O desmatamento, um dos
principais causadores das alterações climáticas locais, aliado às mudanças do
clima global, traz impactos significativos ao agronegócio brasileiro.
Entre 1985 e 2012, o
desmatamento causou uma redução média de 12% na produtividade do cultivo da
soja na Amazônia e 6% no Cerrado, com decréscimo de mais de 20% em algumas
regiões dos dois biomas.
Estes são alguns dos
destaques da mais recente nota técnica do WWF-Brasil, que compila estudos
relevantes sobre o tema. Eles reafirmam a íntima relação do desmatamento,
mudanças climáticas e produtividade agrícola. O levantamento aponta que as
altas taxas de desmatamento na Amazônia e no Cerrado resultam em queda de
produtividade e rentabilidade para o agronegócio brasileiro.
Outro dado da nota técnica
mostra que a queda de receita bruta referente a diminuição da regulação de
temperaturas extremas após o desmatamento foi de, em média, US$ 158,50
anualmente para cada hectare de soja produzida na Amazônia, tendo o valor do
dólar em 2005 como referência. No caso do Cerrado, foram registrados aumentos
mensais entre 2,2 e 4,0°C nas temperaturas máximas e 2,4 e 2,8°C nas
temperaturas mínimas entre 1961 e 2019.
“Impacto para a produtividade
agrícola significa menos comida na mesa, maior inflação e impacto nas
exportações. As mudanças climáticas afetam diretamente a oferta e o custo dos
alimentos. Esse movimento já está acontecendo, mas tende a se agravar se não
pararmos o desmatamento agora e desenvolver ações de mitigação e restauração
dos ecossistemas naturais”, afirma Edegar de Oliveira, diretor de Conservação e
Restauração do WWF-Brasil.
Foram levantadas, ainda,
estimativas de perdas futuras de produtividade de soja e pastagem na Amazônia
Legal, considerando diferentes cenários de gestão territorial. Essas perdas
poderiam atingir 26% para soja e 32% para pastagem até a metade deste século.
Caso não haja adaptação por parte dos produtores, 20% a mais de área desmatada
na Amazônia e no Cerrado até 2050 podem levar a perdas adicionais de
produtividade entre 6% e 10% no Matopiba e 20% em Mato Grosso, principais regiões
produtoras de grãos do país, além das perdas causadas pelas mudanças climáticas
globais.
Outro estudo mostra que, além
das perdas de renda bruta causadas pelas mudanças climáticas globais, o Mato
Grosso poderá perder adicionalmente US$ 1,8 bilhão relacionado ao desmatamento
até 2050.
Em relação ao milho cultivado
após a colheita da soja (milho segunda safra), estudos indicam que o
desmatamento levaria a uma queda de até 8% de produtividade. Caso seja
necessário adiar as datas de plantio das culturas para se adaptar a um cenário
em que a estação chuvosa comece mais tarde e dure menos tempo, essa queda
passaria para aproximadamente 30%. O estudo sugere que, com a persistência do
desmatamento até o meio do século, a adaptação de datas de plantio e adoção de
cultivares de ciclo mais curto não serão suficientes para manter os níveis de
produtividade atuais em sistemas de dupla safra (soja e milho). Essas
alterações estariam ligadas ao encurtamento da estação chuvosa e aos impactos
decorrentes em cultivo de sequeiro (sem irrigação).
Uma das avaliações indica perdas de renda bruta no cultivo de soja na Amazônia em diferentes cenários de governança até 2050, levando em consideração as relações empíricas estabelecidas com dados observados de chuva e área desmatada. Os autores mostram que um cenário de gestão fraca pode levar à perda de 56% da área de floresta até 2050, o que causaria perda de renda bruta do cultivo de soja de cerca de R$ 1 bilhão anualmente.
Prejuízos em toda a cadeia
Além do agro, as perdas
afetam também outros setores. Um relatório baseado em estimativas das próprias
matrizes de risco de empresas brasileiras aponta perdas de até R$ 24 bilhões
por não apresentarem ações contra o desmatamento em suas cadeias de valor. O
valor resulta de prejuízos com dano reputacional, fuga de consumidores,
dificuldades em acessar mercados internacionais e alterações na dinâmica dos
ecossistemas.
O WWF-Brasil observou também
os dados da Plataforma Desmatamento e Chuva que traz informações sobre a perda
de receita bruta na produção de soja e carne bovina devido ao desmatamento e
consequente alteração climática.
Os dados apontaram que,
quanto maior é o nível de desmatamento (variando de 10% a 40%), maior é a perda
de receita bruta para soja, independente da data de plantio, e para a produção
de carne bovina. A plataforma é baseada em um estudo que avalia a variação
espacial do valor do serviço ecossistêmico de regulação climática para a
produção agrícola na Amazônia a partir de cenários de desmatamento progressivo
da floresta e simulações com modelos agrometeorológicos.
Importante salientar que
desde 1961, os efeitos da crise climática provocada pelo homem reduziram em 21%
a produtividade agrícola global. Essa porcentagem é maior (entre 26% e 34%) nas
regiões mais quentes, como América Latina, África e Caribe.
Adaptação para diminuir
perdas
Estudos existentes abordam
estimativas da perda de produtividade para diferentes cenários de uso do solo e
mudanças climáticas, mas com poucas informações baseadas em observações de
campo. Mesmo com esta limitação, os dados disponíveis já são preocupantes. Por
isso, além de apontar o desmatamento zero como o principal caminho de mitigação
de perdas, o levantamento ressalta algumas práticas sustentáveis que estão em
funcionamento e devem ser fortalecidas: melhoramento genético de cultivares de
plantas e de raças de animais, plantio direto na palha, fixação biológica de
nitrogênio, sensores digitais para avaliação de solo e planta, zoneamento
agrícola de risco climático, zoneamento agroecológico e outras iniciativas que
são imprescindíveis para a permanência do país no topo da produção
agropecuária, aponta a conclusão de um documento do WRI Brasil.
Os dados da nota técnica são
unânimes ao apontar que há urgência na aplicação de soluções sustentáveis para
a manutenção das florestas e mitigação da crise climática. “Muitas ferramentas
já existem, mas carecem de implantação pelo poder público e engajamento por
parte de outros atores, como empresas e setor produtivo, por exemplo. A ciência
está a nosso favor, com dados e perspectivas, cabe a nós priorizar ações que
garantam um futuro equilibrado para as próximas gerações”, alerta Mariana
Napolitano gerente de Ciências do WWF-Brasil.
Algumas tecnologias estão previstas em políticas públicas do país, como Plano de Agricultura de Baixo Carbono (Plano ABC) e a Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), que são, segundo o estudo, instrumentos fundamentais para potencializar a adaptação na agropecuária, sobretudo porque garantem a conservação da biodiversidade e protegem os polinizadores; mantêm a oferta e a qualidade da água; atenuam extremos climáticos, como secas e ondas de calor, principais responsáveis por quebras de produção; reduzem a ocorrência de desastres naturais, especialmente riscos de inundação e erosão do solo; mantêm o equilíbrio de ciclos biogeoquímicos; sequestram carbono no solo; proporcionam diversidade de produção e de renda para o produtor rural; e contribuem para maior resiliência dos sistemas produtivos às mudanças climáticas.
O WWF-Brasil é uma ONG brasileira que há 26 anos atua coletivamente com parceiros da sociedade civil, academia, governos e empresas em todo país para combater a degradação socioambiental e defender a vida das pessoas e da natureza. Estamos conectados numa rede interdependente que busca soluções urgentes para a emergência climática. Conheça a ONG. (ecodebate)
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