Baixa vazão ameaça subida das
correntezas e reprodução de espécies como piavas, lambaris e dourados; estiagem
afeta turismo.
A pior seca da história do Estado
ameaça severamente a vida nos rios paulistas. O período da piracema, quando os
peixes migram em direção à nascente para se reproduzir, começou ontem com os
principais rios quase secos. “Será um desastre para a fauna aquática que só
muita chuva poderia evitar”, alerta Antonio Fernando Bruni Lucas, coordenador substituto
do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Peixes Continentais (Cepta), do
Ministério do Meio Ambiente.
De acordo com o órgão, se a
estiagem persistir, piavas, lambaris, dourados e curimbatás não encontrarão
água que os leve a nadar contra a correnteza para a desova. O drama se repete:
já no ano passado, em rios como o Piracicaba, o Pardo e o Mogi-Guaçu, os peixes
não conseguiram se reproduzir como deveriam.
Neste ano, segundo Lucas, a
situação está ainda pior. “Em época de chuva, a vazão do Mogi-Guaçu é de 200
metros cúbicos por segundo. Hoje estamos com menos de 10 metros.” Sem água, os
peixes ficam parados em poções à espera de que o nível aumente. Se isso não
acontece, as fêmeas reabsorvem as ovas e não há reprodução.
A piracema ocorre em todos os rios,
mas, de acordo com Lucas, os peixes parecem preferir aqueles em que há mais
corredeiras, que melhoram o nível de oxigênio na água.
O Rio Mogi-Guaçu, por exemplo, é
tido como um dos mais piscosos do Estado e, por isso, a piracema na Cachoeira
das Emas, em Pirassununga, entrou no calendário turístico. O dia 8 de dezembro,
quando ocorre o pico da subida, virou feriado municipal. A festa não terá
protagonista - o peixe. “Faremos a festa para manter a tradição, mas, se não
chover muito, vai ser com o rio seco”, diz Fábio Roberto Ferrari, do setor de
Comunicação da prefeitura.
Os turistas que procuravam a cidade
para admirar a cachoeira agora estão indo para ver o desastre ambiental. O
aposentado Ramiro da Silva, de 59 anos, viajou do sul de Minas para filmar o
leito seco. Caminhando pelas pedras, ele quase atravessou o rio sem molhar os
pés. “Nunca vi isso antes, vou mostrar para os amigos.”
O peixe continua no cardápio dos
restaurantes à beira-rio, mas agora vem de muito longe. “Nossa dourada é muito
boa, mas vem do norte do Pará”, conta Edson Lemos, garçom do restaurante
Dourado - o nome homenageia um peixe tradicional do Mogi-Guaçu. A comerciante
Caroline Silvestrini conta que o preço dos peixes mais comuns, como o lambari e
o curimbatá, mais do que dobrou. “Recebia curimbatá a R$ 6 o quilo. Agora,
entregam a R$ 15.” A culpa é da seca, segundo ela.
Desolação
Em Piracicaba, pescadores olham desolados
para o rio que dá nome à cidade e preveem que a piracema não vai acontecer. A
cachoeira, principal atração turística, está seca. “O rio precisaria subir pelo
menos dois metros, o que é quase impossível”, diz o pescador Eurides Fernão, de
62 anos. Ele conta que a última piracema “boa” foi em 2008.
No Rio Sorocaba, a subida dos
peixes é uma atração na escada da Represa San Juan, em Cerquilho, mas o nível
está tão baixo que dificilmente haverá piracema. Moradores das margens do Rio
Grande, em Colômbia, na divisa com Minas, presenciam anualmente a migração. Há
duas semanas, houve uma operação de salvamento de centenas de peixes.
Durante a piracema, há restrição na
pesca em todo o Estado para garantir a reprodução dos peixes e a renovação dos
estoques pesqueiros.
Peixes de Cachoeira de Emas estão
ameaçados pela seca e pela sujeira.
Produtor rural há mais de 50 anos
nunca viu uma seca desta forma.
Sem água, em Pirassununga,
Cachoeira das Emas é ponto turístico nesta época do ano. (OESP)
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