Negociações
climáticas ignoram questão da água em um mundo com escassez cada vez maior
Previsão
é de secas cada vez mais frequentes, inundações e alterações dos calendários
pluviométricos em geral, provocando riscos à saúde e à segurança alimentar,
além de importantes tensões geopolíticas.
As
negociações da Conferência Internacional do Clima (COP-21) – que acontecem em
dezembro, em Paris – não contemplam o problema da água, um recurso essencial
fortemente impactado pela mudança climática.
Os
negociadores reunidos na penúltima rodada de negociações prévias ao evento, em
Bonn, Alemanha, na semana passada, a menos de 100 dias da conferência, seguiram
ignorando o assunto. Ele simplesmente não aparece em nenhum documento
preliminar da conferência.
Apesar
disso, a situação da água é um dos principais indicadores sobre os efeitos da
mudança climática. Por causa do aumento da temperatura média global, até o
final do século as fontes renováveis na superfície e os recursos hídricos
subterrâneos diminuirão consideravelmente nas regiões secas subtropicais.
A
previsão é de secas cada vez mais frequentes, inundações e alterações dos
calendários pluviométricos em geral, provocando riscos à saúde e à segurança
alimentar, além de importantes tensões geopolíticas. Esse cenário é detalhado
no relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) lançado em 2014.
Além
disso, em escala planetária, estamos enfrentando alterações de ecossistemas
essenciais para o ciclo d’água como o derretimento das geleiras, a salificação
de mananciais (decorrente do aumento do nível do mar) e a acidificação dos
oceanos.
O
desafio aumenta considerando que, até 2050, a demanda de água crescerá 55%,
puxada pelos usos agrícolas, crescimento da população e pela produção de
energia, como explica o relatório “Água para um
mundo sustentável”, lançado por agências das Nações Unidas neste ano.
“A
água é o denominador comum de todos os aspectos da mudança climática. Mudança
climática é mudança hídrica”, ressaltou Torgny Holmgre, diretor executivo do
Instituto Internacional da Água de Estocolmo (SIWI, na sigla em inglês),
durante a Semana Internacional da Água, realizada em Estocolmo, Suécia, há 15
dias.
Os
especialistas que participaram do evento insistiram na necessidade de inserir o
tema da água nos processos de negociação relacionados ao financiamento
climático, – principalmente o Fundo Verde; aos Planos de Adaptação Nacionais; e
às Contribuições Nacionalmente Determinadas Pretendidas (INDC, sigla em
inglês). A ideia é que a inclusão do assunto nesses mecanismos faria da gestão
dos recursos hídricos parte essencial das ações de mitigação e de adaptação às
mudanças climáticas.
Amazônia
em foco
O
Brasil é o país mais rico em fontes de água doce não congelada. Só a Bacia
Amazônica contém 20% do recurso. Cientistas acreditam que a diminuição das
precipitações no Sudeste do país pode ser resultado das alterações climáticas
decorrentes do desmatamento da Amazônia. A floresta amazônica libera na
atmosfera, a cada dia, 20 milhões de toneladas de água que são transportadas
pelos ventos alísios até o Sudeste, por meio dos chamados “rios voadores”, com
um volume hídrico maior que o do próprio Rio Amazonas.
A
proteção das florestas e a governança hídrica são objetivos importantes para
garantir a segurança hídrica no planeta, segundo destacam as Nações Unidas no último relatório sobre Sustentabilidade Hídrica.
Mudança
climática, estresse hídrico e alimentação
Os
especialistas que participaram do encontro em Estocolmo reforçaram que os fenômenos
climáticos extremos já estão impactando as safras de numerosas culturas
agrícolas. “Cerca de 90% da agricultura no planeta depende da água da chuva”,
afirmou Malin Falkenmark, pesquisadora do SIWI.
Um
exemplo é o milho, que será um dos produtos mais afetados pela mudança
climática. De acordo com as estimativas do Grupo de Investigação de Agricultura
Internacional, a produção dessa cultura poderá ter uma redução de 25% até 2055.
No Brasil, até 2020 a produção de soja pode diminuir 24% e a do trigo, 41%,
segundo o World Resources Institute.
Evolução
das safras para 2050 em um mundo com um acréscimo de mais 3ºC na temperatura
média.
No
contexto das mudanças climáticas, os atuais padrões de uso de água para a
agropecuária são cada vez mais insustentáveis. Para a produção de um quilo de
carne bovina, por exemplo, são necessários atualmente 15 mil litros de água,
segundo a Rede da Pegada Hídrica, ao mesmo tempo em que muitas regiões do
planeta, principalmente na Ásia e na África Subsaariana, enfrentam situações de
alto estresse hídrico. Uma região ou população enfrenta estresse hídrico quando
a demanda supera a quantidade de água disponível. Em consequência, tornam-se
urgentes compromissos de eficiência e de redução do uso da água nos processos
produtivos como medidas essenciais de adaptação à mudança climática.
A
água nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
O
acesso à água limpa e segura é um direito humano essencial à vida, segundo uma
resolução das Nações Unidas aprovada em julho de 2010. A segurança de provisão
de água, de saneamento para todos e de gestão sustentável do recurso constitui
um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030 – que devem ser
aprovados no mês de setembro na assembleia das Nações Unidas em Nova Iorque.
Como
resultado dos esforços de cada país para alcançar a meta dos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio (ODM) para 2015, mais de 2,3 bilhões de pessoas no
mundo conseguiram acesso a fontes seguras de água desde 1990, segundo o
relatório de metas atingidas no decénio da água das Nações Unidas (2005-2015).
No
entanto, existem 1,6 bilhão de pessoas que moram em países e regiões com uma
escassez de água absoluta e estima-se que esse número possa crescer até 2,8
bilhões em 2025, segundo o Banco Mundial. (ecodebate)
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