quarta-feira, 29 de março de 2023

A população do Haiti entre 1950 e 2100

O Haiti tem apresentado dificuldades para manter o crescimento econômico e avançar em termos sociais.
O Haiti é o país mais pobre do Hemisfério Ocidental. Ocupa cerca de um terço do lado ocidental da ilha Hispaniola (primeira terra das Américas visitada por Cristóvão Colombo, em 1492), enquanto a República Dominicana ocupa o lado oriental da ilha. O Haiti foi o primeiro país a acabar com a escravidão (em 1794) e o segundo país das Américas a conquistar a independência (depois dos Estados Unidos), em 1804.

No século XX o país foi ocupado por tropas americanas entre 1915 e 1934 e foi administrado por vários governos ditatoriais nas décadas seguintes. Para complicar, em 12/01/2010, um terremoto de grandes proporções, com magnitude de 7 na escala Richter, destruiu a maior parte da capital Porto Príncipe. Os desastres naturais aconteceram e se repetem e a instabilidade política inviabiliza a capacidade de governança estatal e a solução dos problemas sociais e ambientais.

Com uma área de 27,8 mil km2, o Haiti possui uma densidade demográfica de 420 habitantes por km2 em 2022, maior do que a densidade de Cuba (105 hab/km2) e bem superior à densidade brasileira (26 hab/km2). A população do Haiti era de 3,2 milhões de habitantes em 1950 e chegou a 11,6 milhões em 2022. Deve atingir o pico populacional com 16,5 milhões em 2082 e apresentar um pequeno decrescimento para 16,1 milhões de habitantes em 2100 (como mostra o gráfico abaixo do painel da esquerda).

A população haitiana em idade ativa, de 15-59 anos, era de pouco menos de 2 milhões de pessoas em 1950, ultrapassou 8 milhões atualmente, deve chegar perto de 10 milhões em 2070 e apresentar ligeiro declínio até o final do século (conforme mostra o gráfico abaixo, painel da direita).

Os gráficos abaixo mostram a evolução das taxas de fecundidade e a expectativa de vida. O Haiti tinha uma média em torno de 6 filhos por mulher durante toda a segunda metade do século passado, apresentou uma queda nas duas últimas décadas e deve ficar abaixo do nível de reposição na segunda metade do século (como mostra o gráfico abaixo, painel da esquerda).

A expectativa de vida ao nascer, que estava em torno de 35 anos em 1950, cresceu nos anos seguintes, embora tenha tido uma pequena queda na década de 1960 e uma grande queda em 2010, quando houve o terremoto em Porto Príncipe, que deixou 300 mil mortos, dezenas de milhares de feridos e mais de 1,5 milhão de desabrigados. Houve também uma queda durante a pandemia da covid-19. Na projeção média da Divisão de População da ONU a expectativa de vida ao nascer, para ambos os sexos, deve ficar pouco acima de 75 anos em 2100, abaixo da média mundial (como mostra o gráfico abaixo, painel da direita).

Mesmo com uma lenta transição demográfica já se nota uma alteração na estrutura etária do Haiti, pois a população jovem de 0-14 anos vai decrescer nas próximas décadas, como mostra o gráfico abaixo (painel da esquerda). Já o número de idosos (gráfico da direita) cresceu lentamente entre 1950 e 2022 e deve acelerar o crescimento na segunda metade do século XXI, chegando a 4 milhões de pessoas com 60 anos e mais de idade.

A lenta mudança da estrutura etária tem mantido as pirâmides etárias do Haiti com uma base larga, conforme mostram os gráficos abaixo. A pirâmide etária de 1950 tinha o modelo clássico de estrutura rejuvenescida e se manteve mais ou menos assim até 2022. Assim, o país mantém uma alta razão de dependência de jovens e uma baixa proporção de pessoas em idade ativa. Se a queda da fecundidade se aprofundar poderá haver o aproveitamento do 1º bônus demográfico, que é uma condição essencial para a redução da pobreza e a melhoria do padrão de vida da população. Na pirâmide de 2100 haverá uma redução da base e um formato mais retangular, que reflete uma taxa de fecundidade estável perto do nível de reposição.

O Haiti terá uma razão demográfica confortável no restante do século XXI, pois a razão de dependência vai diminuir de cerca de 100 na década de 1980 para menos de 60 em 2040, como mostra o gráfico abaixo. Se a economia reagir e conseguir gerar grande quantidade de emprego, o Haiti poderá avançar no processo de desenvolvimento humano. Mas se a economia fracassar, o país terá uma bolha de jovens, que na falta de perspectivas de mobilidade social ascendente, poderá criar instabilidade política e anomia social. Uma estrutura demográfica favorável só gera melhoria no padrão de vida se a economia reagir e aproveitar a janela de oportunidade.

O Haiti tem apresentado dificuldades para manter o crescimento econômico e avançar em termos sociais. O PIB do Haiti representava 0,075% do PIB mundial em 1980 e caiu para menos de 0,03% na atual década, conforme mostra o gráfico abaixo (lado esquerdo). A renda per capita do Haiti (em preços correntes em poder de paridade de compra) era de apenas US$ 1.686 em 1980, representando 56% da renda per capita mundial. Nas décadas seguintes a renda cresceu lentamente e chegou a US$ 3,2 mil em 2022, mas representando apenas 16% da renda per capita mundial.

Considerando a renda per capita em preços constantes (em ppp), o valor está mais baixo em 2023 do que em 1980. São 4 décadas de declínio. Portanto, houve empobrecimento relativo e até mesmo empobrecimento absoluto, caracterizando uma situação de “armadilha da pobreza”.

O Haiti tem uma renda per capita muito baixa, assim como um baixo padrão de consumo. Mesmo desta maneira, o Haiti tem um déficit ecológico. Segundo o Instituto Global Footprint Network o Haiti tinha, em 1961, uma Pegada Ecológica per capita de 0,65 hectares globais (gha) e uma Biocapacidade per capita de 0,54 gha. Portanto havia déficit ambiental. Mas com o elevado crescimento demográfico e o desmatamento a Pegada Ecológica per capita se manteve em 0,64 gha, mas a Biocapacidade per capita caiu para 0,25 gha em 2018. Assim, o déficit ecológico per capita passou para 0,39 gha, o que representa um déficit relativo de 156%, conforme mostra a figura abaixo.

O Haiti não conseguiu vencer a pobreza e além dos imensos desafios sociais é um país extremamente vulnerável aos problemas ambientais e climáticos. Após o terremoto de 2010, o país tem sofrido com os furacões que frequentemente atingem o Caribe. Nas primeiras décadas do século XX, a floresta tropical do Haiti ainda cobria 60% do território nacional. Nos anos 1950 havia caído para 20% e atualmente restou menos de 2% da cobertura vegetal do país.

Segundo estimativas da ONU, cerca de 30 milhões de árvores foram cortadas a cada ano, nas últimas décadas. Como resultado do desaparecimento da vegetação houve redução da fertilidade do solo, aumento da erosão e da desertificação. Assim, as chuvas e os ciclones tropicais (comuns naquela região) aumentam as torrentes de lama, contribuindo para a esterilidade do substrato natural.

Matéria do jornal El Pais (Pablo Ferri, 13/02/2023), relata que o Haiti está prisioneiro da violência e do poder de quadrilhas criminosas e de um Estado colapsado, enfrentando a implosão e o caos generalizado. Dezenas de gangues criminosas controlam grande parte da capital e sua região metropolitana, onde vivem três milhões de pessoas, um quarto da população do país. A polícia, com uma força de cerca de 10.000 soldados, não tem capacidade para lidar com a violência.

A Combinação de crise econômica, social e política, crise ambiental, o alto crescimento demográfico tende a agravar a extrema pobreza, condenando milhões de haitianos ao sofrimento e fazendo do país um lugar mais perigoso e inóspito para se viver. Na situação atual, o Haiti, por si só, não tem forças para superar suas dificuldades. Por isto tem crescido a emigração de haitianos. Para mudar o quadro, a comunidade internacional precisa ajudar o país a achar o caminho para a sustentabilidade econômica, social, demográfica e ambiental.

Crescimento populacional entre países pobres e ricos.

Fosso demográfico global: regiões com alto crescimento e com decrescimento populacional. (ecodebate)

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