A riqueza antrópica
continua crescendo de forma concentrada. O relatório sobre a riqueza global, em
2014, do banco Credit Suisse
(The Credit Suisse Global Wealth Report 2014) atualiza um quadro bastante amplo
e esclarecedor da má distribuição da riqueza (patrimônio) das pessoas adultas
do mundo. A riqueza global foi estimada em USD$ 223 trilhões em 2012 (meados do
ano), passando para USD$ 263 trilhões em 2014. O número de pessoas adultas no
mundo era de 4,59 bilhões em 2012 e de 4,7 bilhões em 2014. A riqueza per
capita por adulto foi de USD$ 49.000,00 (quarenta e nove mil dólares) em 2012,
passando para USD$ 56.000,00 (cinquenta e seis mil dólares) em 2014.
Na base da pirâmide
da desigualdade, em 2014 estão 3,28 bilhões de pessoas com a riqueza abaixo de
10 mil dólares (são 69,8% em 2014 contra 69,3% em 2012). O montante da
“riqueza” deste enorme contingente foi de USD$ 7,6 trilhões, o que representava
somente 2,9% da riqueza global de USD$ 263 trilhões em 2014 (eram 3,3% em
2012). Ou seja, pouco mais de dois terços (2/3) dos adultos do mundo possuíam
somente 2,9% do patrimônio global da riqueza em 2014. A riqueza per capita
deste grupo foi de USD$ 2.316 (dois mil e trezentos e dezesseis dólares).
No grupo de riqueza
entre USD$ 10.000,00 e USD$ 100.000,00 havia 1,010 bilhão de adultos em 2014, o
que representava 21,5% do total de pessoas na maioridade no mundo. O montante
de toda a riqueza deste contingente intermediário foi de USD$ 31,1 trilhões, o
que representava 11,8% da riqueza global. A riqueza per capita deste grupo foi
de USD$ 30,7 mil.
No grupo de riqueza
entre USD$ 100.000,00 (cem mil dólares) e USD$ 1.000.000,00 (um milhão de
dólares) havia 373 milhões de adultos em 2014, o que representava 7,9% do total
de pessoas na maioridade no mundo. O montante de toda a riqueza deste
contingente intermediário foi de USD$ 108,6 trilhões, o que representava 41,3%
da riqueza global. A riqueza per capita deste grupo foi de USD$ 291 mil.
O grau de
concentração da riqueza fica claro quando somamos os dois grupos superiores da
pirâmide, aqueles com riqueza acima de 100 mil dólares, pois havia um total de
408 milhões de adutos (8,7%), com patrimônio total de USD$ 224,5 trilhões,
representando 84,7% da riqueza global em 2014 (mais do que os 82,4% de 2012).
Na parte de baixo da pirâmide, com 4,3 bilhões de pessoas, representando 92,3%
das pessoas, detinham somente 15,3% da riqueza mundial em 2014.
Neste início do
século XXI, a riqueza global passou de USD$ 117 trilhões em 2000 para USD$ 263
trilhões em 2014. Como houve crescimento da população, o patrimônio líquido
mundial por adulto aumentou em 77% entre 2000 e 2014. A riqueza mais do que
dobrou em todas as regiões exceto o Japão (que já era rico). A riqueza pessoal
na Índia e na China aumentou por um fator de 3,1 e 4,6, respectivamente.
O crescimento
econômico ocorreu de forma desigual e com aumento da concentração da riqueza.
Em 2014, a metade mais pobre da população mundial partilhava menos de 1% da riqueza
global, enquanto os 10% mais ricos (decil do topo da pirâmide) apropriavam de
87% da riqueza e o 1% mais rico (percentil do topo) concentrava 48,2% dos
ativos globais.
No ápice da pirâmide
2014, que abarca os 35 milhões de adultos milionários (riqueza acima de USD$
1.000.000,00), há 30,8 milhões de adultos com riqueza entre USD$ 1 a 5 milhões,
2,5 milhões de adultos com riqueza entre USD$ 5 e 10 milhões; 1,4 milhão de
adultos com riqueza de USD$ 10 a 50 milhões e 128.200 adultos com riqueza acima
de 50 milhões de dólares.
Assim, no topo do
ápice da pirâmide global existiam, em 2014, 128.200 Indivíduos ultrarricos
(definidos como aquelas cuja riqueza excede USD$ 50 milhões). Destes, 45.200
adultos possuem pelo menos USD$ 100 milhões e 4.300 têm ativos acima de USD$
500 milhões. A América do Norte domina o ranking com 65.500 indivíduos (51%) e
a Europa tinha 31.400 indivíduos (24,5%). Entre a China ocupa o segundo lugar
com 7.600 ultrarricos, Reino Unido (4.700), Alemanha (5.500), França (4100),
Taiwan (2000), Taiwan (2.000) e o Brasil com 1.900.
A tendência de maior
concentração de riqueza também pode ser vista quando se analisa a participação
dos 10% mais ricos (decil do topo da pirâmide) na apropriação do patrimônio
global. Houve aumento da desigualdade na maioria dos países.
Na China, por
exemplo, os 10% mais ricos da população detinham menos de 50% da riqueza em
2000 e passaram a concentrar 64% da riqueza em 2014. No Brasil, os 10% mais
ricos detinham 69,4% da riqueza em 2000 e passaram para 73,3% em 2014. Nota-se,
portanto, que a riqueza está mais concentrada entre os brasileiros do que entre
os chineses e, em ambos os países, a desigualdade tem aumentado no século XXI.
A riqueza média das
famílias do Brasil triplicou entre 2000 e 2014, passando de USD$ 7.900 por
adulto para USD 23.415. No entanto, o crescimento abrandou nos últimos anos,
sendo que a riqueza por adulto caiu 14% desde 2011 (o que tem a ver com a
desvalorização do Real). Mesmo assim, o Brasil tem 1.900 adultos com patrimônio
de mais de US$ 50 milhões, sendo que 200 novos “ultrarricos” foram
acrescentados somente no último ano.
O Brasil, assim como
outros países da América Latina, tem mais pessoas na faixa de riqueza entre
USD$ 10 mil a USD$ 100 mil em relação ao resto do mundo. Mas a desigualdade não
é menor que a média. Na verdade, há alta concentração da riqueza, pois o país
tem um índice de Gini da riqueza de 82%, tendo 225.000 milionários e 296.000
adultos no 1% mais rico dos detentores os ativos globais em 2014. O Brasil está
classificado pelo relatório do banco Credit Suisse no grupo da “desigualdade
muito alta” (topo do decil concentrando com mais de 70% da riqueza). Para 2019,
o relatório prevê um aumento de 47% no número de milionários brasileiros que
deve atingir o montante de 332 mil adultos com riqueza acima de um milhão de
dólares.
O processo de aumento
da desigualdade de riqueza no Brasil apontado pelo relatório do banco Credit
Suisse, aparentemente, contradiz os estudos que mostram uma redução da pobreza
e da desigualdade no Brasil. Acontece que os estudos realizados com base nos
dados da PNAD, do IBGE, levam em consideração apenas a renda pessoal e não a
riqueza ou o patrimônio das pessoas.
Estudo realizado por
Medeiros et. al. (2014), utilizando dados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (Pnad) e a renda declarada pelas pessoas ao Imposto de Renda,
encontrou um índice de Gini de 0,696 em 2006, seguido por 0,698 em 2009 e 0,690
em 2012. A pequena variação indica estabilidade na desigualdade brasileira.
Porém, mesmo incluindo dados do Imposto de Renda, o estudo ainda não capta
totalmente a renda do muitos ricos, especialmente o rendimento das Pessoas
Jurídicas e todo o processo de sonegação.
Em geral, podemos
dizer que houve, ao longo dos dois últimos séculos, uma redução da pobreza
absoluta e um aumento do bem-estar humano, paralelamente ao processo de
crescimento econômico com concentração da riqueza. Por exemplo, o relatório da
OCDE (02/10/2014), “Como era a vida?” trata do progresso humano no longo prazo
e do processo de desigualdade de renda, mostrando que, com exceção da África
Subsaariana, os países em geral se tornam mais iguais uns aos outros em termos
de bem-estar e mais desiguais em termos de PIB per capita, em especial nas
últimas décadas. Em 1820, menos de 20% da população do mundo era alfabetizada.
As taxas de alfabetização aumentou dramaticamente depois de 1945, atingindo
cerca de 80% até 2000. A expectativa de vida em todo o mundo subiu de menos de
30 anos em 1880 para quase 70 em 2010 Devido aos avanços na área da saúde, a
expectativa de vida melhorou mesmo quando o PIB per capita estagnou. Houve
forte progresso na redução da desigualdade de gênero ao longo dos últimos 60
anos em muitos países.
O estudo revela que
os salários dos operários, quando ajustados pela inflação, aumentaram cerca de
oito vezes em todo o mundo desde 1820, enquanto o PIB per capita aumentou 10
vezes no mesmo período. A desigualdade de renda caiu entre o final do século 19
até por volta de 1970, quando começou a subir acentuadamente. Na Europa
Oriental, a desigualdade subiu acentuadamente na década de 1990, após o colapso
dos regimes comunistas. A China também tem experimentado aumentos recentes.
Depois de 1980, a globalização contribuiu para o aumento da desigualdade de
renda dentro dos países, enquanto levou a um declínio na desigualdade de renda
entre as nações, segundo o relatório da OCDE.
Ou seja, o Brasil não
apresenta tendências diferentes do resto do mundo. Cresce o bem-estar humano
concomitantemente ao crescimento da desigualdade de riqueza (sem falar na
pauperização ecológica). Os estudos recentes sobre patrimônio mostram que a
concentração da riqueza continua a aumentar no país, mesmo o Brasil já estando
no bloco dos países mais desiguais do mundo. Evidentemente, a desigualdade
social é uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento, podendo
colocar em xeque a injusta pirâmide da riqueza global e jogando por terra as
conquistas em termos de qualidade de vida humana. (ecodebate)
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