Manejo florestal por espécies
na Amazônia é mais sustentável.
Estudos realizados por
unidades de pesquisa da Embrapa em diferentes regiões brasileiras comprovam que
o manejo florestal por espécie é uma inovação com potencial de agregar renda e
sustentabilidade à região amazônica.
Adequar a intensidade de
exploração, diâmetros e os ciclos de corte às peculiaridades de cada espécie, e
não ao volume total de árvores nas áreas manejadas, garante retorno econômico
mais rápido ao produtor e mantém o equilíbrio da diversidade da floresta. Os
índices técnicos, que levam em conta as características de crescimento e a taxa
de recuperação das espécies florestais, podem ser implementados para a
modernização dos protocolos vigentes na legislação brasileira.
Resultados positivos com
espécies amazônicas de interesse comercial em diferentes regiões do bioma, como
a maçaranduba (Manilkara elata Allemão ex Miq. Monach), a cupiúba (Goupia
glabra Aubl) e o cumarú (Dipteryx odorata), entre outras, corroboram a
pesquisa. Paralelamente, pavimentam o caminho para o fortalecimento da
bioeconomia na Amazônia, área com enorme potencial de agregação de renda a
produtores florestais pela capacidade de atrair indústrias de base biológica.
A legislação federal atual,
regida pela Instrução Normativa nº 05/2006, do Ministério do Meio Ambiente,
recomenda que a taxa de corte para toda a Amazônia, na falta de índices
técnicos por espécie, seja de 30 metros cúbicos por hectare a cada 35 anos
(ciclo de corte), e diâmetro mínimo de corte (DCM) de 50 centímetros. Isso
significa uma exploração desigual entre as espécies. “A legislação enxerga a
floresta de forma geral, sem levar em conta as características das diferentes
espécies, nem as especificidades de cada região”, afirma o pesquisador Evaldo
Braz, da Embrapa Florestas (PR).
A exploração é pautada pela
recuperação do volume total de árvores de uma determinada área. “Com isso,
acabamos retirando as espécies mais abundantes sem levar em conta a recuperação
do estoque dessas espécies, e também sem considerar a disponibilidade de
estoque de outras espécies ao longo dos anos”, explica Lucas Mazzei,
pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental (PA).
No estudo com a maçaranduba,
que é uma das principais espécies de interesse do mercado madeireiro nacional,
verificou-se que o ciclo de corte de 35 anos, combinado com uma intensidade
alta de exploração, não é suficiente para a recuperação dessa espécie. Isso
porque, segundo Mazzei, a maçaranduba é abundante, mas tem um crescimento
lento.
Os indivíduos jovens dessa espécie podem levar mais de uma centena de anos para atingirem o diâmetro mínimo de corte (DMC) de 50 cm. “Então a exploração contínua dessa espécie em ciclos consecutivos de 35 anos não garante o mesmo retorno financeiro e compromete a recuperação do estoque nas áreas exploradas, já que os indivíduos jovens levam muito mais tempo para se recuperarem”, afirma o cientista.
Manejo florestal por espécies na Amazônia é mais rentável e sustentável, diz Embrapa.
Resultados de estudos com
produtos de importância econômica na região, como maçaranduba, cupiúba e
cumaru, abrem caminho para a bioeconomia.
Extrair o que a floresta é
capaz de recuperar
Na Fazenda Rio Capim,
município de Paragominas, região nordeste do Pará, a Embrapa Amazônia Oriental
em parceria com a empresa Cikel avaliou a taxa de recuperação dos estoques de
árvores para diferentes espécies. Essa taxa é o volume de árvores que em 35
anos alcança o diâmetro mínimo de corte. “Esse cálculo é simples: quanto menor
a taxa de recuperação, menor o crescimento das espécies”, alerta Mazzei.
Além da maçaranduba, as
espécies avaliadas foram a timborana (Pseudopiptadenia psilostachya [DC.] G. P.
Lewis & M. P. Lima), breu vermelho (Protium altsonii Sandwith) e o piquiá
(Caryocar villosum [Aubl.] Pers). Todas são espécies exploradas comercialmente.
Entre elas, considerando uma intensidade de exploração de cerca de 90%, ou
seja, quase a totalidade das árvores aptas ao corte, o breu vermelho apresentou
a maior taxa de reconstituição, de 65%, e a maçaranduba a menor taxa: 2%. Já a
timborana e o piquiá obtiveram taxas de recuperação de 12% e 6%,
respectivamente.
Para o engenheiro florestal
Josué Evandro Ferreira, que é o responsável técnico pelos planos de manejo da
empresa Cikel, atualmente a exploração legal é a mesma para espécies de rápido
e de longo crescimento. “Sabemos que têm espécies que se recuperam em 20 anos,
mas outras precisam de 100 anos”, complementa.
Ele acrescenta que a pesquisa
vem cada vez mais dando subsídios para que o manejo funcione bem e mantenha a
floresta em pé. “O manejo florestal por espécie é plenamente viável, mas
precisa de divulgação, principalmente nos órgãos de fiscalização, pois a lei já
indica que é possível customizar o manejo de acordo com índices
técnico-científicos”, afirma.
A atividade deve caminhar na direção da sustentabilidade, ou seja, “entrar na floresta e extrair o que ela oferece no momento, respeitando o ciclo de recuperação de cada espécie, seja de 15, 20, 30 ou 100 anos”, conclui.
Sustentabilidade é o maior desafio do manejo florestal
A madeira é um importante
produto da balança comercial do Pará, que em 2019 movimentou mais de US$ 200
bilhões, segundo a Federação das Indústrias do Estado do Pará (Fiepa).
O Pará, juntamente com
Rondônia, abriga a maior parte das áreas de florestas públicas nativas
elegíveis ou já em processo de concessão para Manejo Florestal de todo País.
São cerca de um milhão e meio de hectares divididos em seis florestas
nacionais, e em áreas estaduais, que, segundo a legislação, devem ser manejadas
de forma sustentável para garantir a produção florestal e manter a floresta em
pé.
Planejar a extração
madeireira e garantir ao mesmo tempo a conservação e a plena recuperação da
floresta, entretanto, é o maior desafio do manejo florestal sustentável na
Amazônia.
Ciclos de corte e diâmetros
precisos são mais eficientes
A Embrapa Florestas também
realiza pesquisas com espécies na Amazônia, e utiliza outro enfoque. A base de
seu trabalho é a combinação de dados da estrutura da floresta e o diâmetro
ideal de corte por espécie, visando o aumento da produtividade. “Essa
metodologia é baseada no conhecimento de que algumas classes diamétricas são
mais produtivas que outras”, explica a pesquisadora Patricia Mattos.
Na microrregião de Sinop, no
Mato Grosso, foram realizados estudos com dez espécies amazônicas. Uma das
pesquisas, realizada no município de Santa Carmem, indicou que, para algumas
espécies florestais comerciais, a produção é maior em condições de ciclo e
diâmetro mínimo de corte menores que os previstos na legislação atual.
Entre as espécies estudadas
estão a cupiúba (Goupia glabra Aubl.), cambará (Qualea albiflora Warn),
cedrinho (Erisma uncinatum Warn), itaúba (Mezilaurus itauba [Meissn.] Taub.) e
amescla (Trattinickia burserifolia Willd), que representam 60% das espécies
exploradas na microrregião. Os trabalhos são desenvolvidos com amostras
provenientes de áreas com manejo florestal autorizado, sendo os discos
transportados para a Embrapa Florestas para medição dos anéis anuais de
crescimento, técnica conhecida como dendrocronologia.
A metodologia, como explica a
pesquisadora da Embrapa Florestas Patrícia Mattos, consiste em utilizar
informações de séries de crescimento que representam todo o ciclo de vida de
árvores de uma determinada espécie (frequentemente séries com mais de 150
anos), para a determinação dos diâmetros ideais de corte por espécie.
“Esses dados são analisados
juntamente com a estrutura da floresta, sendo possível determinar o volume que
deve permanecer após intervenção de manejo para garantir a produção de mais
madeira no próximo ciclo, do que quando aplicados os critérios presentes na
legislação atual”, afirma.
As análises mostram que,
nessa microrregião, o ciclo de 35 anos para extração de 30m3 excede o tempo
necessário para recuperação do estoque de diferentes espécies, com o agravante
de elevar perdas por mortalidade natural ao longo desse período.
“Frequentemente observamos que um ciclo menor é mais eficiente, pois aproveita
melhor o potencial de crescimento das árvores sem comprometer a floresta”,
afirma o pesquisador Evaldo Muñoz Braz.
Já no estudo que teve como
objeto o cedrinho (Erisma uncinatum Warm.), os resultados sugerem que o ideal
seria extrair árvores com diâmetros a partir de 70 cm, superiores ao previsto
na legislação, entretanto, com ciclos de corte menores (25 anos).
“São resultados para a
microrregião de Sinop, considerando as especificidades locais”, alerta Mattos.
O trabalho, segundo a cientista, pode servir de balizador para otimização da
exploração sustentável, contribuindo para um manejo que reduza custos e danos
ao povoamento remanescente da região.
Esses resultados são
estratégicos para a manutenção da atividade produtiva no Mato Grosso, onde a
equipe da Embrapa Florestas começou a aplicar técnicas de dendrocronologia ao
manejo na região amazônica. A produção florestal de madeira nativa representa a
base da economia de 44 cidades, respondendo por 5,4% do PIB do estado. Segundo
dados do Centro das Indústrias Produtoras e Exportadoras de Madeira do Estado
de Mato Grosso (CIPEM), o segmento gera mais de 90 mil empregos diretos e
indiretos, com potencial de ampliação de 40% nos próximos anos.
Drones ajudam no mapeamento
florestal por espécie
A utilização de drones no manejo florestal por espécies permite o reconhecimento nominal de cada espécie presente na área e dá celeridade ao processo. Segundo o pesquisador da Embrapa Acre (AC) Evandro Orfanó, os drones são capazes de mapear centenas de hectares em um único dia, gerando imagens em alta resolução que possibilitam conhecer o nível de presença da espécie na parte superior da floresta (dossel) e compreender o sistema florestal a ser manejado.
Ciclos de corte e diâmetros precisos são mais eficientes.
O pesquisador explica que a tecnologia detalha a informação sobre a área com o objetivo de viabilizar o manejo florestal customizado, por espécie. “Manejar a floresta dessa forma facilita o atendimento a critérios de sustentabilidade da atividade florestal, como a manutenção de um estoque mínimo de árvores remanescentes, para conservação da diversidade de espécies florestais”, ressalta.
Por meio de um software com algoritmo treinado são coletadas informações sobre aspectos da fenologia das árvores, como floração e frutificação, e da forma e área foliar das copas (morfometria) e, a partir da análise desses dados, são identificadas as espécies florestais. (ecodebate)
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