Um time de economistas,
incluindo o ex-chefe de classificação soberana da Standard and Poor’s
(S&P), Moritz Kraemer, descobriu que se nada for feito para reduzir os
gases de efeito estufa, 63 nações poderão ter seus títulos soberanos rebaixados
em pelo menos mais de um nível até 2030. Para se ter uma ideia do risco que
esse cenário representa, a atual turbulência econômica causada pela pandemia de
Covid-19 resultou em 48 títulos soberanos sofrendo rebaixamentos por parte das
três principais agências de classificação entre janeiro/2020 e fevereiro/2021.
No estudo [Rising
Temperatures, Falling Ratings: The Effect of Climate Change on Sovereign
Creditworthiness], pesquisadores das universidades de Cambridge e East Anglia
(UEA) usaram inteligência artificial para prever o efeito da mudança climática
sobre as classificações feitas pela Standard and Poor’s para 108 países para os
próximos 10, 30 e 50 anos, e ao final do século.
Em toda a amostra, a mudança
climática poderia aumentar o pagamento anual de juros sobre a dívida soberana
em US? 22-33 bilhões sob uma concentração relativamente baixa de gases
causadores do efeito estufa na atmosfera, da ordem de 2,6 RCP (Representative
Concentration Pathway, ou trajetória representativa de concentrações).
Já em um cenário sem controle de emissões, com RCP de 8,5, esse pagamento sobe para US$ 137 – 205 bilhões. O custo adicional para as empresas seria de US$ 7,2 – 12,6 bilhões e US$ 35,8 – 62,6 bilhões em cada cenário, respectivamente.
Política climática poderia afetar nota de crédito de soberanos.
A simulação indica que as
classificações de Brasil, Estados Unidos e Canadá cairiam dois níveis se as
emissões continuarem subindo. Alemanha, Índia e Holanda desceriam três
patamares, enquanto Chile, China e México estão entre as nações que poderiam
cair mais de quatro níveis. O alerta é dado no momento que os países emitem
níveis históricos de dívida para lidar com a Covid-19.
“Os ministros da Fazenda já
estão em pânico devido às consequências fiscais da pandemia”, disse o Matthew
Agarwala, coautor do trabalho e pesquisador do Instituto Bennett de Políticas
Públicas de Cambridge. “Eles deveriam aproveitar esta oportunidade para
investir agora na descarbonização que estimula o crescimento e na restauração
ambiental, para evitar que a mudança climática afunde ainda mais as finanças
públicas.”
“As agências de classificação
sofreram um golpe de reputação por não terem antecipado a crise financeira de
2008”, lembra Patrycja Klusak, líder do estudo e pesquisadora afiliada do
Instituto Bennett de Políticas Públicas de Cambridge e da UEA. “É imperativo
que elas sejam proativas agora para refletir as consequências muito maiores da
mudança climática.”
“A maioria dos países de
nossa amostra sofrerá rebaixamentos até 2030 se a atual trajetória de emissões
de carbono for mantida. Praticamente todos os países, sejam ricos ou pobres,
quentes ou frios, serão rebaixados até 2100”, explica o coautor do trabalho
Kamiar Mohaddes, professor da Cambridge Judge Business School e do King’s
College.
Embora se preveja que nações
em desenvolvimento com pontuação de crédito mais baixa serão mais afetadas
pelos efeitos físicos da mudança climática, as nações classificadas com AAA
provavelmente enfrentariam uma redução mais severa, de acordo com o estudo. Os
economistas dizem que isto se enquadra na natureza das classificações soberanas:
as que estão no topo têm mais espaço para cair.
Os pesquisadores chamam suas
projeções de “extremamente conservadoras”, pois os números só acompanham um
aumento direto da temperatura. Quando seus modelos incorporam a volatilidade
climática ao longo do tempo – eventos climáticos extremos do tipo que estamos
começando a presenciar – as reduções e os custos relacionados aumentam
substancialmente.
Por uma dívida nacional mais
sustentável, países emergentes querem emitir títulos verdes.
As propostas visam vincular a
nova dívida junto ao Banco Mundial e principais credores do mundo a metas de
biodiversidade e emissões de carbono.
ESG
e Ciência do Clima
Os pesquisadores dizem que o
atual emaranhado de indicadores financeiros verdes, tais como as classificações
ESG (Ambientais, Sociais e de Governança) e divulgações corporativas ad hoc não
regulamentadas, estão completamente desligadas da ciência.
“Espera-se que o mercado de classificação ESG supere um bilhão de dólares este ano, mas falta-lhe desesperadamente os fundamentos da ciência climática”, avalia Agarwala. “O mercado precisa de informações confiáveis sobre como as mudanças climáticas se traduzem em risco material”.
“As previsões soberanas das agências de classificação raramente vão além de três anos, mas os investidores estão mantendo títulos de governos com vencimentos cada vez mais longos”, afirma Kraemer. “O curto horizonte de tempo das agências deixa cada vez mais os investidores sem uma referência confiável para exposições de crédito que podem se estender em até cem anos”. Para ele, é necessário criar classificações de crédito com horizontes de prazo ultralongo, e as informações produzidas pela ciência climática seriam essenciais para isso.
“A inteligência artificial tem o potencial de revolucionar a forma como fazemos a avaliação de risco climático e as classificações ESG, mas devemos garantir que as melhores evidências científicas estejam incluídas nas análises”, afirma o também coautor da pesquisa Matt Burke, da Escola de Negócios Norwich da UEA.
• O estudo completo [Rising Temperatures, Falling Ratings: The Effect of Climate Change on Sovereign Creditworthiness ] está disponível aqui: https://www.bennettinstitute.cam.ac.uk/publications/rising-temperatures-falling-ratings/
• O cenário de aquecimento
utilizado para as políticas climáticas rigorosas que se mantêm fiéis ao Acordo
de Paris é o RCP 2.6. O cenário de aquecimento utilizado para um cenário de
altas concentrações sem controle de emissões é o RCP 8.5.
• Pesquisa é apoiada por um
subsídio da Rede Internacional de Insights, Pesquisa e Intercâmbio de Políticas
Financeiras Sustentáveis (INSPIRE) e pelo Projeto de Economia da Riqueza do
Instituto Bennett de Políticas Públicas, apoiado pela LetterOne. (ecodebate)
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