O aumento internacional do
preço dos alimentos, evidentemente, afeta os preços nacionais, embora o Brasil
seja o quarto produtor de bens de subsistência (atrás da China, Índia e EUA).
“Gente é pra brilhar, não pra
morrer de fome” - Caetano Veloso.
O Índice de Preços dos
Alimentos da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO)
bateu todos os recordes em outubro de 2021, atingindo o maior valor real em
quase 50 anos. O Índice (FAO Food Price Index – FFPI) que estava em 94,2 pontos
em 2018, subiu para 95,6 pontos em 2019. No primeiro semestre de 2020 o FFPI
caiu, mas subiu no segundo semestre e atingiu 99,2 pontos no ano de 2020. Mas
em 2021 os aumentos foram assombrosos e o FFPI atingiu o valor de 123,3 pontos,
confirmando a tendência de alta do século XXI, conforme mostra o gráfico abaixo
(da esquerda).
Gráfico abaixo mostra a variação do FFPI de 1990 a 2021. Cabe registrar que a década de 1990 apresentou o menor valor do Índice de Preços de todo o século XX. Portanto, os primeiros 21 anos do século XXI já apresentam valores médios do preço dos alimentos bem acima da última década do século passado e o valor do FFPI no ano de 2021 é cerca de 50% maior do que os valores dos anos 1990.
O aumento internacional do preço dos alimentos, evidentemente, afeta os preços nacionais, embora o Brasil seja o quarto produtor de bens de subsistência (atrás da China, Índia e EUA). Os preços nacionais são pressionados em função de 5 fatores, que, inclusive, foram agravados pela pandemia da covid-19: 1) aumento dos custos de produção e transporte; 2) desorganização da cadeia produtiva global (gerando gargalos na produção e distribuição); 3) aumento do preço do petróleo; 4) danos causados pela crise ambiental; e 5) desvalorização cambial.
De fato, no Brasil, a fome
atingiu 19,1 milhões de pessoas em 2020, parte de um contingente de 116,8
milhões de brasileiros que convivam com algum grau de insegurança alimentar —
número que corresponde a 55,2% dos domicílios, segundo o Inquérito Nacional
sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil,
realizado pela Rede PENSSAN.
O que os dados da FAO mostram
é que o Brasil e o mundo terão dificuldade para atingir os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU. O Objetivo 2 dos ODS
se propõe a: “Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da
nutrição e promover a agricultura sustentável”.
O item 2.2 diz: “Até 2030,
acabar com todas as formas de desnutrição, inclusive pelo alcance até 2025 das
metas acordadas internacionalmente sobre desnutrição crônica e desnutrição em
crianças menores de cinco anos de idade, e atender às necessidades nutricionais
de meninas adolescentes, mulheres grávidas e lactantes e pessoas idosas”. O
item 2.1 diz: “Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as
pessoas, em particular os pobres e pessoas em situações vulneráveis, incluindo
crianças, a alimentos seguros, nutritivos e suficientes durante todo o ano”.
O fato é que o aumento do
Índice de Preços dos Alimentos da FAO ameaça a meta da Fome Zero global. A
humanidade vive várias emergências globais (econômica, social, sanitária,
climática e ambiental). O contínuo crescimento demoeconômico fez a Pegada
Ecológica global ultrapassar a capacidade de carga da Terra e a elevação do
preço dos alimentos é um sintoma da insustentabilidade do modelo de produção e
consumo hegemônico.
A COP26, que está sendo
realizada em Glasgow (local de nascimento de James Watt que patenteou a máquina
a vapor há 250 anos e deu início ao consumo em massa dos combustíveis fósseis)
tem indicado a necessidade de medidas urgentes deter as mudanças climáticas,
embora os acordos tem ficado muito aquém do necessário para evitar o colapso
ambiental
O influente cientista e
ambientalista James Lovelock (de 102 anos) – autor da teoria de Gaia (que diz
que a Terra se autorregula como um organismo vivo) – sugere que o meio ambiente
do nosso planeta se ajusta em resposta aos abusos antrópicos. Assim, devido à
forma horrível como os humanos tratam o meio ambiente, Gaia está prestes a
retornar com uma vingança.
Lovelock argumenta que as temperaturas da superfície do nosso planeta foram moduladas por bilhões de anos, pois, graças à Gaia: florestas, oceanos e outros elementos do sistema regulador da Terra, manteve a temperatura da superfície razoavelmente constante e quase ideal para a vida. Mas a humanidade mexeu substancialmente com essa fórmula cuidadosamente equilibrada. Assim, dois atos genocidas – asfixia por gases de efeito estufa e o desmatamento das florestas tropicais – causaram mudanças em uma escala nunca vista em milhões de anos.
Portanto, estamos entrando em uma era do calor em que a temperatura e os níveis do mar subirão década a década até que o mundo se torne irreconhecível e, em grande parte, inabitável. James Lovelock diz: “Precisamos resolver o problema da superpopulação e deter com urgência a destruição das florestas tropicais. Acima de tudo, precisamos olhar para o mundo de uma forma holística” (The Guardian, 02/11/2021). Indubitavelmente, precisamos entender o mundo de forma holística para compreender as razões do aumento do preço dos alimentos e a volta da fome como uma “espada de Dâmocles” sobre as condições de vida da população mundial. (ecodebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário