Ônibus e caminhões são responsáveis por cerca de
metade da poluição atmosférica da região metropolitana de São Paulo, apesar de
representarem apenas 5% da frota veicular, segundo um estudo publicado em
16/07/18. O trabalho faz uma dissecação inédita dos poluentes que contaminam o
ar da metrópole paulistana, permitindo separar o que foi emitido por veículos
pesados, com motores a diesel, daquilo que foi gerado por veículos leves, como
carros e motos.
Poluição de veículos preocupa.
Os resultados apontam para a instalação de filtros
no escapamento dos ônibus como uma opção simples, rápida e barata de redução da
poluição atmosférica na cidade. "As soluções existem, e não custam caro;
mas são necessárias políticas públicas coerentes de longo prazo para serem
implementadas", diz o pesquisador Paulo Artaxo, do Instituto de Física da
Universidade São Paulo (USP), que assina o estudo com outros seis cientistas
brasileiros, na revista Scientific Reports.
Segundo ele, há filtros no mercado que reduzem a
emissão de poluentes dos ônibus em até 95%, a um custo de R$ 10 mil a R$ 20 mil
por veículo. Só a cidade de São Paulo tem 14,5 mil ônibus, o que implicaria
custo de até R$ 300 milhões. "Mas quanto vale a vida das milhares de
pessoas que morrem ou ficam doentes todos os anos por causa da poluição?",
indaga Artaxo. Essa poluição pesada causa e agrava sobretudo problemas
vasculares e respiratórios.
Resultados de estudo apontam para instalação de
filtros no escapamento como solução simples e barata.
A aposentada Aparecida Pechini, de 69 anos, conhece
bem o problema. Na casa dela, na Vila Leopoldina, zona oeste, "todo
mundo" tem algum problema respiratório, como rinite ou tosse. "Está
sempre muito poluído", diz. Enquanto falava à reportagem, ela lavava o
piso da garagem de casa, no qual se acumulava a fuligem preta. "Está
vendo? De vez em quando tem que jogar água, senão não resolve. Chega a ficar
oleoso", relata. "Moro aqui há mais de 40 anos, e não era assim tão
poluído o ar. Agora está pior."
O assessor jurídico Roberto Marques, de 66 anos,
também aponta a fuligem como um problema e descreve a situação como
"péssima". A garagem da sua casa, separada da rua apenas por um
portão de ferro, é lavada todos os dias e, mesmo assim, as patas da cachorrinha
da família ficam pretas. Com pelagem branca, a cadela costumava tomar banho a
cada 15 dias, no máximo uma vez por semana. Ultimamente precisa ser ao menos
limpa todos os dias. "É muita poluição, ao extremo."
Essa fuligem é o que os pesquisadores chamam de
"black carbon", que é a "fumaça preta" expelida pelos
escapamentos dos ônibus. Segundo o estudo, 47% dessa fuligem presente no ar
paulistano é produzida pela combustão ineficiente de diesel nos motores de
ônibus e caminhões que circulam pela Grande São Paulo.
"Foi surpreendente ver o papel dos veículos
pesados", diz o pesquisador Joel Brito, que fez o estudo na USP e hoje
está na Universidade Clermont Auvergne, na França. "Eles têm um papel
relevante em todos os poluentes que a gente analisou." As emissões mais
expressivas foram de material particulado, benzeno e tolueno – todos altamente
tóxicos.
A pesquisa tem por base três meses de amostragem
contínua do ar de São Paulo no topo de um prédio da Faculdade de Saúde Pública
da USP, na Avenida Dr. Arnaldo, que faz parte do chamado "espigão da
Paulista", região mais alta do centro de São Paulo. Nesse ponto, apesar do
maior tráfego de ônibus, é possível encontrar o ar que sobe de outras regiões.
Do ponto de vista analítico, o grande diferencial foi usar o etanol como um
"traçador" para diferenciar as emissões de veículos leves e pesados –
já que apenas carros e motos utilizam etanol.
Segundo os cientistas, é a primeira vez que um
estudo faz esse tipo de caracterização da poluição em "condições
reais". Normalmente, as estimativas são feitas com base em extrapolações
de medidas de emissão em laboratório.
Trilhos
Especialistas também citam a expansão da malha
ferroviária como peça-chave para a redução da poluição do ar em São Paulo, pelo
fato de reduzir o número de veículos no asfalto. "O número de linhas de
metrô ainda é pequeno, comparado a outras cidades de grande porte", aponta
Luiz Vicente Figueira de Mello Filho, coordenador do curso de Engenharia da
Universidade Presbiteriana Mackenzie Campinas.
Apesar de ser a menor parte da frota de veículos,
caminhões representam, junto com ônibus, metade de toda a poluição.
Ele também critica o baixo custo de venda do óleo
diesel. "O empresário faz a conta no papel e não vê vantagem em colocar
energia mais limpa", diz. "O nosso transporte é baseado em decisões
do século passado."
Os veículos de médio e grande porte da frota de
ônibus da cidade de São Paulo têm idade média de 6 anos e 1 mês, segundo
informações da São Paulo Transporte (SPTrans). A Secretaria de Mobilidade e
Transportes destaca a lei municipal aprovada em janeiro que dá prazos para a
redução de poluentes.
Prazo
No dia 17 de janeiro, o ex-prefeito João Doria
(PSDB) sancionou a Lei 16.802/18, que dá prazos para a redução de poluentes
para veículos de transporte público e de coleta de resíduos sólidos urbanos e
hospitalares na capital paulista. O texto, impõe, por exemplo, prioridade na
expansão da frota de trólebus.
No caso do dióxido de carbono (CO2), a
redução da emissão deve ser de 50% até 2028 e de 100% até 2038. Já os óxidos de
nitrogênio (NOx) devem ser reduzidos em 80% nos próximos 10 anos e, em 95%, em
até 20 anos. Por fim, a lei ainda determina a diminuição na emissão de material
particulado (incluindo fuligem) em 90%, até 2028, e em 95%, até 2038.
Anteriormente estava em vigor a Lei 14.933/09, que
instituiu a Política de Mudança do Clima no Município de São Paulo,
determinando que a frota do transporte público deveria fazer a troca
progressiva dos combustíveis fósseis até chegar a 100% dos veículos movidos a
energia renovável não fóssil já em 2018.
Estudo calcula o papel dos meios de transporte na
concentração de poluentes em São Paulo.
Agora, a Prefeitura tem até julho do próximo ano
para apresentar um "estudo dos cenários possíveis de redução de emissões
da frota, mediante a implementação de uma rede abrangente de corredores com
operação avançada e com prioridade para os veículos que operam em canaletas
segregadas". (biodieselbr)
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