quinta-feira, 1 de abril de 2021

Demografia Ponzi e o pavor ao decrescimento populacional

O crescimento populacional dos continentes: 1950-2100.

“A população mundial passou de 1 bilhão de habitantes em 1800 para quase 8 bilhões em 2020 por conta do mito da necessidade do crescimento e da ideologia pronatalista, vindas dos nacionalistas e patriotas que querem mais força e influência internacional; do Estado que quer mais impostos e mais contribuintes; dos militares que desejam bucha de canhão para as suas guerras; dos capitalistas que desejavam o aumento da força de trabalho e o crescimento do mercado consumidor; dos políticos que querem mais votos do eleitorado; dos sindicatos que querem ampliar suas bases; das igrejas que querem mais dízimos dos seus fiéis; e dos pais que querem o cuidado e a riqueza vinda dos filhos” João Abegão – 2019

Na história da humanidade e, principalmente depois da Revolução Industrial e Energética, aumentou a obsessão pelo crescimento tanto na área econômica, quanto na área demográfica. O crescimento demoeconômico é, em geral, defendido em nome da grandeza da Pátria e do empoderamento das empresas, das famílias, das religiões, etc. Existe uma forte associação entre “mais” e “melhor”, pois na ideologia crescentista, mais produção e mais consumo significa mais renda o que está correlacionado com mais bem-estar e mais felicidade com base no consumo.

Quando a população era relativamente pequena e a natureza absolutamente rica, o enriquecimento humano pode ocorrer em detrimento do empobrecimento ambiental. Desde o começo do uso generalizado dos combustíveis fósseis e da produção em massa de bens e serviços a economia cresceu dando a impressão que a humanidade iria conseguir uma riqueza infinita ou, pelo menos, muito grande.

Assim o crescimento demográfico alimentou o crescimento econômico e vice-versa. Em consequência, o pronatalismo tem sido uma força hegemônica no mundo. Durante o Holoceno (últimos 12 mil anos) o crescimento populacional foi algo impressionante como mostra o gráfico abaixo. Havia cerca de 4 milhões de humanos no ano 10 mil antes de Cristo, passou para 190 milhões de pessoas no ano 1 da Era Cristã, chegou a 1 bilhão por volta de 1800, 6 bilhões em 1999 e a população mundial deve chegar a 8 bilhões de habitantes em 2023.
A ganância pelo crescimento e pelo lucro ilimitado alimentou falsas promessas ao longo dos séculos, com destaque para o esquema Ponzi, que é uma operação fraudulenta e enganosa de investimentos do tipo pirâmide que envolve a promessa de pagamento de rendimentos anormalmente altos às primeiras “gerações” de investidores à custa do dinheiro pago pelos investidores das “gerações” posteriores. São inúmeros os exemplos de economia Ponzi ao longo da história, pois os investidores espertos buscam manipular a ganância das pessoas que buscam se enriquecer de maneira fácil.

Medo da população é uma constante. A ideologia pronatalista e até o pronatalismo coercitivo estão impregnados na sociedade.

Em 2019, jornalistas canadenses Darrell Bricker e John Ibbitson lançaram o livro “Empty Planet: The Shock of Global Population Decline”, onde contestam as previsões da Divisão de População da ONU que apontam que a população mundial vai continuar crescendo (mesmo que em ritmo menor) ao longo do século XXI, devendo alcançar cerca de 11 bilhões de habitantes em 2100. Autores fizeram alarmismo com a possibilidade de decrescimento populacional e não esconderam postura pronatalista antropocêntrica e ecocida. Eles reforçam o mito sobre a possibilidade de um crescimento populacional e econômico ilimitado (“Growthism”), embora o maior crescimento populacional possa gerar menos qualidade de vida ambiental e possa levar a um colapso ecológico.

População mundial vai crescer 53% e chegar a 11,2 bilhões em 2100, diz relatório da ONU.

Estudo demográfico prevê que a Índia vai ultrapassar a China e se tornar o país mais populoso até 2022.

Com a pandemia da covid-19 o fervor populacionista veio à tona. O jornalista católico conservador Ross Douthat, colunista do jornal New York Times, escreveu em 2020 o artigo “The Age of Decadence, onde diz que a verdadeira história do Ocidente no século 21 é de impasse e estagnação”. Ele associa o declínio populacional com a decadência da civilização. Por isto ele defende uma pirâmide populacional de base larga.

Mas há também visões contrárias ao pronatalismo, pois como a Terra é finita, algum dia a população vai ter que parar de crescer e até decrescer. Em janeiro de 2021, o demógrafo Joseph Chamie escreveu o artigo “Is the US population in decline? More ponzi demography”, onde ele diz: “Com o lançamento das estimativas da população dos EUA no final do ano e no final da década, a demografia Ponzi está novamente aparecendo nas manchetes, relatórios econômicos e comentários de investimento em todo o país. A mensagem básica que os defensores da demografia Ponzi querem que os americanos engulam é: o crescimento econômico requer o crescimento da população. Mas, como todos os esquemas de pirâmide, a demografia Ponzi é uma farsa”.

Os EUA têm hoje em dia uma população de 333 milhões de habitantes e as projeções indicam que chegará a 400 milhões de habitantes por volta de 2060. Mas os defensores da demografia Ponzi evitam abordar a questão de por quanto tempo a população dos EUA deve continuar a crescer e qual o impacto de tudo isto sobre o meio ambiente. Acima de tudo, têm pavor ao decrescimento demográfico.

Mas como disse o economista ecológico Kenneth Boulding: “Qualquer um que acredita em crescimento exponencial infinito em um mundo finito ou é louco ou economista”. Também o economista britânico E. F. Schumacher escreveu o livro “Small is Beautiful: A Study of Economics as if People Mattered” onde mostra que a obsessão pelo crescimento e a grandeza nacional pode levar a civilização ao colapso.

A transição demográfica e o crescimento populacional no mundo.

Só existe um Planeta e a natureza não depende do ser humano, ao contrário, o ser humano é que depende da natureza, ao invés de defender a economia e a demografia Ponzi o melhor seria seguir o conselho de David Attenborough: “Em vez de controlar o meio ambiente em benefício da população, talvez devêssemos controlar a população para garantir a sobrevivência do meio ambiente”. (ecodebate)

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