quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Florestas sul-americanas estão à beira de se tornar fontes de carbono

As florestas tropicais da América do Sul são um dos maiores sumidouros de carbono do mundo, tirando bilhões de toneladas métricas de dióxido de carbono (2CO2) da atmosfera a cada ano. Mas essa capacidade diminuiu à medida que as temperaturas globais aumentaram.
Desmatamento flagrado pelo Ibama

A capacidade das plantas de estocar carbono cessou durante o El Nino de 2015-2016, quando as temperaturas dispararam e as árvores morreram.

As florestas tropicais da América do Sul são um dos maiores sumidouros de carbono do mundo, tirando bilhões de toneladas métricas de dióxido de carbono (2CO2) da atmosfera a cada ano. Mas essa capacidade diminuiu à medida que as temperaturas globais aumentaram. Um estudo recente publicado na Nature Climate Change mostrou que, durante o El Nino 2015-2016, quando algumas partes da América do Sul experimentaram um aquecimento recorde e provavelmente a seca mais severa em décadas, a diferença entre o carbono que essas florestas tropicais absorveram e emitiram era praticamente zero.

Durante um evento do El Nino, os ventos do Leste enfraquecem e as temperaturas da superfície do mar no leste tropical do Oceano Pacífico sobem. Esse fenômeno aumenta as temperaturas globais por meses, com o clima sul-americano particularmente interrompido devido à proximidade do continente com o Pacífico. Portanto, o evento é uma oportunidade para os cientistas avaliarem os impactos a longo e curto prazo do calor e da seca nas florestas.

No novo estudo, mais de 100 pesquisadores de várias instituições rastrearam milhares de árvores em 123 lotes florestais em toda a América do Sul por mais de 30 anos. As parcelas, parte da Rede de Inventário Florestal Amazônica e do Programa Brasileiro de Pesquisa em Biodiversidade, incluíram manchas intactas de vegetação na Amazônia, na Mata Atlântica e no Cerrado, uma savana tropical nas terras altas brasileiras.

Os pesquisadores estimaram a quantidade de biomassa e carbono que as árvores estocavam medindo seus diâmetros do tronco ao longo dos anos. Conforme crescem, as árvores tiram carbono do ar através da fotossíntese, transformando-o em biomassa que compõe seu tronco, raízes e folhas. Mas as árvores também emitem carbono através da respiração enquanto estão vivas e pela deterioração depois de morrerem.

Os dados mostraram que durante o evento El Nino, altas temperaturas e secas levaram ao aumento da mortalidade das árvores e ao crescimento mais lento. Isso fez com que a quantidade de carbono emitido anulasse a quantidade de carbono absorvida. Antes do El Nino 2015-2016, cada hectare de floresta estudada armazenava cerca de um terço de tonelada métrica de carbono por ano. Durante o evento, esse saldo foi próximo de zero.

Estudos anteriores mostraram que os sumidouros de carbono nas florestas tropicais da América do Sul, especialmente na Amazônia, têm diminuído desde o início dos anos 90. Uma pesquisa recente até apontou que algumas partes da Amazônia já emitem mais carbono do que absorvem. Alguns cientistas previram que, se as emissões globais de CO2 continuarem no ritmo atual, essa capacidade de estocar carbono pode cessar completamente antes de 2040.

“Há um alto risco de que as florestas que têm sido nossas aliadas no combate às mudanças climáticas se transformem em fontes significativas de carbono, o que terá um enorme impacto climático global”, disse o coautor Thaiane Rodrigues de Sousa, ecologista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia no Brasil.

Florestas dos EUA podem se tornar emissoras de carbono em breve.

Árvores maiores morrem de sede

O novo estudo também ajudou a explicar como diferentes florestas tropicais respondem a temperaturas mais quentes. Alguns cientistas levantaram a hipótese de que as florestas mais quentes e secas poderiam se adaptar mais facilmente à seca futura e ao calor extremo, porque evoluíram nesses climas durante séculos. De fato, estudos semelhantes mostraram que as florestas tropicais africanas permaneceram sumidouros de carbono eficazes durante os eventos do El Nino.

Mas a nova pesquisa indicou que o oposto vem acontecendo na América do Sul. As árvores cresceram menos e morreram com mais frequência em florestas mais secas, como áreas de transição na Mata Atlântica e no Cerrado, e em algumas regiões do sul da Amazônia brasileira e norte da Colômbia. Além disso, o risco de mortalidade foi maior para árvores maiores com menor densidade de madeira.

Sousa explicou que as árvores grandes são mais vulneráveis aos extremos climáticos porque precisam usar mais energia para puxar a água do solo até suas folhas. Quando as temperaturas são altas, as árvores grandes também “suor” mais do que outras através da evapotranspiração. E muita transpiração sem absorção suficiente de água pode deixar as plantas desidratadas.

“É como se eles morressem de sede”, disse Sousa.

Protegendo as florestas remanescentes

O novo estudo também ajudou a explicar como diferentes florestas tropicais respondem a temperaturas mais quentes. Alguns cientistas levantaram a hipótese de que as florestas mais quentes e secas poderiam se adaptar mais facilmente à seca futura e ao calor extremo, porque evoluíram nesses climas durante séculos. De fato, estudos semelhantes mostraram que as florestas tropicais africanas permaneceram sumidouros de carbono eficazes durante os eventos do El Nino.

Como os pesquisadores monitoraram apenas parcelas florestais intactas, eles não consideraram a quantidade de dióxido de carbono liberado através do desmatamento e dos incêndios florestais, que são desenfreados nas florestas da América do Sul.

Para a cientista climática Luciana Gatti, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que não esteve envolvida no estudo, os resultados servem como um lembrete da importância da proteção das florestas intactas remanescentes. Gatti tem pilotado aviões sobre a Amazônia para medir os níveis de carbono no ar por mais de uma década. Seus estudos mostraram que florestas intactas absorvem mais carbono do que aquelas em regiões devastadas por incêndios florestais e perto de zonas desmatadas. Ela disse que acha que a diferença se deve aos níveis mais altos de estresse das árvores.

“Há menos chuva nas regiões desmatadas, então as florestas ficam mais quentes, secas, mais estressadas e vulneráveis à mortalidade”, explicou Gatti.

Sousa concordou e pediu mais investimentos em pesquisa e políticas públicas para preservar as florestas. Como próximo passo, seu grupo de pesquisa avaliará como a presença de reservatórios subaquáticos pode afetar a resposta de uma floresta à seca. Esse tipo de pesquisa pode ajudar a identificar as florestas que são mais resistentes às mudanças climáticas e potencialmente ainda mais vitais para salvaguardar. “Mais do que nunca, precisamos nos concentrar em manter essas florestas protegidas”. (ecodebate)

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