A contribuição do decrescimento populacional para o meio
ambiente no século XXI.
“Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa
miséria” - Machado de Assis (Memórias póstumas de Brás Cubas)
A
fecundidade da população mundial caiu bastante nos 50 anos compreendidos entre
1965 e 2015. A taxa de fecundidade total (TFT) estava em torno de 5 filhos por
mulher entre 1950 e 1965 e caiu para 2,5 filhos por mulher no quinquênio
2010-15. Houve uma diminuição de 2,5 filhos na TFT em meio século. Foi a maior
redução já ocorrida na história da humanidade e representa um dos maiores e
mais significativos fenômenos sociais de mudança de comportamento de massa já
ocorridos na sociedade.
A
autolimitação do tamanho da prole ocorreu de forma racional e em meio ao
aumento do bem-estar médio global. Isto significa que as famílias optaram por
investir na qualidade dos filhos e não na quantidade de novos membros da
família. A redução da TFT não ocorreu em função da escassez de recursos, ao
contrário, foram os casais com maiores níveis de educação e renda e com maior
acesso à informação que lideraram a transição da fecundidade nos diversos
países.
Porém,
mesmo com toda a expressiva queda da TFT, a população mundial cresceu de 2,5
bilhões de habitantes em 1950 para cerca de 7,5 bilhões de habitantes em 2015.
Se a taxa de fecundidade se mantiver em torno de 2,5 filhos por mulher até 2100
a população mundial poderá duplicar entre 2015 e 2100 e chegar a um número
próximo de 15 bilhões de habitantes no final do século XXI.
A Divisão
de População da ONU faz várias projeções para as próximas décadas. Na projeção
média a taxa de fecundidade passaria dos atuais 2,5 filhos por mulher para 2
filhos por mulher em 2100. Na projeção baixa, a TFT passaria de 2,5 filhos para
1,5 filhos por mulher em 2100. Ou seja, na hipótese da projeção média, a TFT
seria reduzida em 0,5 filhos até 2100. Na hipótese de projeção baixa, a TFT
seria reduzida em 1 filho no espaço de 85 anos, conforme mostra o gráfico
acima.
Esta queda
projetada pode parecer pequena para o período 2015-2100 (diante dos 2,5 filhos
reduzidos entre 1965-2015), mas teria um efeito impactante sobre o volume total
da população e no número de nascimentos.
O gráfico
abaixo mostra que o número de nascimentos do mundo em 1950 estava,
aproximadamente, em torno de 100 milhões de bebês por ano e subiu para cerca de
140 milhões de bebês no quinquênio 2010-15. Se a TFT seguir a trajetória média,
conforme hipótese da Divisão de População da ONU, o número de nascimentos
anuais no mundo ficará em torno de 140 milhões nas próximas décadas e atingirá
131,2 milhões no quinquênio 2095-00. Se a TFT seguir a trajetória baixa, o
número de nascimentos anuais no mundo cairá progressivamente e atingirá 59
milhões no quinquênio 2095-00.
O
número total de nascimentos entre 2015 e 2100, na projeção média, seria de 11,8
bilhões e na projeção baixa de 7,7 bilhões. Isto significa que se, nos 85 anos
entre 2015 e 2100, a TFT cair de 2,5 para 2 filhos por mulher vão nascer 11,8
bilhões de crianças e se a TFT cair de 2,5 para 1,5 filho por mulher o número
de nascimentos se reduziria para 7,7 bilhões. Uma diferença de 4,1 bilhões de
crianças.
Estes dados
mostram o impacto da queda de meio filho sobre o volume da população total,
indicando que uma aceleração do ritmo da transição da fecundidade poderia
reduzir imediatamente o número de nascimentos. Por exemplo, na hipótese média
de projeção o número de nascimentos seria de 141 milhões no quinquênio 2015-20
e de 142,9 milhões no quinquênio 2045-50, enquanto na hipótese baixa de
projeção os números seriam de 126,6 milhões e 100 milhões, respectivamente.
Assim, se a TFT cair no ritmo estimado da projeção baixa haverá um bilhão de
nascimentos a menos até 2050. Portanto, mesmo com a inércia demográfica, a
redução seria significativa e poderia contribuir para diminuir a pressão sobre
o meio ambiente.
O
gráfico abaixo mostra a evolução da população mundial de 1950 a 2015 e os
cenários de projeção médio e baixo. Na hipótese média, a população mundial
passaria dos atuais 7,5 bilhões de habitantes para 11,2 bilhões de habitantes
em 2100. Na hipótese baixa, a população mundial ficaria com 7,3 bilhões de
pessoas no final do século XXI. Portanto, se houver uma queda de um filho na
TFT até 2100, em relação aos 2,5 filhos do quinquênio 2010-15, o mundo pode ter
uma população em 2100 menor do que a de 2015. Seriam menos 4 bilhões de pessoas
em relação à projeção média da Divisão de População da ONU. Ao invés de
crescimento demográfico, teríamos decrescimento demográfico.
Os dados
acima mostram que a demografia não é destino. Mais de 90% da população global
de 2100 vai nascer nos próximos 85 anos (de 2015 ao final do século). A
população mundial cresceu nos últimos milênios seguindo a máxima do livro do
Genesis: “Sede férteis e multiplicai-vos! Povoai e sujeitai toda a terra;
dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todo animal que
rasteja sobre a terra!”. Porém, agora é possível evitar o crescimento
exponencial ininterrupto.
Aumento da
população alimenta (por meio da oferta de trabalho e a demanda por consumo) o
aumento da economia. O super consumo só se sustenta porque existem pessoas
consumindo. A parcela da população mundial com consumo muito elevado está em
torno de 20%. Mas existe uma grande classe média (em torno de 40% da população
mundial) que quer mimetizar o consumo dos ricos e os 40% da população muito
pobres também querem (e merecem) aumentar o consumo de alimentos, educação,
saúde, lazer, etc.
O aumento
da população funciona como um fermento para o aumento do consumo. A obsessão
pelo crescimento demoeconômico contínuo fez a humanidade ultrapassar a
capacidade de carga do Planeta. Dados de 2013 mostram que a Pegada Ecológica
global está 68% acima da biocapacidade. E o déficit ecológico continua
aumentando. Em breve consumiremos 2 planetas.
Evidentemente,
a redução do consumo é a tarefa mais urgente para reduzir a pegada ecológica.
Mesmo com a rápida queda da taxa de fecundidade a população mundial vai crescer
nos próximos anos. Porém, seguindo a trajetória baixa da projeção da ONU, a
população mundial não ultrapassaria 9 bilhões de habitantes até 2050 e
diminuiria rapidamente na segunda metade do século XXI, podendo chegar em 2100
com um volume populacional menor do que o atual.
Seria um
risco para todas as formas de vida do Planeta aumentar a população mundial em 4
bilhões de habitantes e aumentar a economia e a exploração da natureza. A
humanidade, ao longo da história, já prejudicou bastante a saúde dos
ecossistemas e vai ter que enfrentar grandes desafios nas próximas décadas,
tais como: aquecimento global e ondas letais de calor, aumento do nível do mar
e naufrágio das áreas litorâneas, aumento dos furacões, acidificação dos
oceanos, erosão dos solos, poluição das águas, crescimento das mortes por
poluição do ar, redução da biodiversidade, insegurança alimentar, etc.
Ou seja, a
população dos países desenvolvidos está caindo mais rapidamente do que o
previsto nas projeções anteriores. Em compensação, as projeções para os países
não desenvolvidos indicam um aumento maior do que o previsto anteriormente.
Isto ocorre porque as taxas de fecundidade não estão caindo no ritmo esperado.
Menos
gente significará menos sofrimento humano e não humano. Com a novidade da
redução demoeconômica ficaria mais viável a recomposição dos ecossistemas e a
recuperação da biodiversidade. O colapso ambiental poderá ser evitado se houver
um esforço conjunto dos diversos países do mundo para colocar a humanidade em
um espaço seguro, onde a redução das atividades antrópicas possa coexistir com
a convivência harmoniosa com a natureza.
O motivo da
diferença está na redução mais lenta das taxas de fecundidade nos países de
renda média (menos desenvolvidos) e baixa (muito menos desenvolvidos). Na
revisão de 2010 da UN/ESA, a projeção da população em 2100 dos países
desenvolvidos era de 1,33 bilhão, dos países menos desenvolvidos de 6,1 bilhões
e dos países muito menos desenvolvidos de 2,7 bilhões. Na revisão de 2012, os
números para 2100 foram, respectivamente, 1,28 bilhão, 6,64 bilhões e 2,93
bilhões. Na revisão 2015, os números passaram para 1,2 bilhão, 3,2 bilhões e
6,8 bilhões, conforme mostra o gráfico.
A lição
sabemos de cor, só nos resta colocá-la em prática: Sem ECOlogia saudável não há
demografia viável ou ECOnomia sustentável. (ecodebate)
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