Água de reuso pode ser a solução para crise hídrica, dizem
especialistas
Solução pode estar na água dentro dos tubos de esgoto.
Quantidade que corre de baixo da terra em SP abasteceria mais de 5 milhões de
pessoas.
E se a solução para a crise hídrica viesse do esgoto?
Especialistas garantem ao Fantástico que a água de reuso pode ser a única
alternativa para o problema do abastecimento.
O
milagre dificilmente virá do céu. Só a chuva, como a que caiu nessa última semana
na região Sudeste, não vai dar conta do colapso da água. A solução, dizem os
especialistas, pode estar na água que a gente tenta a todo custo esconder e
ignorar. Dentro dos tubos de esgoto corre a água que pode matar a nossa
sede.
“A
água deve ser julgada pela sua qualidade, não pelo seu histórico. Nós temos
hoje a tecnologia para tratar água de qualquer esgoto e produzir água potável.
Eu acho que a única alternativa para São Paulo é reuso”, explica o professor de hidrologia da USP Ivanildo
Hespanhol.
Reusar
a água nas grandes cidades pode ser a grande herança dessa crise. Olha o que
querem fazer no Rio de Janeiro: O Rio Guandu abastece a Região Metropolitana do
Rio de Janeiro. E possui uma estação de tratamento que a envia água para mais
de 9 milhões de pessoas. O Fantástico sobrevoou o Rio Guandu, acompanhado pelo
subsecretário estadual de Ambiente do Rio de Janeiro, Antônio da Hora, até
chegar ao Distrito Industrial de Santa
Cruz.
Fantástico: O rio aqui parece
bastante poluído, né?
Antônio da Hora: É um problema
nacional o não tratamento de esgoto. E aqui não é diferente.
Economia no RJ poderia ser de 11
mil litros de água por segundo.
As
quatro principais empresas desse Distrito Industrial tem permissão do Estado
para tirar do rio mil litros de água por segundo, através de canais. Mas como
as empresas estão muito perto do mar, a água na região, fica salgada quando a
vazão do rio está baixa. Para que isso não aconteça, é preciso liberar mais
água das represas para o rio correr com mais força e empurrar o mar, impedindo
que ele avance. Se essas quatro empresas retirassem a água de outro lugar, o
rio não precisaria correr tão forte.
“Estaria
se armazenando essa água para o uso futuro que poderia dar outros destinos”,
explica o subsecretário estadual de Ambiente do Rio de Janeiro.
Segundo
a Secretaria de Ambiente do Rio de Janeiro, se poderia economizar cerca de 11
mil litros de água por segundo. A proposta é que essas quatro empresas
construam uma adutora de 14 quilômetros e passem a tirar a água de que precisam
da Cedae, a Companhia de Águas e Esgoto do Estado do Rio, responsável por
fornecer água para a população.
A
Cedae passaria a vender água de reuso. A
água que hoje é usada para limpar os filtros da tubulação e que é devolvida ao
Rio Guandu, tratada, mas sem ser reaproveitada. E agora, com essa adutora, a
vazão do Rio Guandu poderia ficar sempre no nível mais baixo.
Os
especialistas calculam que a água que hoje é usada para lutar contra o mar
poderia entrar no sistema e abastecer cerca de 3,5 milhões de pessoas.
Em
uma visão aérea, parece que o Rio Guandu tem bastante água, mas as represas que
o abastecem, na parte de cima, estão quase secas.
“A
prioridade absoluta é o abastecimento humano”, afirma André Corrêa, secretário
estadual de Ambiente do Rio de Janeiro.
Muitas cidades já reusam água
Existem
muitas cidades do mundo que já reusam água. O Fantástico já mostrou isso. Las
Vegas, nos Estados Unidos, construída no meio do deserto tem água
abundante.
Mas
nem é necessário ir tão longe: Búzios, Região dos Lagos, Rio de Janeiro. Para
virar água de reuso, o esgoto existente
na região passa por estações de tratamento equipadas com filtros especiais e
membranas, que retiram todas as impurezas.
Em
São Paulo, o professor Ivanildo Hespanhol é autoridade em reuso da água. Ele afirma que a gente já toma água de
esgoto e nem se dá conta.
“Se
você tomar o Rio Tietê, por exemplo, o Paraíba do Sul, é uma sequência de reuso não planejado e inconsciente”, conta o
professor.
As
cidades que ficam na beira de rios tiram água de lá, tratam para o consumo e
devolvem como esgoto. Outra cidade faz a
mesma coisa: tira a mesma água que já foi usada, trata e devolve como esgoto.
Reuso de forma planejada
O
professor Ivanildo propõe que o reuso
seja feito de forma planejada. Que é mais ou menos o que acontece em uma
estação de tratamento, em São Paulo. Parte do esgoto tratado no local vira água
de reuso. Para isso, a água passa primeiro por um filtro que tira as partes
sólidas. E depois vai para um tanque de filtragem biológica. O sonho de uma
bactéria seria morar dentro do tanque. Tudo foi pensado pra elas. Tem que tudo
estar do jeito certo para que eles possam, simplesmente, comer o resto da
sujeira que veio do esgoto, o dia inteiro. As bactérias passam por um processo
de aeração antes de sair de cena.
Depois
de passar por todo o processo, a água que era marrom, vai sair em uma torneira.
Ela sai transparente com cara de água potável, sem cheiro nenhum. Mas essa água
ainda não dá para beber.
“Aqui
a planta foi feita para atender as indústrias. Mas ela pode ser modificada para
atender o consumo potável.”, observa Marcos Asseburg, diretor presidente da
Aquapolo.
A
água tratada no local percorre 19 quilômetros em adutoras até chegar no polo
petroquímico do ABC, onde indústrias usam água. O professor Ivanildo propõe que
a água de reuso abasteça, daqui a um tempo, a nossa torneira.
Todo
o esgoto seria transformado em água potável e isso, ainda por cima, despoluiria
os rios de São Paulo.
“Eu
vejo que os rios de uma cidade como São Paulo deveriam ser uma amenidade,
integrados em parques, jardins, centros de áreas de lazer etc.”, alerta
Ivanildo,
A
quantidade de esgoto que corre hoje, por baixo da terra, seria suficiente para
abastecer mais de 5 milhões de pessoas.
Mas
eu vou beber água de esgoto? É a primeira reação de um desavisado. Os
especialistas dizem que se essa crise vai ter um legado, é nos fazer ver as
coisas de outro jeito. (g1)
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