“Todos os nossos problemas
ambientais se tornam mais fáceis de resolver com menos pessoas e mais difíceis
e, em última instância, impossíveis de resolver com cada vez mais pessoas” -
David Attenborough.
O mundo está ficando cada vez
mais urbanizado, tanto em termos absolutos, quanto em termos relativos.
População urbana era de 750 milhões de habitantes em 1950, representando 29,6%
da população total. Em 2008, a população urbana global chegou a 3,4 bilhões de
habitantes, representando 50% da população total. A partir desta data o mundo
passou a ter maioria da população vivendo em cidades.
O processo de urbanização já
trouxe muitos ganhos históricos, mas poderá trazer vantagens ainda maiores nas
próximas décadas. As transições urbana e demográfica são dois fenômenos
fundamentais da modernidade e acontecem de forma sincrônica, como mostraram
Martine, Alves e Cavenaghi (2013).
Também de forma sincrônica
ocorrem o processo de modernização e de aquecimento global. Entre 1770 e 2020,
a economia global cresceu 135 vezes, a população mundial cresceu 9,2 vezes e a
renda per capita cresceu 15 vezes. Este crescimento demoeconômico foi maior do
que o de todo o período dos 200 mil anos anteriores, desde o surgimento do Homo
sapiens. Mas todo o crescimento e enriquecimento humano ocorreu às custas do
desequilíbrio climático que prevaleceu no Holoceno (últimos 12 mil anos).
Em função do crescimento das
atividades antrópicas, as emissões globais de CO2 que estavam em 2
bilhões de toneladas em 1900, passaram para 6 bilhões de toneladas em 1950,
chegaram a 25 bilhões de toneladas no ano 2000 e atingiram 37 bilhões de
toneladas em 2019. A concentração de CO2 na atmosfera que permaneceu
abaixo de 280 partes por milhão (ppm) durante todo o Holoceno, subiu
rapidamente após a Revolução Industrial e Energética. A concentração de CO2
chegou a 300 ppm em 1920, atingiu 317 ppm em março de 1960 e pulou para 417 ppm
em maio de 2020. Em consequência do efeito estufa, as temperaturas do Planeta
estão subindo e acelerando as mudanças climáticas e seus efeitos danosos sobre
a vida na Terra.
Indubitavelmente, o mundo vai
ter um grande crescimento urbano até 2050 e também terá um aumento do
aquecimento global. Mas a questão que se coloca é a seguinte: é melhor
enfrentar os desafios do crescimento populacional na cidade ou no campo?
Existem muitas pessoas saudosistas que falam em desurbanização ou até mesmo “desmigração”. Alguns sonham com uma volta ao rural e com uma casa no campo, de preferência de “pau-a-pique e sapê, com carneiros e cabras pastando solenes no jardim”, como na música de Zé Rodrix. Mas o próprio mundo rural atualmente é bastante diferente do que foi no passado e a urbanidade já avançou para além das cercas que dividem o campo da cidade.
Diversos estudos mostram que os indicadores sociais e econômicos melhoram com o aumento da urbanização. Os países mais urbanizados tendem a ter maior renda, maior nível educacional, menor mortalidade infantil, maior esperança de vida, maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), menores níveis de violência, menor proporção de pessoas passando fome, menor mortalidade materna, menor desigualdade de gênero, etc. Em geral, a concentração urbana permite ganhos de escala e ganhos do efeito de aglomeração, ao contrário da dispersão rural ou das pequenas cidades.
David Owen, no livro Green
Metropolis, mostra que os impactos ambientais (emissões, resíduos, ou consumo
de terra per capita) é menor nas cidades densas do que nas cidades espraiadas
ou nos países com população rural dispersa. Ele mostra que Nova Iorque,
especialmente Manhattan, é muito mais eficiente no uso da energia e tem menor
pegada ecológica per capita do que cidades como Washington ou Los Angeles. Por
exemplo, a verticalização das moradias e escritórios torna mais eficiente o
transporte coletivo, pois seria impossível manter metrôs e trens de alta
velocidade em áreas rurais ou mesmo em áreas suburbanas de baixa densidade
populacional. O fato é que a urbanização é uma tendência que veio para ficar e
vai se expandir nas próximas décadas.
No artigo “Global multi-model
projections of local urban climates” de Lei Zhao et. al., publicado na revista
Nature Climate Change, em 04/01/2021, os autores usam uma nova técnica de
modelagem para estimar que, no ano 2100, as cidades do mundo podem chegar a um
aquecimento de 4,4ºC em média. Isto deixaria muito para trás as metas do Acordo
de Paris. Em geral, os modelos climáticos globais tendem a desprezar as áreas
urbanas, pois estas representam apenas 3% da superfície terrestre do planeta.
As cidades são apenas um pontinho do território global. Contudo, o artigo
sugere que cidades mais quentes podem ser catastróficas para a saúde pública
urbana, que já sofre os efeitos do aumento do calor. Entre 2000 e 2016, de acordo
com a Organização Mundial da Saúde, o número de pessoas expostas a ondas de
calor saltou 125 milhões e o calor extremo ceifou mais de 166.000 vidas entre
1998 e 2017. Assim, o crescimento das cidades e o aumento do aquecimento global
– provocando ilhas de calor nas cidades – podendo gerar uma situação de
“cidades saunas”, tornando inabitáveis muitas megacidades do mundo,
principalmente nas áreas tropicais. Milhões de pessoas, especialmente idosos e
crianças, podem ser vítimas das ondas letais de calor.
Para conter o aquecimento
global é preciso haver um decrescimento demoeconômico. Voltar para o meio rural
não resolve o problema.
A solução é manter a taxa de urbanização em elevação, mas reduzir o tamanho das cidades por meio da redução demográfica. Assim, o mundo poderia ter maior proporção de habitantes nas cidades, mas as cidades seriam menores em função de um menor número de pessoas em decorrência da transição demográfica e da permanência de taxas de fecundidade abaixo do nível de reposição.
Artigo de Jim Robbins (BBC Future/Yale e360, 23/11/2020) mostra a natureza está passando por um processo de extinção em massa à medida que habitats naturais são alterados pela atividade humana. À medida que o ser humano continua a expandir rapidamente seu domínio sobre a natureza — desmatando e incendiando florestas, exterminando espécies e interrompendo funções do ecossistema — um número cada vez maior de cientistas e conservacionistas influentes acredita que proteger metade do Planeta de alguma forma será a solução para mantê-lo habitável. A ideia ganhou notoriedade pela primeira vez em 2016, quando Edward O. Wilson, o importante biólogo conservacionista, publicou a sugestão no livro “Da Terra Metade: O nosso planeta luta pela vida”.
Desta forma, a melhor maneira
de lutar contra o aquecimento global é concentrar a população global nas
cidades, mas em cidades menores, com mais áreas verdes, com agricultura urbana
e com uma economia sustentável, aumento das áreas anecúmenas e com regeneração
ecológica do mundo. (ecodebate)
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