GUEDES
(2015) traz um comentário que endossa a visão de uma completa reformulação do
“modus operandi” atual em busca da sustentabilidade:
“Desenvolvimento
é uma palavra que, no conceito acima, está inscrita na ideia da
produção e lucro, dos meios de produção, do contínuo progresso. Sendo
assim inscrita, ela compactua e mantém o alicerce da estrutura hegemônica do
pensamento capitalista, colocando um teor “sustentável” para poder dar conta da
pressão global junto a degradação desenfreada que a humanidade sofre em todo o
meio-ambiente. Sustentabilidade remete a uma nova maneira de pensar, fomenta
uma racionalidade agregadora do sentido primordial do equilíbrio e respeito à
natureza, a geração de uma nova mentalidade e percepção que possa abranger os
campos do sensível e do inteligível, tendo como princípio a valorização das subjetividades
culturais e regionais. Esta forma de pensamento ambiental rompe
a ideia de totalidade, globalização, recursos naturais, conceitos
inscritos no cerne da concepção de desenvolvimento sustentável.
Mais
do que diferentes visões a respeito da questão do meio ambiente, há nas
diferenças entre uma expressão e a outra, necessário observar o “porquê” das
diferenças. A discussão é político-econômica, não apenas ambiental. Neste
sentido, a educação ambiental para a sustentabilidade, precisa ser muito bem embasada
e as pessoas seriamente comprometidas com as realidades. “Senão,
os caminhos epistemológicos que sugerem a manutenção da realidade através da
disseminação da ideia do desenvolvimento sustentável, como sendo a mesma de
sustentabilidade, vão se tornar hegemônicos”.
Isto
se deve ao fato de que a questão ambiental representa uma síntese dos impasses
que o modelo atual de civilização acarreta, chamada “crise civilizatória”.
Por
isso se sabe que leis e normas não vão resolver os problemas. Mas são muito
relevantes numa sociedade criada pela civilização humana que vive de direito
positivado.
A
civilização humana vai acabar determinando nova autopoiese sistêmica, na
acepção livre das concepções de Niklas Luhmann e Ulrich Beck, que contemple a
solução dos maiores problemas e contradições exibidas pelo atual arranjo de
equilíbrio.
Que
é um sistema instável, muito frágil e vulnerável. Para sua própria
sobrevivência, o “sistema” vai acabar impondo uma nova metamorfose efetiva.
Outro
mundo é possível, mesmo dentro da livre iniciativa. Ocorre enfatizar que nada é
contra a livre-iniciativa. Que sem dúvida sempre foi e parece que sempre será o
sistema que melhor recepciona a liberdade e a democracia. Mas uma nova
autopoise sistêmica para o arranjo social, é urgente e precisa ser desenvolvida
pela civilização humana.
Esta
mudança deve começar logo, juntando as lutas singulares, os esforços diários,
os processos de auto-organização e as reformas para retardar a crise, com uma
visão centrada numa mudança de civilização e uma nova sociedade em harmonia com
a natureza.
Não
é preciso esperar catástrofe ecológica ou hecatombe civilizatória para
determinar nova autopoiese sistêmica.
Neste
contexto, a superação dos problemas acarretados exigirá mudanças profundas na
concepção de mundo, de natureza, de poder e de bem-estar, tendo por base novos
valores individuais e sociais. Faz parte desta nova visão de mundo, a percepção
de que o homem não é o centro da natureza (BRASIL, 1996, p. 179). Tal situação
é apresentada depois de PORTO-GONÇALVES (2013, p. 15) da seguinte forma:
“com
a questão ambiental estamos diante de questões de claro sentido ético,
filosófico e político. O que fazer com o nosso antropocentrismo quando olhamos
do espaço nosso planeta e vemos o quão pequeno ele é e quando passamos a saber
que, enquanto espécie humana, somos apenas uma entre tantas espécies vivas de
que nossas vidas dependem?
Dizer
que a problemática ambiental é, sobretudo, uma questão de ordem ética,
filosófica e política é se desviar de um caminho fácil que nos tem sido
oferecido: o de que devemos nos debruçar sobre soluções práticas, técnicas,
para resolver os graves problemas de poluição, desmatamento, de erosão. Esse
caminho nos torna prisioneiros de um pensamento herdado que é parte do problema
a ser analisado. Existe uma crença não-crítica, de que sempre existe uma
solução técnica isenta e desvinculada.”
Obviamente
isto não é verdadeiro. Se poderia acrescentar o uso do enganador apanágio
tecnológico, mas não interessa perder a continuidade da reflexão.
Melhorias
duradouras nas condições de vida, baseadas na visão de sustentabilidade,
focadas na busca de formas mais sustentáveis para a produção industrial e
agropecuária, ações que incentivem a justiça social, uso racional dos recursos
naturais e o combate ao consumo exagerado são os grandes desafios neste momento
de crise civilizatória.
Um
ponto importante nesta discussão é a disputa pela hegemonia teórica. Para
HOEFFEL e REIS (2011, p. 126):
“a
dimensão política da questão ambiental é dada justamente pela disputa entre os
diferentes atores na busca de uma hegemonia teórica sobre a problemática do
meio ambiente, base para a legitimação das práticas de apropriação dos recursos
naturais pelos diferentes interesses em disputa.”
As
contribuições de dois críticos ao conceito de desenvolvimento sustentável, que
preferem a expressão “Sociedade Sustentável” é destacada:
“vejo
a questão exatamente como você”. Belo resumo do assunto. Estava aqui
pesquisando e encontrei um artigo da Revista Plural, do Programa de Pós
Graduação em Sociologia da USP que desenvolve a temática e nos coloca mais uma
expressão para pensar (e eventualmente usar) “sociedade sustentável” (KANASHIRO,
2009).
Nessa
concepção, segundo Lima (2003), prefere-se utilizar a expressão sociedade
sustentável, salientando a autonomia política, a diversidade cultural e os
valores éticos de respeito a vida. Na definição de DIEGUES (1992, p. 28): O
conceito de “sociedades sustentáveis” parece ser mais adequado que o de
“desenvolvimento sustentável”, na medida em que possibilita a cada uma das
sociedades definir seus padrões de produção e consumo, bem como o de bem-estar
a partir de sua cultura, de seu desenvolvimento histórico e de seu ambiente
natural.”
O
comentário do economista Ladislaw Dowbor ajuda-nos a compreender a relevância
de ir além do “triple bottom line”:
“Um
ponto de partida básico que nos ajuda a definir os rumos da gestão, é a visão
que está se tornando aceita no planeta de que temos de assegurar um
desenvolvimento que seja economicamente viável, socialmente justo, e
ambientalmente sustentável. Ou seja, não se trata mais das empresas fazerem
dinheiro, o Estado trazer o curativo, e os verdes protegerem as baleias. Toda
empresa, qualquer projeto do Estado, e qualquer iniciativa das organizações da
sociedade civil têm de buscar simultaneamente a articulação do econômico, do
social e do ambiental. Esta visão do “triple bottom line”, na medida em que se
popularizou, ajuda bastante. Mas na realidade, é insuficiente (DOWBOR, 2012, p.
1080).”
É
preciso fazer um resgate do conceito de Desenvolvimento Sustentável que foi
deturpado. Isto faz sentido se retomarmos o comentário de VEIGA (2013, p. 108)
de que, em 1992, na época da Rio 92, essa “bizarra parábola dos ‘três pilares’
nem sequer havia sido inventada. Ela só começou a ser difundida a partir de
1997, e no contexto das empresas, não das nações”. Conhecer o histórico deste
termo é essencial para um entendimento dos usos e deturpações nos discursos
ambientais:
“Nas
tentativas de encontrar uma definição de sustentabilidade condizente, ocorre se
deparar com a afirmação de que a aplicabilidade da sustentabilidade pressupõe
mudanças” (DOBSON, 1999, p. 12). “Relacionando a sustentabilidade com a noção
de sociedade sustentável “a sociedade sustentável é uma sociedade utópica no
sentido estrito do termo” (DOBSON, 1999 p. 13). “A utopia da sociedade
sustentável é uma perspectiva política e a principal de suas definições
possíveis é aquela que vive e se desenvolve integrada à natureza”.
Respeita a diversidade biológica e sociocultural da vida e está centrado no
pleno exercício responsável da cidadania, com a distribuição equitativa da
riqueza. Não utiliza mais recursos naturais do que pode ser renovado e favorece
condições dignas de vida para as gerações atuais e futuras (RODRIGUES, 1997, p.
159)”.
Segundo
HOEFFEL e REIS (2011, p. 125), “a julgar pelas controvérsias que a
definição de sustentabilidade coloca é de se esperar que diferentes posições
tenham surgido nos últimos anos. O conceito de sustentabilidade vem sendo
amplamente utilizado dentro de diferentes abordagens teóricas, muitas vezes
contraditórias”.
Para
DRYZEK (2005) “existem modelos híbridos nestas tipologias, mas enfatiza que
existem diversos discursos ambientais que em alguns casos se completam, mas que
em geral competem entre si e por uma hegemonia na solução de questões
ambientais e que a cada discurso é possível vincular distintas perspectivas
para o termo sustentabilidade” (2006 apud HOEFFEL e REIS, 2011, p. 127).
O
último comentário que se apresenta traz uma visão importante, que vai além das
disputas sobre os significados dos conceitos, focando na inevitável situação
“sine qua non” de mudança no modelo atual civilizatório, que nada mais é que
nova autopoise, já que o socialismo foi um desastre ambiental:
“Sem
chegar a uma conclusão fechada, cita-se a frase de Antoine Laurent de Lavoisier
(Paris, 26 de agosto de 1743), que diz que “na natureza nada se cria, nada se
perde, tudo se transforma”, então, independente de se fazer conta, usando
apenas esse raciocínio, se gastarmos mais do que o planeta tem como reserva, em
certo momento as mesmas se esgotarão, seja energética, minerais, vegetais,
animais, gases, enfim tudo. Uma coisa é garantida, sem água, calor, oxigênio e
comida a vida humana na Terra terá fim. Equilibrar a balança entre o que temos
e o que podemos gastar é o grande dilema. Temos que diminuir as desigualdades
sociais, não apenas elevando as condições dos menos favorecidos, mas diminuindo
o consumo e o desperdício desenfreado pelos mais abastados.”
A
proposta é construir uma visão que demonstre a heterogeneidade nos discursos
sobre os conceitos de Desenvolvimento Sustentável e Sustentabilidade, como
destacado pelo SAUVÉ (2005):
“Quando
se aborda o campo da educação ambiental, podemos nos dar conta de que apesar de
sua preocupação comum com o meio ambiente e do reconhecimento do papel central
da educação para a melhoria da relação com este último, os diferentes atores
(pesquisadores, professores, pedagogos, animadores, associações e organismos),
propõem diversas maneiras de conceber e de praticar a ação educativa neste
campo. Cada um predica sua própria visão e inclusive, formam-se “igrejinhas” pedagógicas
que propõem a maneira “correta” de influenciar, “o melhor” programa e o método
mais “adequado” (SAUVÉ, 2005, p. 17).” (ecodebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário