“É
triste pensar que a natureza fala e que a humanidade não a ouve”
- Victor Hugo (1802-1885)
Preservar e
conservar o meio ambiente são tarefas essenciais, pois a humanidade depende da
natureza e não o contrário. As atividades econômicas necessárias para a
sobrevivência do ser humano e a expansão do bem-estar das pessoas dependem da
saúde dos ecossistemas. Sem ECOlogia não há ECOnomia.
Preservação
e conservação são termos diferentes, mas que podem ser equacionados em uma
visão holística de sustentabilidade ecocêntrica. Preservação quer dizer
proteção integral, ou seja, manter um determinado ecossistema intacto e sem
interferência da ação humana (áreas anecúmenas). Conservação significa
exploração das riquezas naturais, com avaliação de custos e benefícios,
garantindo a sustentabilidade para as atuais e futuras gerações (áreas
ecúmenas).
O grande
problema do mundo atual não é a diferença entre preservação e conservação, mas
sim a predominância generalizada da degradação ambiental. O crescimento das
atividades antrópicas aumentou muito desde o início do capitalismo industrial,
energizado pelos combustíveis fósseis. Segundo o site Our World in Data, em
1820, cerca de 94% da população mundial vivia abaixo da linha da extrema
pobreza, contra menos de 10% atualmente.
Mas o
crescimento exponencial ganhou momento depois da “grande aceleração” que
aconteceu após a 2ª Guerra Mundial. A população mundial passou de 2,5 bilhões
de habitantes em 1950 para 7,5 bilhões em 2017. Enquanto a população mundial
triplicou de tamanho, a economia internacional foi multiplicada por 12 vezes. A
renda per capita subiu 4 vezes. Ou seja, em 2016 havia 3 vezes mais gente no
mundo, do que em 1950, e cada pessoa ganhava e consumia, em média, 4 vezes mais
bens e serviços. Isto significa mais exploração e extração de recursos da
natureza e mais poluição e descarte de resíduos tóxicos, sólidos e líquidos.
A
humanidade ultrapassou a capacidade de carga do Planeta. A Global Footprint
Network mostra que em 1961 havia superávit ambiental no mundo e as atividades
antrópicas ocupavam apenas 73% da biocapacidade da Terra. Mas, com a “grande
aceleração” do Antropoceno, a reserva ecológica foi sendo reduzida e, a partir
de 1970, o superávit se transformou em déficit ambiental. Em 2013, a pegada
ecológica per capita do mundo subiu para 2,87 gha e a biocapacidade caiu para
1,71 gha. As atividades antrópicas passaram a utilizar 168% da biocapacidade,
ou seja, o déficit ambiental chegou a 68%, em 2013, e continua crescendo.
Só plantar árvores
não contempla os preceitos preservacionistas.
Segundo o
Stockholm Resilience Centre a humanidade já ultrapassou 4 das nove fronteiras
planetárias. Duas delas, a Mudança climática e a Integridade da biosfera, são o
que os cientistas chamam de “limites fundamentais” e tem o potencial para
conduzir o equilíbrio homeostático do Sistema Terra ao colapso.
Assim, o
rumo atual da economia internacional é insustentável, pois o progresso humano
ocorre às custas do retrocesso ambiental e sem os serviços ecossistêmicos e as
contribuições da biodiversidade é impossível manter o alto padrão de vida
humana. Portanto, é preciso preservar as áreas anecúmenas e conservar as áreas
ecúmenas. Além disto, é preciso ampliar as áreas anecúmenas (aumentar as áreas
preservadas e sem a presença humana) e decrescer as áreas ecúmenas (conservando
da melhor maneira possível o meio ambiente nas áreas com exploração antrópica
sobre o meio ambiente).
Por
exemplo, não faz sentido, do ponto de vista da sustentabilidade, liberar a
exploração de minério e de petróleo no Ártico, na Antártica e nos parques
nacionais. Assim como não faz sentido aumentar a presença humana em territórios
selvagens, quando o mundo caminha para a 6ª extinção em massa das espécies.
As
correntes que defendem a conservação ambiental são aquelas acreditam ser
possível conciliar o desenvolvimento econômico com a sustentabilidade
ambiental. Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) se encaixam nesta
perspectiva. Porém, está cada vez mais difícil conciliar desenvolvimento com
sustentabilidade, pois:
– A
concentração de CO2 já ultrapassou 400 ppm em 2014 e ultrapassou 410
ppm em abril de 2017. O nível seguro é 350 ppm;
– A
temperatura média global do Planeta já ultrapassou 1,1 graus em relação ao
período pré-industrial e o mundo caminha para a maior temperatura dos últimos 5
milhões de anos;
– A última
vez que a temperatura ultrapassou 2 graus o nível do mar subiu 6 metros.
Existem 2 bilhões de pessoas que vivem em áreas até 2 metros do nível do mar;
– O degelo
conjunto do Ártico e da Antártica bateu todos os recordes de baixa em março de
2017;
– A
acidificação dos oceanos está matando a vida marinha e um exemplo é a Grande
Barreira de Corais da Austrália. Há sobrepesca e depleção dos estoques de
peixe;
– Os
oceanos terão mais plásticos do que peixes em 2050;
– Houve
queda de 58% na população de animais selvagens no mundo entre 1970 e 2012. Até
2020, a perda pode alcançar a impressionante cifra de dois terços. Ou seja, 2
em cada 3 animais estarão extintos num período de 50 anos;
– A
degradação do permafrost pode liberar metano e CO2 capaz de gerar
uma situação apocalíptica.
Diante
deste quatro de degradação ambiental fica difícil acreditar na possibilidade de
manter o rumo do desenvolvimento com a conservação ambiental. O atual impasse
que o mundo passa hoje poderia ter sido evitado se tivesse os autores do século
XIX que alertaram para os perigos da racionalidade instrumental que via a
natureza apenas como meio de enriquecimento humano, sem se importar com os
direitos intrínsecos da natureza. O enriquecimento humano não pode se dar em
função do empobrecimento ecológico.
O ser
humano não tem uma relação simbiótica com a natureza. As abelhas, por exemplo,
sugam a seiva das flores, mas não as destroem. Ao contrário, elas são
polinizadoras. Quanto mais abelhas sugarem o néctar das flores, mais flores
nascerão do processo de polinização. Mas o ser humano tem uma relação
parasitária com a natureza, pois para se multiplicar causa prejuízo a outras
espécies e aos ecossistemas hospedeiros. A espécie humana é do gênero
ectoparasita. Um ectoparasita que está matando o seu próprio hospedeiro. A
humanidade vive do parasitismo ecológico e está provocando um holocausto
biológico.
Autores
como Alexander von Humboldt (1769-1859), Henry David Thoreau (1817-1862) e John
Muir (1838-1914) foram grandes defensores da natureza, da preservação ambiental
e de uma relação mais simbiótica entre todos os seres vivos da Terra. Estes
autores também foram inspiradores da Ecologia Profunda (Deep Ecology), que é
uma corrente preservacionista.
A Ecologia
Profunda é um conceito filosófico que considera que todos os elementos vivos da
natureza devem ser respeitados, assim como deve ser garantido o equilíbrio da
biosfera. O termo surgiu quando, em 1972, foi publicado o artigo “The shallow
and the deep, long range ecology movement. A summary”, do filósofo e
ambientalista norueguês Arne Naess (1912-2009). Ele distinguiu as correntes
ambientais entre movimentos superficiais ou rasos (com tendência
antropocêntrica e egocêntrica) e movimentos profundos (não antropocêntricos,
mas ecocêntricos). Os movimentos rasos (ou maquiagem verde) limitam-se a tentar
minimizar os problemas ambientais e garantir o enriquecimento das sucessivas
gerações humanas (a despeito do empobrecimento da natureza), enquanto a Ecologia
Profunda vai na raiz dos problemas ambientais e defende os direitos de toda a
comunidade biótica.
Na
definição do físico, ambientalista e escritor Fritjof Capra (nascido em 1939):
“A ecologia rasa é antropocêntrica, ou centralizada no ser humano. Ela vê os
seres humanos como situados acima ou fora da natureza, como a fonte de todos os
valores, e atribui apenas um valor instrumental, ou de ‘uso’, à natureza. A
ecologia profunda não separa seres humanos – ou qualquer outra coisa – do meio
ambiente natural. Ela vê o mundo, não como uma coleção de objetos isolados, mas
como uma rede de fenômenos que estão fundamentalmente interconectados e
interdependentes. A ecologia profunda reconhece o valor intrínseco de todos os
seres vivos e concebe os seres humanos apenas como um fio particular na teia da
vida”.
Há 10.000
anos os seres humanos e seus animais representavam menos de um décimo de um por
cento da biomassa dos vertebrados da terra. Agora, eles são 97%. O biólogo da
Universidade de Harvard, Edward Osborne Wilson acredita que o ser humano está
provocando um “holocausto biológico” e para evitar a “extinção em massa de
espécies”, ele propõe uma estratégia para destinar METADE DO PLANETA
exclusivamente para a proteção dos animais. Isto significa preservar metade da
área do planeta e conservar a outra metade. É preciso reselvagerizar o mundo.
Desta
forma, preservação ambiental não é “mito moderno da natureza intocada”, mas sim
uma postura ética de respeito à natureza e a favor da sustentabilidade ecocêntrica.
A conservação é importante na perspectiva de diminuição das áreas ecúmenas, por
meio do decrescimento demoeconômico.
Preservar a natureza e conter a expansão humana sobre os ecossistemas visa não só evitar o ecocídio, mas também evitar o suicídio, pois a humanidade não pode viver sem a natureza e sem respeitar o equilíbrio homeostático do clima. (ecodebate)
Preservar a natureza e conter a expansão humana sobre os ecossistemas visa não só evitar o ecocídio, mas também evitar o suicídio, pois a humanidade não pode viver sem a natureza e sem respeitar o equilíbrio homeostático do clima. (ecodebate)
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