As implicações de mudanças climáticas no ciclo
hidrológico podem tornar necessárias alterações nas atuais políticas de
gerenciamento de recursos hídricos. Nesse contexto, merecem atenção especial os
pequenos reservatórios de armazenamento de água, que são estruturas importantes
para adaptação às mudanças climáticas.
Nas últimas décadas, centenas de pequenos
reservatórios foram construídos no Cerrado com a finalidade de armazenar água
nos períodos de chuva e disponibilizá-la localmente para usos domésticos e
agropecuários no período de estiagem. Para regiões como a bacia do Rio Preto,
responsável por cerca de 80% de toda a produção agrícola do Distrito Federal,
os reservatórios apresentam papel fundamental no fornecimento seguro e contínuo
de água, principalmente para fins de irrigação.
As alterações esperadas em variáveis climáticas como
precipitação (chuvas) e temperatura poderão resultar em mudanças no regime
hidrológico e, consequentemente, na forma como os reservatórios devem ser
manejados. Embora diversos trabalhos científicos relatem os potenciais impactos
das mudanças climáticas na operação de grandes reservatórios, estudos em
pequenos reservatórios ainda são escassos e praticamente inexistentes para a
região do Cerrado.
Apesar da relevância estratégica dessas estruturas,
os impactos ambientais causados principalmente por reservatórios mal
dimensionados têm dificultado a construção de novas barragens na região. Os
problemas de dimensionamento se devem, em sua maior parte, à falta de
informação.
Portanto, é cada vez mais importante gerar
informações que subsidiem a alocação e a construção de novos reservatórios no
Cerrado. Para isso, é crucial compreender melhor o comportamento das diferentes
variáveis que interferem na dinâmica de água de um pequeno reservatório,
especialmente a evaporação.
O levantamento de estimativas de perdas por
evaporação é primordial para o desenvolvimento de estratégias e políticas
eficientes de gestão de recursos hídricos. Além disso, essas estimativas para
áreas rurais remotas, ainda predominantes na região do Cerrado e que contam com
poucas informações, são de especial interesse para hidrólogos e
meteorologistas.
A evaporação representa uma perda efetiva de água do
sistema hidrológico que não deve ser negligenciada, já que é um dos principais
constituintes do balanço hídrico de reservatórios sob diferentes regimes
climáticos.
As perdas afetam diretamente a eficiência de
armazenamento do reservatório, o uso produtivo de água, a economia e a qualidade
de vida das pessoas. O processo de evaporação se torna ainda mais importante
quando se consideram os efeitos de mudanças climáticas, com o aumento da
temperatura ameaçando reduzir a disponibilidade hídrica, levando-se em conta
especialmente o armazenamento superficial de reservatórios.
Obter estimativas de perdas por evaporação mais precisas é essencial. Contudo, a quantificação mais representativa dessa variável para pequenos reservatórios é um grande desafio, uma vez que a variabilidade da temperatura e da pressão de vapor do ar próximo às margens pode diferir consideravelmente das condições internas do reservatório e influenciar a magnitude da evaporação real.
Os efeitos da evaporação são geralmente considerados durante o projeto e gerenciamento de reservatórios, porém há uma grande incerteza associada aos valores atualmente adotados pelos gestores, uma vez que poucos estudos foram conduzidos na região para determinar a magnitude da evaporação. Daí a relevância da obtenção de estimativas mais precisas dessa variável, uma vez que isso afeta o dimensionamento e a operação dos reservatórios.
Diversas pesquisas em diferentes regiões do mundo
foram realizadas visando obter estimativas ou aprimorar métodos de estimativas
de evaporação de água em reservatórios. Apesar da importância para o
planejamento e a gestão de recursos hídricos, não se tem conhecimento de
estudos buscando estimar a evaporação de água em pequenos reservatórios para as
condições de Cerrado brasileiro.
Apesar da existência de uma grande diversidade de
modelos para estimativa de evaporação, a carência de dados requeridos por
alguns desses modelos tem dificultado a utilização em diferentes regiões do
Cerrado brasileiro, sendo conveniente avaliar outras técnicas conhecidas pelos profissionais
da área de recursos hídricos, como as de aprendizagem de máquina, tais como
redes neurais artificiais, máquinas de vetores suporte e árvores de regressão,
usadas com sucesso na modelagem de evaporação, mesmo a partir de um número
limitado de variáveis.
Em decorrência de questões ambientais e de segurança
hídrica e considerando a importância das pequenas barragens para o
desenvolvimento econômico da região do Cerrado brasileiro, é crucial que os
novos reservatórios sejam alocados, construídos e gerenciados de forma
adequada. Assim, é fundamental gerar informações mais representativas da
evaporação, o que implica, entre outras ações, avaliar o desempenho de métodos
de simulação.
Uma das iniciativas nesse sentido é o estudo
desenvolvido pela Embrapa em parceria com a Universidade Federal de Viçosa
(UFV) com os objetivos de avaliar o desempenho de métodos de estimativa da
evaporação em pequenos reservatórios na região do Cerrado brasileiro; aprimorar
métodos para estimativa da evaporação em pequenos reservatórios de
armazenamento de água localizados na região do cerrado brasileiro; e avaliar o
impacto das mudanças climáticas na evaporação de água em pequenas reservatórios
localizados no Cerrado brasileiro.
Os resultados obtidos indicaram que no início do
período seco, logo após um período chuvoso com chuvas acima da média, os
pequenos reservatórios da bacia do Rio Preto encontram-se na capacidade máxima
de armazenamento, equivalendo a aproximadamente 16,1 milhões de m3.
Desprezando-se todas as entradas e saídas de água nos reservatórios, com
exceção da evaporação, observou-se que no fim do período seco (30/09), para o
período de 1961 a 2005 (período histórico), a disponibilidade de água
armazenada nos reservatórios representava 65,2% da capacidade total de
armazenamento. Fazendo-se a mesma análise para o período de 2007 a 2040,
considerando um cenário de emissão de gases otimista, a disponibilidade nesses
reservatórios foi estimada em 63,3%, e em 62,7% num cenário pessimista.
Com base nesse resultado e considerando um
reservatório com volume igual a 60.000 m3 e área de espelho de água
igual a 6 hectares, se levarmos em conta a situação no período de 2007 a 2040,
em um cenário otimista, a evaporação provável a 60% de probabilidade, para o
mês de maio, seria igual a 3,44 mm/dia, o que representaria um volume evaporado
de 206,4 m3. Caso o espelho de água desse reservatório fosse igual a
4 hectares, o volume evaporado seria 137,6 m3, ou seja, 33% menor.
Ainda considerando um reservatório de 6 hectares de espelho de água e o mesmo mês, período e probabilidade, mas agora num cenário pessimista, espera-se uma evaporação de 3,55 mm/dia, equivalente a um volume de 213,0 m3. Já para o período de 2071 a 2100, a evaporação provável a 60% de probabilidade equivalerá a 208,8 m3, para o cenário otimista, e 228,6 m3, no pessimista.
Esses resultados reforçam a importância da correta escolha do local para a construção de novos reservatórios. Essa decisão terá impacto diretamente na viabilidade do reservatório em armazenar água, sendo decisivo na gestão dessas estruturas. O local onde o reservatório é instalado tem influência direta na relação entre o tamanho do espelho de água e a capacidade total de armazenamento de água do reservatório, que influenciam na quantidade de água evaporada. (ecodebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário