Falta água,
no Meia Ponte (GO), e no Tocantins, Araguaia, São Francisco, Nordeste e outras
regiões.
Os motivos?
É fácil citar 3:
1- Uso e
ocupação do solo: a impermeabilização e ações que prejudicam a infiltração da
água no solo, nosso principal reservatório, somado à poluição e degradação das
bacias, em áreas urbanas quanto rurais;
2- Gestão e
planejamento dos usos: a gestão, regulação e organização dos diversos usos é
vital para alocar vazões, que são limitadas, de forma planejada, para o seu
melhor aproveitamento, e atuação em eventos críticos. Diversos usos? Sim, uso
de água vai muito além das nossas torneiras; e
3- Ciclo
Hidrológico: as chuvas não são uma constante, variam no chamado Ciclo
Hidrológico, que nos é um grande desconhecido, e essas variações impactam na
organização dos usos, na alocação das vazões. Citando dois exemplos, desde 2008
há uma pequena redução na precipitação média na bacia Rio Meia Ponte (GO), a
montante de Goiânia, que abastece mais de 1,5 milhões de pessoas, situação
agravada a partir 2014, com redução de até 25%. O que ocorreu também na bacia
do Tocantins, com redução superior a 30%, acima da barragem de Serra da Mesa.
Porque
insistimos em não aprender com a história? O Sistema Cantareira (SP),
inaugurado em 1973, que abastece mais de 8,5 milhões de pessoas, tem origem em
uma crise hídrica ocorrida na década de 1960. Quer algo mais recente? Lembra de
1999? Do apagão? Do comprometimento do abastecimento público, geração de
energia, dos prejuízos e do aumento dos custos no país? O que aprendemos? O que
mudou no modo de agir? Porque falta de água de novo? Se estes dados são
públicos e, em tese, estamos conscientes dessa situação, só temos duas opções,
o hospital ou o cárcere, porque é insanidade ou é crime.
Está
faltando água. E a questão não é o que faremos agora, isto está claro: fiscalizar
usos irregulares, reduzir captações e garantir os usos prioritários:
abastecimento humano (diferente de urbano) e animais, o que já é pelos Órgãos
Gestores de Recursos Hídricos, com a participação dos demais componentes do
Sistema de Gestão Recursos Hídricos, com destaque para os Comitês de Bacias
Hidrográficas (CBH), como acontece hoje no rio Meia Ponte (GO), com atuação da
Secretaria de Recursos Hídricos de Goiás, a SECIMA, e no rio Descoberto, que
abastece o Distrito Federal, em atuação conjunta da SECIMA-GO, da Agência
Nacional de Águas-ANA e da Agência de Águas do DF – ADASA.
É
importante destacar que nos casos de escassez, e priorização de usos, a
população tem obrigação de fazer o uso racional da água, pois, para garantir o
consumo humano, outras atividades estão sendo fechadas, e é muito sério fechar
um uso regularmente planejado e instalado, seja qual for, pois também afeta
vidas e pessoas, com claros prejuízos a estes.
A questão a
ser respondida é “Quando vamos mudar a forma de pensar e gerir nossas águas?”.
Sim, gerir as águas. Essas que têm sido tratadas como detalhe, como anexo de
outras áreas, mas que é capaz de inviabilizar a existência da vida e todas as
atividades que exercemos, com severos prejuízos econômicos, sociais e ambientais.
Quando
sairemos desses quebra-galhos, dessa “gestão de crise”, de apagar incêndios,
para implementar o modelo definido na Política Nacional de Recursos Hídricos,
uma “gestão de risco”, com estrutura e condições para antecipar, planejar,
articular e agir, com foco não só o presente, mas também no futuro.
Quando
entenderemos que a água é uma incerteza, e, que: gestão é mais que autorizar
títulos de uso, chamados de “outorga”; que órgão gestor não é um cartório de
registro de vazões; que gerir o recurso hídrico é garantir o acesso a água e
distribuir, entre concorrentes, algo limitado; e que a responsabilidade não é
só do Estado, e Governos, mas também dos Setores Usuários e da Sociedade.
Nossa
disponibilidade hídrica deveria ser uma dádiva, mas pode rapidamente se
converter em maldição, caso nossa postura não mude, caso continue a reinar essa
ilusão nefasta de abundância hídrica, que faz com que a água não seja tratada
como prioridade, afinal, para que investir recursos e estrutura para gerir algo
abundante?
Uns dizem
que água é vida, mas é também meio ambiente, plantas, animais, história, saúde,
cultura, poesia, religião, solidariedade, integração.
Outros
dizem que água é um direito humano, é há sempre copos, torneiras, sanitários,
pias, calçadas, jardins, piscinas.
Outros
dizem que é um uso, na irrigação, agropecuária, produção de alimentos,
indústrias, mineração, saneamento básico (diluição dos efluentes urbanos),
geração de energia, transporte, pesca, turismo, lazer.
Segundo
Guimarães Rosa, em Grande Sertão Veredas, “perto de muita água, tudo é feliz”,
mas quando ela falta, aí ela é problema, beira o colapso, desastre, vira seca,
baldes, distâncias, conflitos, prejuízos, tristeza, sofrimento.
Água é tudo
isso, e por isso, devemos urgentemente começar a tratá-la e geri-la nesses
termos, com recursos, estrutura e pessoas, como um componente central,
estratégico, não com um apenso, anexo ou pedaço das “questões ambientais”, mas
como infraestrutura, base das atividades e do desenvolvimento econômico e social
sustentável.
Não
há vida sem água, assim como não há indústrias, agricultura, biodiversidade,
produção de alimentos, empregos, não há nada. Que não seja tarde para entender
e agir, para gerir nossas águas como elas merecem, mas principalmente como nós
deveríamos, como nós precisamos. (ecodebate)
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