicais brasileiras, realizados no âmbito da Rede
TMFO (Tropical Managed Forests Observatory), também indicam a influência de
eventos climáticos atípicos sobre esses ambientes. “No Sudoeste da Amazônia,
entretanto, os efeitos são mais visíveis devido à existência de uma estação
seca mais demarcada do que em outras faixas dessa região”, diz Marcus
d’Oliveira.
Para o especialista, a constatação de que os
eventos climáticos podem causar mais impactos na floresta do que a extração de
madeira foi uma surpresa e evidencia a necessidade de incorporar novas práticas
de manejo para aumentar a resiliência das florestas tropicais frente a essas
ocorrências.
Manejo adequado é capaz de
mitigar impactos.
Compreender a dinâmica de
crescimento das florestas, os seus mecanismos de resistência e suas
vulnerabilidades a eventos naturais tem sido um desafio para a pesquisa. Esses
conhecimentos são a base para a definição de modelos mais sustentáveis para o
manejo florestal, por permitirem estabelecer parâmetros adequados para o volume
de madeira a ser retirado e o tempo de descanso necessário para a floresta se
recuperar e repor seu estoque, entre outros aspectos essenciais para reduzir
impactos na atividade florestal.
Além disso, ajudam a indicar
caminhos eficientes para mitigação dos impactos de eventos climáticos sobre a
floresta. Uma das estratégias recomendadas pela pesquisa para reduzir a taxa de
mortalidade e aumentar a produtividade em florestas manejadas é a aplicação de
práticas silviculturais, de forma individual ou em grupos de espécies
florestais com comportamento semelhante.
“Intervenções como retirada
de árvores de grande porte, sem valor comercial ou malformadas, e corte de
cipós favorecem o crescimento de espécies comerciais e aumentam a sua densidade
na floresta. Esses procedimentos permitem que as árvores atinjam o diâmetro
mínimo recomendado para o manejo (50 centímetros), com melhor aproveitamento do
potencial econômico das espécies e garantia do seu ciclo de vida na floresta”,
ressalta Luís Oliveira.
Trabalho de campo.
As pesquisas para
monitoramento de florestas tropicais manejadas são desenvolvidas pela Embrapa
desde 1992, em nove áreas exploradas comercialmente com uso de técnicas de
manejo de baixo impacto, localizadas no sudoeste da Amazônia. Executados em
parceria com o governo do Acre e empresas do setor florestal, os estudos têm
como objetivo determinar o comportamento da floresta após o corte seletivo de
espécies madeireiras.
São estudadas mais de uma
centena de parcelas florestais, a maioria com um hectare. No Acre, as áreas
monitoradas estão implantadas nas Florestas Estaduais do Antimary (Sena
Madureira), dos Rios Gregório, Liberdade, Mogno e Terra Indígena Kaxinawá de
Nova Olinda (Tarauacá), no seringal Filipinas, localizado na Reserva
Extrativista Chico Mendes (Xapuri), e na Embrapa Acre (Rio Branco). No
Amazonas, as áreas de estudo se concentram na Fazenda Iracema II, no município
de Lábrea.
O trabalho de campo envolve a
medição das árvores antes e depois da primeira exploração e remedição em
intervalos de três a cinco anos, por engenheiros florestais, identificadores
botânicos e escaladores de árvores e outros profissionais. Com auxílio de
geotecnologias, como drones e o sistema Lidar (Light detection and ranging), as
equipes coletam informações sobre altura, tamanho da copa e diâmetro das
árvores, variáveis que funcionam como indicadores de crescimento das espécies,
e dados relacionados à forma do tronco e posição das árvores em relação ao
dossel.
De acordo com Luís Oliveira,
além de permitir calcular as taxas de mortalidade, ingresso e crescimento de
árvores, essas variáveis possibilitam estimar o tempo necessário para a
recomposição dos estoques de madeira após o corte, informação essencial para
garantir sustentabilidade à atividade de manejo. Os resultados possibilitam
avaliar o comportamento da floresta e o seu potencial produtivo e projetar os
ganhos em volume de madeira para cortes futuros.
“Além disso, o monitoramento
de áreas com base em inventários florestais contínuos (IFC) possibilita
avaliações sobre aspectos da composição de espécies comerciais e da população
de árvores em geral, com ênfase na definição de práticas silviculturais
necessárias para minimizar danos e otimizar o desenvolvimento de florestas
manejadas”, destaca o pesquisador.
Pesquisa de longo prazo
Fenômenos climáticos extremos são acontecimentos
com impactos globais no meio ambiente. Pesquisas sobre mudanças climáticas
revelam que El Niño ocorre em intervalos de dois a sete anos, podendo
apresentar intensidade fraca, moderada ou forte. Nos últimos 40 anos seus
efeitos mais intensos foram registrados em 1987, 1997, 2005, 2010, 2011 e 2015,
dados confirmados pelas pesquisas da Embrapa.
Segundo Marcus d’Oliveira,
esses resultados indicaram uma tendência desse evento climático se tornar cada
vez mais frequente, com alterações na composição e estrutura das florestas. “No
entanto, como as pesquisas sobre dinâmica florestal são um processo de longo
prazo, duas décadas é um tempo relativamente curto para inferências
definitivas. Para entender de forma mais completa o comportamento das florestas
em relação a esses fenômenos precisamos avançar em análises que considerem
séries temporais mais abrangentes”, pondera o especialista. (ecodebate)
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