Passado um ano da chamada “crise da geosmina”,
substância orgânica produzida por algas que provoca mau cheiro e gosto ruim na
água fornecida pela Companhia de Águas e Esgotos do Estado do Rio de Janeiro
(Cedae), a população da Região Metropolitana continua sofrendo com a qualidade
do abastecimento.
Relatos que voltaram a ocorrer desde janeiro renovam
a preocupação com a crise hídrica na Estação de Tratamento de Água/ETA Guandu,
comprometendo o fornecimento para 11 milhões de habitantes. Para melhorar a
qualidade da água, não apenas em relação à geosmina, especialistas defendem a
implantação de Soluções Baseadas na Natureza/SBN, que também podem gerar
economia de recursos para os cofres públicos.
A restauração do solo da Bacia Hidrográfica do Rio
Guandu, por exemplo, faria com que menos sedimentos fossem depositados nas
águas e, consequentemente, com que o poder público economizasse em gastos em
dragagem dos reservatórios e aquisição de produtos químicos para tratamento. A
melhoria na qualidade da água proporcionada pela infraestrutura natural
pouparia aos cofres públicos R$ 156 milhões em 30 anos.
De acordo com estudo realizado pela World Resources
Institute (WRI), em parceria com a Fundação Grupo Boticário de Proteção à
Natureza e outras organizações, em 2018, a degradação da paisagem e a derrubada
da vegetação nativa na bacia do Guandu ao longo dos anos agravaram a erosão do
solo e aumentaram o carregamento de sedimentos para os cursos d’água, o que
gerou maior poluição e turbidez nas águas.
Para se ter ideia do que isso representa, a Cedae
usa, por dia, cerca de 140 toneladas de sulfato de alumínio, 30 toneladas de
cloreto férrico e 15 toneladas de cloro, entre outras substâncias, para o
tratamento das águas do Guandu.
A ETA Guandu, considerada a maior estação de
tratamento de água do mundo, processa 92% da água consumida pelas mais de 11
milhões de pessoas que vivem nos 22 municípios da Região Metropolitana do Rio
de Janeiro, com capacidade para 3,7 bilhões de litros de água por dia.
“É aí que entra a infraestrutura natural. Cidades
inteligentes e baseadas na natureza usam serviços ecossistêmicos fornecidos
pelo meio ambiente para complementar ou potencializar estruturas convencionais
de infraestrutura urbana. Na gestão hídrica, uma das principais Soluções
Baseadas na Natureza usada para aperfeiçoar o sistema de abastecimento é a
restauração de cobertura vegetal em pontos estratégicos das bacias
hidrográficas”, explica o gerente de Economia da Biodiversidade da Fundação
Grupo Boticário, André Ferretti.
O estudo “Infraestrutura natural para água no
Sistema Guandu, Rio de Janeiro” estima que a restauração florestal na bacia do
Guandu requer um investimento total de R$ 103 milhões em 14 anos. O cálculo
considerou gastos como a compra, o transporte e o plantio das mudas, a
preparação da área, a adubação, a mão de obra e cercamentos. Levou ainda em
consideração despesas incorridas para identificar, sensibilizar e engajar
proprietários de terras nos projetos de restauração.
Por meio das SBNs, é possível gerar benefícios como
o controle da erosão do solo e aumento de sua permeabilidade, filtragem de
sedimentos, mitigação dos efeitos de enchentes e estiagens, e regulação do
fluxo hídrico. “São serviços que auxiliam as estruturas convencionais de
barragens, reservatórios, muros de contenção ou estações de tratamento de
água”, aponta Ferretti.
Para Cecília Herzog, paisagista urbana, especialista
em Preservação Ambiental das Cidades e membro da Rede de Especialistas em
Conservação da Natureza (RECN), as SBN podem – e devem – estar distribuídas
pelas áreas urbanizadas e ao longo de rodovias, de modo a contribuir com a
prevenção dos contaminantes levados aos rios pelas chuvas. “Essas soluções
atendem a contextos específicos, podendo receber a água em diversas tipologias,
tais como biovaletas ao longo de estradas, conectando jardins de chuva,
canteiros pluviais, tetos verdes e alagados construídos. A própria estação de
tratamento poderia ser atualizada para uma estação de águas baseada na
natureza, com jardins filtrantes nas imensas áreas que represam as águas do
sistema Guandu”, avalia a especialista.
Soluções baseadas na natureza podem tornar
infraestruturas urbanas mais verdes e resilientes. (ecodebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário