Em relação à área do bioma,
19,2% pegou fogo nesses 38 anos. Pastagens foram o tipo de vegetação mais
atingida (56%), seguidas por florestas (44%). Só em 2022, foram 7,9 milhões de
hectares queimados no bioma, um aumento de 50% em relação a 2021, quando 5,3
milhões de hectares foram queimados.
A “temporada do fogo” na
Amazônia brasileira é o período com maior ocorrência de incêndios florestais,
na estação seca do bioma, e só existe porque tem gente que continua usando o
fogo em práticas agropecuárias e no processo de desmatamento: 81% dos focos de
calor ocorrem de agosto a novembro, na média dos últimos sete anos, com base em
dados do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Durante a estação seca, a
vegetação e a matéria orgânica no solo ficam propícias à queima e espalham as
chamas com maior velocidade, o que pode criar incêndios. O ar menos úmido
também favorece o alastramento do fogo e dificulta o combate.
“A principal fonte de ignição
dos incêndios florestais na Amazônia é humana, por práticas produtivas ainda
ligadas ao desmatamento e ao manejo de pastagem. Descargas elétricas por raios
seriam a fonte natural, entretanto, essas ocorrem normalmente no período de
chuvas, quando a Amazônia está mais úmida, difícil para o fogo se alastrar”,
explica Ane Alencar, diretora de Ciência no IPAM (Instituto de Pesquisa
Ambiental da Amazônia) e coordenadora da rede MapBiomas Fogo.
Na maior parte do bioma no
Brasil, a seca começa em julho e vai até outubro, chegando ao auge a partir de
agosto. Segundo o MapBiomas Fogo, também entre agosto e novembro está 75% de
toda a área queimada na Amazônia de 1985 a 2022.
Embora as condições não sejam
homogêneas em um ecossistema continental, a relação entre seca e fogo permanece:
o norte amazônico acima da linha do Equador, por exemplo, tem menos chuva no
primeiro trimestre. Neste ano, Roraima registrou alta de 95% na área queimada
até abril.
A fumaça de incêndios de grande proporção na Amazônia foi notícia quando “o dia virou noite” na cidade de São Paulo ‒ naquele agosto de 2019, fazendeiros combinaram a ação criminosa que ficou conhecida como Dia do Fogo. Em 2022, a fumaça chegou de novo ao Sudeste brasileiro e alcançou países como Bolívia e Peru.
Temporada do fogo
A área queimada na Amazônia
de agosto a novembro do ano passado foi de 5,4 milhões de hectares, mais que o
dobro dos 2,2 milhões de hectares queimados de agosto a novembro de 2021. Dos
últimos dez anos, 2017 foi o que mais queimou no período: foram 6,7 milhões de
hectares, área maior que o estado da Paraíba. Os dados de área queimada mensal
são da plataforma MapBiomas Fogo.
Há pelo menos 38 anos tem-se
registro da temporada de fogo no bioma, indicam os dados do MapBiomas. O mês de
setembro é o que tem maior ocorrência (30,4%). Na série histórica, 1997 é o ano
com maior concentração de área queimada entre agosto e novembro. Cerca de 92%,
ou 7,2 milhões de hectares, dos 7,8 milhões de hectares atingidos pelo fogo
naquele ano foram queimados nesses meses.
Cicatrizes do fogo na Amazônia entre os anos de 1985 e 2022
A Flourish map
Amazônia e Cerrado foram os
biomas que mais queimaram no Brasil desde 1985.
O fogo caiu com a
implementação do PPCDAm (Plano de Prevenção de Combate ao Desmatamento da Amazônia),
o que reflete a relação entre incêndios e desmate, ainda que não na mesma
proporção. O plano reduziu em 83% o desmate no bioma entre 2004 e 2012.
A queda na área queimada foi
de 46% entre agosto e novembro de 2004 (6,4 milhões de hectares) e os mesmos
meses de 2012 (3,5 milhões de hectares). A média da área queimada na temporada
de fogo nos oito anos anteriores ao plano (1995-2003) foi de 1,45 milhão de
hectares; nos oito anos durante a aplicação do plano, foi de 1,49 milhão de
hectares. Nos oito anos depois da conclusão da fase do PPCDAm (2013-2021),
ficou em 1 milhão de hectares.
“O PPCDAm é um plano focado
na redução do desmatamento e da degradação florestal na Amazônia. Em ambos, o
contexto o fogo é peça central, pois está diretamente relacionado com o
desmatamento e é um dos principais vetores de degradação das florestas da
região”, comenta Alencar.
Tipos de fogo
“O incêndio florestal é
gerado pelo fogo de desmatamento e pelo fogo de pastagem, então se a gente
reduzir os dois, a gente vai reduzir os incêndios florestais por consequência”,
diz a pesquisadora.
Alencar descreve os três
tipos de fogo mais comuns na Amazônia brasileira:
1. Fogo de desmatamento:
segue o processo de desmatamento; depois de derrubada e seca, a área é queimada
2. Fogo de manejo: provocado
para “limpeza de pastagem” em área de pasto nativo ou cultivado, também chamado
de fogo de pastagem
3. Incêndio florestal: é o
fogo que se espalha e entra na floresta, com impactos diretamente proporcionais
à frequência; pode ser originado por chamas que fugiram ao controle humano ou
por ação criminosa
Onde queima
Avanços do fogo nos estados amazônicos.
A Flourish bar chart race
Pará, Mato Grosso e Roraima
foram os estados com maior ocorrência de fogo na Amazônia de 1985 a 2022. Entre
as cidades com maior área queimada na série estão: São Félix do Xingu, Cumaru
do Norte e Altamira, no Pará; Porto Velho, capital de Rondônia; Santana do
Araguaia, também no Pará; e Vila Bela da Santíssima Trindade, em Mato Grosso.
Cidades com maior área queimada
A Flourish chart
A Amazônia tem 43,6% de tudo
o que queimou no Brasil de 1985 a 2022: o acumulado chega a 80,9 milhões de
hectares dos 185,7 milhões de hectares queimados no país. Em relação à área do
bioma, 19,2% pegou fogo nesses 38 anos. Pastagens foram o tipo de vegetação
mais atingida (56%), seguidas por florestas (44%).
Só em 2022, foram 7,9 milhões de hectares queimados no bioma, um aumento de 50% em relação a 2021, quando 5,3 milhões de hectares foram queimados.
Como o clima interfere
A Amazônia tem uma
precipitação média anual de 2.300 milímetros, com regiões que podem chegar a
chover 3.500 milímetros por ano. Na estação chuvosa, calcula-se uma
precipitação média de 10 milímetros por dia; já na estação seca, alguns locais
podem ter 50 milímetros de precipitação mensal.
É o que se conhecia até
agora. As mudanças climáticas causadas por ação humana têm alterado o padrão de
chuva. Há uma tendência de diminuição da duração da estação chuvosa e aumento
da duração da estação seca, principalmente no sul do bioma.
Projeções indicam maior
probabilidade de eventos climáticos extremos de chuva e seca, com impacto
multiplicado em grandes extensões de áreas desmatadas, como o arco do
desmatamento ‒ do leste e sul do Pará em direção oeste, passando por Mato
Grosso, Rondônia e Acre.
El Niño
Além das alterações no clima
consequentes do superaquecimento global, a chegada de um El Niño forte em 2023
pode aumentar ainda mais a temperatura. O fenômeno climático que aquece as
águas do oceano Pacífico tende a levar mais seca para a Amazônia, criando um
ambiente que favorece ainda mais a propagação do fogo.
“Os anos de El Niño são
sempre preocupantes para a Amazônia, pois a seca é mais severa e isso aumenta
muito a probabilidade de uma queimada se tornar um incêndio florestal”, alerta
a pesquisadora.
Em 1982 e 1983, um El Niño intenso contribuiu para o período com menor índice pluviométrico da Amazônia em 50 anos. A queda na chuva chegou a 70% em Manaus, em plena estação chuvosa.
Prevenção
Alencar ressalta que o
controle do uso do fogo é chave para reduzir a frequência e intensidade dos
incêndios na floresta: “Como não podemos controlar o clima, podemos, sim,
controlar o uso do fogo pelas pessoas”. Para o bioma amazônico, o MIF (Manejo
Integrado do Fogo) prevê a adoção de técnicas de prevenção, com atividades de
conscientização sobre o uso do fogo em pastagens, além do reconhecimento da
vegetação por mapeamentos, do trabalho na criação de aceiros e barreiras à
passagem do fogo em áreas de risco, também com a formação de brigadas locais.
(ecodebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário