O climatologista Carlos Nobre,
doutor pelo Massachusetts Institute of Technology e membro da Rede de
Especialistas em Conservação da Natureza, alerta que caso o Acordo de Paris,
que visa frear as emissões de gases de efeito estufa no contexto do
desenvolvimento sustentável, não seja cumprido, o Brasil deixaria em pouco
tempo de ser a potência agrícola que é hoje.
“Se a temperatura subir entre
3°C e 4°C, o Brasil não terá mais condições de manter uma expressiva produção
agrícola. Talvez apenas a Região Sul tenha alguma condição. A pecuária também
vai cair muito”, afirma Nobre. O Brasil sofreria, portanto, impactos
significativos na produção de alimentos e, por consequência, nas exportações.
O secretário-executivo do
Observatório do Clima e membro da Rede de Especialistas, Carlos Rittl, ressalta
que pode ocorrer uma mudança na geografia agrícola do país pela perda de
aptidão de solos agrícolas a determinadas culturas devido às mudanças nos
padrões de temperatura e pluviosidade a geográfica agrícola brasileira.
“Algumas regiões terão perda de aptidão para diferentes culturas, gerando até a
inviabilidade de produção. Há casos de produtores de café em Minas Gerais que
já estão migrando para outros cultivos”, relata.
Com a agricultura e a pecuária
sofrendo os impactos decorrentes do aquecimento global, o PIB brasileiro também
será afetado. O agronegócio representa cerca de 23% do PIB nacional. Seria,
portanto, um círculo vicioso que afetará toda a sociedade. Como consequência da
escassez de produção agrícola, os preços das mercadorias em supermercados e
feiras deverão se tornar mais caros para o consumidor final e perda de
competitividade nos mercados internacionais.
A alteração climática gerará
ainda outros impactos. Um deles é que terá maior tendência em aumentar o fluxo
migratório de pessoas que deixarão o interior para morar em capitais. Afinal,
com a produção agrícola em queda, as pessoas buscarão outras fontes de renda.
“Este êxodo rural tem uma série de implicações, inclusive para a capacidade das
cidades de oferecer serviços públicos adequados para aqueles que fogem das
regiões cujo clima se tornou impróprio para a subsistência das famílias”,
ressalta Rittl.
A saúde é outra área que terá
impacto decorrente da mudança climática e ambiental. Quanto mais emissão de
poluentes, mais pessoas ficarão doentes, especialmente crianças e idosos. “Temperaturas
muito elevadas podem gerar graves problemas de saúde para a população, em
especial os mais idosos e bebês, em especial doenças cardiorrespiratórias”. Mas
as doenças transmitidas por mosquitos, como zika, dengue, Chikungunya, febre
amarela e malária, entre outras, podem ter sua área de ocorrência ampliada e
levar a muito mais casos. Além disso, a falta ou o excesso de chuvas leva ao
consumo de água impropria ou contaminada pela população, o que aumenta os
riscos de outras doenças. “Além do impacto para a saúde do ser humano, os
custos para a saúde pública também irão aumentar”, afirma Rittl.
Adaptação
A mudança climática já é uma
realidade. Para isso, é necessário que haja um processo de adaptação. Uma das
estratégias, como explana Nobre, é a restauração florestal. “As árvores são
essenciais para retirar o excesso de gás carbônico que produz o aquecimento
global pelo efeito estufa da atmosfera”, afirma. Além disso, estudos recentes
confirmam que a restauração florestal em bacias hidrográficas é uma estratégia
para garantir a segurança hídrica e reduzir os custos com o tratamento da água.
Nesse caminho, é fundamental o Brasil cessar o processo de desmatamento.
Outro ponto que Nobre ressalta é a necessidade de uma redução na emissão de poluentes na atmosfera. Para tanto, a matriz energética e o transporte devem ser revistos. “Para o transporte a saída é utilizar carros, caminhões e ônibus movidos à eletricidade. O Brasil está atrasado neste sentido. Mas isso irá acontecer no país”, afirma. Atualmente, a maioria dos meios de transporte no Brasil usa gasolina ou diesel, que emitem gás carbônico e vários poluentes que impactam a saúde.
Ele também acredita ser fundamental apostar em fontes de energia renováveis, como a solar e a eólica. “O Brasil tem potencial para isso. As usinas hidrelétricas existentes funcionariam como uma espécie de enorme bateria que seria acionada quando necessário. É preciso apostar nisso até chegar a condição que todas as pessoas tenham uma pequena usina em casa, gerando sua própria energia elétrica”, aponta Nobre. Isso já é realidade para cerca de 40 mil brasileiros, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). (ecodebate)
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