O posicionamento ecológico deve estar acima do econômico
Sem retórica ou exagero desmesurado, uma das mais urgentes
necessidades em termos de organização da sociedade é a de conciliar
desenvolvimento econômico com a promoção do desenvolvimento social, respeitando
e resguardando o meio ambiente. A ideia central é procurar compatibilizar as
dimensões econômica, social e ambiental; ponto de partida para tentar superar o
dilema dicotômico entre “crescer” e “preservar o equilíbrio ecológico”; dito de
outra forma, entre “prosperar” (econômica e socialmente) “sem destruir”
(ambientalmente).
Na essência, busca-se alcançar e cumprir três princípios
básicos que estão referenciados no Relatório Brundtland (publicado em 1987),
também conhecido como “Nosso Futuro Comum”: desenvolvimento econômico (aspiração
imanente da humanidade), proteção ambiental (o cuidado para com a nossa Casa
Comum, a Mãe Terra) e equidade social (a inclusão dos excluídos).
Com isso, para superar a dicotomia acima referenciada tem-se
um evidente questionamento do ecologismo sobre a racionalidade econômica, tendo
em conta que essa última, pelas lentes do pensamento neoclássico – que em geral
forma a maneira de pensar dos economistas – pouco se importa com as
consequências (degradação do capital natural) ambientais advindas de uma política
de intenso estímulo ao crescimento econômico.
Por sinal, alcançar o crescimento a qualquer custo se
transformou numa espécie de obsessão da macroeconomia convencional, ignorando
com isso os graves distúrbios gerados na biosfera, pondo em risco a base de
sustentação da vida, uma vez que, em decorrência da expansão econômica
produtiva, os limites biofísicos são completamente desrespeitados. É a
atividade econômica dilapidando o capital natural.
Nesse pormenor, cabe citar uma importante passagem que consta
do Manual Global de Ecologia (1993): “A produção de alimentos, energia e
artigos industrializados está fortemente relacionada à deterioração do sistema
que garante a vida na Terra. Entre 1950 e 1986, quando a população do mundo
duplicou, o consumo de grãos aumentou 2,6 vezes, o uso de energia cresceu 3,2
vezes, a potência efetiva da economia quadruplicou, e a produção de bens
manufaturados cresceu sete vezes. (…) Atualmente, o ser humano consome em
alimentos, direta ou indiretamente, cerca de 40% do total de terras cultivadas
no mundo”.
É exatamente por esse tipo de atuação invasiva (a atividade
humana interferindo nos ciclos naturais da Terra) que o crescimento econômico
não pode continuar sua “jornada” de deterioração dos recursos naturais e dos
ecossistemas.
Continuar estimulando a aceleração do crescimento da
atividade produtiva é aumentar substancialmente a perda de diversidade
biológica e dos serviços ecossistêmicos. Não há como escapar dessa verdade:
aumentar a produção econômica é, dentre tantos outros possíveis estragos
ambientais, sinônimo de “jogar” mais poluição na atmosfera.
Os elevados níveis de poluição e contaminação do ar não
deixam dúvidas quanto à reposta que esse tipo de prática econômica expansiva
oferece ao meio ambiente. No mundo, mais de dois milhões de pessoas morrem a
cada ano por “respirar poluição”, alojando nos pulmões pequenas partículas (PM
10) geradas pela queima de combustíveis fósseis, além da poluição de ozônio (O3).
Somente na América Latina e no Caribe, a cada ano, morrem
aproximadamente 35 mil pessoas devido à contaminação do ar; na Europa, são mais
de 150 mil e, no leste da Ásia, mais de 1 milhão de vidas são ceifadas pelo
mesmo motivo. É no mínimo vergonhoso presenciar que em pleno século 21 ainda se
computam vidas perdidas devido à poluição.
Por isso, o posicionamento ecológico, ao deixar claro que há
limites e medidas restritivas para o aumento da produção econômica, deve estar
acima do pensamento econômico tradicional, ferindo assim, para desespero dos
economistas tradicionais, o dogma atinente ao crescimento econômico, visto e
defendido, erroneamente, como fator preponderante para consolidar a
prosperidade de uma sociedade.
Com um padrão de consumo avassalador, alimentado pela
voracidade consumista de 20% da população mundial (1,4 bilhão de pessoas)
residente nas sociedades mais abastadas, o Planeta Terra apresenta sinais de
completo esgotamento, evidenciando que não suporta produções expansivas.
Não por acaso, 10% da terra fértil do planeta já se
transformou em deserto. Por ano, são perdidos 7 milhões de hectares.
Simplesmente, 60% dos principais serviços ecossistêmicos estão deteriorados. De
acordo com o documento “Avaliação Ecossistêmica do Milênio 2005”, nos últimos
50 anos perdemos 35% dos manguezais, 40% das florestas, 50% das áreas alagadas.
Os estoques de peixes estão 80% menores e a área cultivada do planeta cobriu
25% da superfície da Terra. Lamentavelmente, esses dados mostram que o
posicionamento econômico encontra-se acima da questão ambiental. Urge reverter isso.
(EcoDebate)
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