Análise mostra que entre 63%
e 68% da população adulta vivendo em capitais no Brasil não consome frutas,
legumes e verduras regularmente. Produção local de alimentos pode garantir vida
mais saudável nas grandes cidades.
O que têm em comum as cidades
de São Paulo, Recife e Curitiba? A resposta é alarmante: mais da metade dos
seus habitantes vive com pelo menos uma doença crônica não transmissível (DCNT),
como câncer, diabetes, doenças cardiovasculares e respiratórias. Essas capitais
também registram baixo índice de consumo diário de alimentos saudáveis enquanto
os alimentos ultra processados estão cada vez mais presentes na rotina dos seus
habitantes.
Considerando esses fatos, o
policy brief “Produção de alimentos nas cidades e a promoção da saúde” defende
que a produção de alimentos nas cidades deve compor o rol de estratégias
públicas para frear a atual tendência de adoecimento por DCNT e promover a saúde
da população.
Fruto de uma parceria entre o
Instituto Escolhas e a Cátedra Josué de Castro de Sistemas Alimentares
Saudáveis e Sustentáveis – vinculada a Faculdade de Saúde Pública da
Universidade de São Paulo (FSP-USP), a publicação traça um panorama da saúde e
do consumo alimentar das populações de seis capitais – Rio de Janeiro, Belém,
Distrito Federal, além das outras citadas acima – a partir dos dados
disponíveis na pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças
Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) de 2023 e na Pesquisa Nacional de
Saúde (PNS) de 2019. A publicação traz, ainda, recomendações para uma eficaz
relação entre produção local de alimentos e estratégias de promoção da saúde
por meio da alimentação saudável.
Os dados do policy brief mostram que entre 63% e 68% da população das capitais brasileiras não consome frutas, legumes e verduras regularmente – isto é, cinco ou mais dias da semana. O percentual de pessoas vivendo nas capitais que não atingem o consumo recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) – 400g/dia/pessoa – é ainda mais alto: de 78%, segundo a Vigitel.
“Esse baixo consumo está, muitas vezes, vinculado ao preço dos alimentos in natura, especialmente nos segmentos sociais em situação de vulnerabilidade econômica. A produção de alimentos nas áreas urbanas tem um enorme potencial para atacar essa questão, colaborando para a redução dos custos de transporte e comercialização. E estamos falando de uma colaboração efetiva: estudos do Escolhas já mostraram que a agricultura urbana e periurbana na região metropolitana de São Paulo tem, por exemplo, potencial para abastecer 20 milhões de pessoas por ano com legumes e verduras. Em Belém, a agricultura em espaços ociosos poderia produzir mais de 20 mil toneladas de hortaliças e macaxeira em 344 hectares. Esse volume abasteceria 1,7 milhão de pessoas por ano, ou seja, toda a população da cidade”, explica Jaqueline Ferreira, gerente de portfólio do Escolhas.
Para além do preço, moradores
de áreas periféricas também enfrentam a baixa presença de estabelecimentos que
vendem produtos in natura, enquanto predominam aqueles que vendem produtos
ultra processados nesses territórios. O impacto disso na saúde é inevitável.
”Pesquisas científicas não
deixam dúvidas de que a ingestão adequada em quantidade e frequência de frutas
e vegetais variados é protetora da saúde, reduzindo o risco de desenvolvimento
de DCNTs, inclusive. Em contrapartida, o consumo frequente de ultra processados
é um importante fator de risco para o desenvolvimento dessas doenças. E o
cenário que vemos nas capitais estudadas é justamente o contrário do que
desejaríamos: baixa ingestão de frutas e vegetais, e crescente de ultra
processados, resultando em altos níveis de doenças crônicas. Para podermos
reverter esse cenário, além de estratégias de educação alimentar e nutricional,
que podem ajudar as pessoas a fazer melhores escolhas alimentares, é
fundamental que os alimentos in natura sejam produzidos e disponibilidades nas
cidades, perto das pessoas, melhorando as possibilidades de acesso físico e
financeiro a esses alimentos”, destaca Nadine Marques, pesquisadora da Cátedra
Josué de Castro.
Recomendações
O policy brief chama a
atenção para a responsabilidade da gestão pública, a quem cabe não apenas
fomentar a produção de alimentos nas cidades, mas também implementar ações para
que tais alimentos cheguem aos consumidores, especialmente àqueles em situação
de vulnerabilidade socioeconômica.
Um exemplo é a cessão de
áreas ociosas, como lotes vazios e áreas sob linhas de transmissão, para
coletivos de agricultores e associações. Além das hortas escolares,
equipamentos públicos como hospitais e unidades prisionais, também podem ser
espaços de produção de alimentos.
Outra recomendação trazida pela publicação é a aquisição de alimentos da agricultura urbana via compras públicas institucionais, em especial para equipamentos de segurança alimentar, como restaurantes populares e cozinhas solidárias.
“A produção de alimentos pode transformar as cidades de forma radical, melhorando a qualidade de vida nos espaços urbanos. Mas, para isso acontecer, a gestão pública, em seus diferentes níveis, precisa se comprometer com essa agenda e reconhecer sua importância dentre as estratégias de promoção da saúde e combate à fome”, completa a gerente do Escolhas. (ecodebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário