A
encíclica ecológica do Papa começa na dose mais vasta e profunda que poderia
ter: “Nós somos terra. Todo nosso corpo é constituído de elementos do planeta,
seu ar é aquele que nos dá a respiração e sua água vivifica e restaura”.
Esse
é ponto de partido exato de qualquer reflexão sobre a vida sobre a Terra. Do
ponto de vista biológico, somos qualquer animal, parte da terra, dependentes
dela e, sem água, sem comida, sem ar, sem um ambiente próprio para a vida,
morremos como todos os outros animais.
Lembrando
São Francisco, o Papa diz que a Terra é “mãe e irmã”. Portanto, toda a
comunidade da vida só pode ser entendida nessa irmanação universal.
O
Papa não esquece, desde o início da encíclica, de lembrar que a Terra está
“oprimida e devastada” e, retomando Paulo em Romanos 8, reafirma que ela “geme
em dores de parto”.
Retoma
Paulo VI no número 5 e recorda que os avanços técnicos, científicos, se
sozinhos, podem conduzir a Terra e a humanidade a uma catástrofe, se não forem
acompanhados de um autêntico desenvolvimento “social e moral”. Portanto, retoma
a questão ética colada à técnica.
E
propõe como saída a mudança do estilo de vida, também no modo de produção e
consumo. E retoma Bento XVI para reafirmar que o problema é “estrutural”.
Ainda
como fundamento da reflexão, Francisco lembra que a destruição do ambiente está
vinculada à uma cultura de morte, que agride também o ser humano. Essa
realidade a Pastoral da Terra experimenta e reflete há anos: “aqueles que
destroem as florestas e rios, são os mesmos que mataram Chico Mende e Irmã
Dorothy”.
O
Papa segue a partir daí com fatos já sobejamente conhecidos: consumismo,
deflorestação, lixo, mudanças climáticas e todas suas causas e efeitos, etc.,
fazendo do planeta um “lugar de imundícies”.
Destaca
a questão da água e da biodiversidade, inclusive da invisível, fundamental para
os solos, plantas e reprodução da vida.
Francisco
ainda chama a atenção que “o grito da Terra é o grito dos pobres”, realçando
que a questão é socioambiental.
No
número 41 o Papa toca o dedo na ferida, afirmando que a responsabilidade
fundamental por essa crise vem do Norte, dos países desenvolvidos, que exploram
os países do sul, inclusive transferindo para esses a produção suja, que não
querem ter em seus próprios territórios. Aquilo que chamamos de “injustiças
socioambientais”.
Na
parte do “julgar” – não está com esse nome, mas o documento segue a lógica do
Ver, Julgar e Agir – a ênfase será no texto bíblico do “cultivar e guardar”
(Gen. 2,15), no Cristo Cósmico e na redenção da criação (Rom. 8).
No
agir, assume praticamente todas as boas lutas socioambientais que fazemos –
agroecológica, energia, transportes, preservação das florestas, cidades dignas
do ser humano, mecanismos globais para controle do efeito estufa, mudanças
climáticas, etc. -, portanto, nada de novo. Por fim, a necessidade de mudar o
“modelo global de desenvolvimento”(194). Essa é a grande síntese.
Para
nós, cristãos, aponta a necessidade de uma “Espiritualidade Ecológica”
(Capítulo Sexto, 202). Implica a mudança do “estilo de vida”, “uma educação
para o respeito ao ambiente”, que começa nas atitudes do cotidiano e se amplia
para a globalidade, enfim, a “conversão ecológica” (216), que é alegre,
contemplativa, cuidadora, sóbria, que gosta de arte, de música, celebrações
(inclusive eucaristia), enfim, sem o consumismo crasso da sociedade contemporânea.
O
texto conclui com uma bela oração sobre a criação.
O
novo desse texto para nós, aqueles que fazemos esse caminho há tantas décadas,
é que agora nos vejamos plenamente contemplados num documento oficial do
Vaticano.
Que
o documento produza os frutos semeados.
Sem
dúvida, sinal dos tempos. (ecodebate)
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