Nos dias de hoje, surge cada vez mais na primeira linha das
preocupações de uma economia mundial globalizada, a sustentação da Vida com a
necessária preservação dos recursos naturais essenciais.
Em 1993, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU)
consagrou o dia 22 de março como o Dia Mundial da Água,cujo principal objetivo
principal é criar um momento de reflexão, análise e consciencialização com
vista ao desenvolvimento de ações que promovam a conservação, proteção, gestão
e uso eficiente da água de forma ambientalmente sustentável.
Neste âmbito, decorre entre 18 e 23 de março de 2018 em Brasília o
8º World Water Forum,
promovido pelo World Water Coucil, uma
organização internacional que reúne cerca de 400 instituições, de cerca de 70
países, interessadas no tema da água. Este evento, que ocorre desde 1997
de três em três anos, acontece pela primeira vez na sua história numa cidade do
hemisfério sul. O Fórum pretende contribuir para o diálogo no processo de
tomada de decisão sobre a água a nível global, com vista ao seu uso racional e
sustentável.
Em 2010, a Assembleia
Geral da ONU reconheceu finalmente o direito humano à água e saneamento: “The human right to water entitles everyone
to sufficient, safe, acceptable, physically accessible and affordable water for
personal and domestic uses” (UN, 2010).
A
preocupação das Nações Unidas com esta questão transparece também nos Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável (2015-2030). O objetivo 6 é assegurar o acesso à
água potável e saneamento a todos os indivíduos do Planeta até 2030.
Os números são ainda desoladores (UN, 2017):
· Apesar da evolução positiva verificada desde 1990, cerca de 663
milhões de pessoas não têm ainda acesso à água potável, com consequências
graves em termos de saúde pública;
· A escassez de água afeta cerca de 40% da população global e a
projeção é que este número continue a aumentar.
Apesar de a água ocupar cerca de 71% da superfície terrestre – daí
a designação de Planeta Azul,
pela cor dominante quando avistado do espaço – 97% dessa água é salgada. Dos 3%
de água doce existentes, menos de 1% é água doce acessível em rios, lagos ou
aquíferos. A maioria encontra-se aprisionada no gelo e nas calotas polares.
Deste modo, a quantidade de água potável disponível para
utilização humana não chega a 1% de toda a água do Planeta e cerca de 70% da
água extraída de rios, lagos e aquíferos é utilizada para irrigação (UN, 2017).
Assim, a água é um recurso escasso que é fundamental tratar bem
pois dele depende a espécie humana, a saúde dos ecossistemas e a vida no
Planeta. É o suporte da vida dos seres vivos, pois é parte integrante das células
dos organismos e indispensável a todas as reações químicas necessárias à vida.
Contudo, a realidade tem-se revelado bem diferente.
Tem-se verificado uma má gestão do recurso, com um consumo
superior à capacidade de recarga. A escassez de água é cada vez maior,
pressionada pelo aumento da procura, devido ao crescimento da população mundial
(estimada em 7,6 mil milhões em 2017 e que se espera venha a atingir os 11,2 mil milhões em 2100), ao aumento da urbanização, à
elevação dos padrões de vida com mudança do regime alimentar das pessoas
(alimentos que necessitam de muita água, como a carne), e ainda às alterações
climáticas, com impacto na desertificação e poluição, estas com intervenção no
ciclo da água. Também, a procura de água pelo ser humano concorre diretamente
com a água necessária para manter as funções ecológicas.
As
maiores reservas de água subterrânea do mundo estão a diminuir de forma
alarmante. Num estudo recente com investigadores, entre outros, da NASA e da
Universidade da Califórnia, Santa Barbara foi revelado que cerca de um terço
dos maiores aquíferos do Planeta estão a ser rapidamente esgotados pelo consumo
humano, com pouco ou nenhum reabastecimento natural que compense esse consumo.
O Sistema Aquífero Árabe, fundamental para o abastecimento de água de mais de
60 milhões de pessoas, é o que verifica piores condições no mundo, seguindo-se
a Bacia do Indo o que se situa noroeste da Índia e Paquistão e a Bacia
Murzuk-Djado no Norte de África (Richey et al., 2015).
Contudo, este não se trata apenas de um problema do mundo
emergente. A falta do recurso também se fará sentir em economias
industrializadas onde secas e outros eventos extremos relacionados com o clima
tenderão a tornar-se mais frequentes nas próximas décadas.
A confirmar-se esta tendência, há economistas que acreditam que a
água, que tem sido considerada um direito, se tornará numa commodity, uma mercadoria de elevado
valor no mercado internacional, dado o aumento da procura e a escassez da
oferta.
A multiplicação de fundos de investimento nesta área, como o Pictet Water Fund, demonstra o
valor da água potável, que já muitos apelidam de “ouro azul”. O fundo, lançado em 2009 no
Reino Unido, investe em ações de cerca de 60 empresas que operam no setor da
água em todo o mundo, nomeadamente na oferta de água, tecnologia e serviços
ambientais.
A valorização de um recurso depende da sua disponibilidade e da
utilidade que lhe é atribuída. Conhecer o valor de um recurso é fundamental
para a sua gestão, de forma a garantir uma utilização equilibrada, justa e
sustentável. Reconhece-se que atualmente a água é um recurso natural escasso e
estratégico, logo um bem caro e será cada vez mais caro porque mais disputado.
A
água terá tanto mais valor comercial, quanto mais o seu consumo se afastar dos
valores mínimos necessários à sobrevivência humana: diretamente, nos usos
domésticos, ou indiretamente, nos usos agrícolas. O grande problema é que não é
fácil estabelecer as fronteiras entre os consumos essenciais e os supérfluos,
uma vez que variam muito com o contexto cultural da sociedade e com o contexto
climático do local onde se verificam.
Quando bens essenciais, insubstituíveis, adotam uma lógica de
mercado, o preço passa a ser fixado como equilíbrio entre a oferta e a procura,
estabilizando-se no valor mais elevado que o consumidor está disposto a pagar,
e que, no caso da água, tende para infinito, porque não há alternativa.
Por exemplo, numa cidade em que se criasse uma sensação de
escassez de água potável, o preço dispararia especulativamente, obrigando as
pessoas a deixar de comprar outros bens e serviços para pagar esse bem. É esta
perspetiva perigosa, potencialmente indutora de mais exclusão e pobreza, que
está subjacente quando se pretende incluir a água no grupo das commodities.
Os crescentes problemas de escassez de água e de seca indicam
claramente a necessidade de uma gestão mais sustentável. Mais especificamente,
é necessário investir numa gestão da procura que aumente a eficiência da
utilização da água. A perspetiva deve ser a de uma economia circular, indo
buscar cada vez menos água ao exterior e maximizando a reutilização da água,
onde se verificam grandes potencialidades (por exemplo, a reutilização de águas
residuais, na agricultura).
O uso racional e eficiente da água é fundamental para ultrapassar
a crise mundial de água que enfrentamos e para garantir qualidade de vida para
a nossa geração e para as futuras. Trata-se do futuro do recurso e de toda a
Humanidade. (ecodebate)
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