Variabilidade natural do
clima não explica o aumento da temperatura do planeta registrado desde o século
XIX.
Contribuição humana para as
mudanças climáticas é inegável, avaliam cientistas.
A temperatura média da Terra
aumentou 1,02ºC desde o século XIX e pode subir até quase 5oC até o fim deste século, apontam estudos publicados
nos últimos anos. A contribuição humana para o aumento da temperatura
terrestre, por meio do aumento das emissões de gases de efeito estufa pela
queima de combustíveis fósseis e o desmatamento, entre outras ações, é
inegável, avaliaram pesquisadores participantes da segunda edição do programa
de TV Ciência Aberta, sobre “Mudanças Climáticas Globais”, realizado em
08/05/18, no auditório da FAPESP.
O programa de TV Ciência
Aberta é uma parceria da FAPESP com o jornal Folha de S.Paulo. Realizado mensalmente no auditório da FAPESP,
o programa é exibido ao vivo pelo site da FAPESP (www.fapesp.br), pela página
da Agência FAPESP no Facebook (www.facebook.com/agfapesp) e
no YouTube (www.youtube.com/user/fapespagencia)
e pelo site da TV Folha (www1.folha.uol.com.br/tv).
A edição sobre “Mudanças
Climáticas Globais” teve como debatedores os pesquisadores Thelma Krug,
pesquisadora, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e
vice-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas
(IPCC); Paulo
Artaxo, professor titular e chefe do Departamento de Física Aplicada
do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e membro da
coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG); e Gilberto
Câmara, pesquisador e ex-diretor do Inpe, co-presidente do Belmont
Forum e diretor do Secretariado do Group on Earth Observations (GEO). A plateia
do programa foi composta por alunos do curso técnico em meio ambiente da Escola
Técnica Estadual (Etec) Guaracy Silveira, de São Paulo.
“É impossível não ver nos dados observados globalmente que a evolução das emissões de gases de efeito estufa desde a Revolução Industrial e, mais especificamente, nos últimos 50 anos, não esteja relacionada com as mudanças climáticas e com o aquecimento global”, disse Krug.
“É impossível não ver nos dados observados globalmente que a evolução das emissões de gases de efeito estufa desde a Revolução Industrial e, mais especificamente, nos últimos 50 anos, não esteja relacionada com as mudanças climáticas e com o aquecimento global”, disse Krug.
Efeito de estufa provocado
por interferência antropogênica.
“O IPCC, quando começou a
produzir seus primeiros relatórios, tinha dúvida dessa atribuição. Mas, hoje,
depois de 30 anos de trabalho e cinco relatórios produzidos, não há como negar
essa associação [entre a ação humana e o aquecimento global]”, afirmou.
De acordo com a pesquisadora,
se considerada apenas a variabilidade natural do clima terrestre nos modelos de
evolução climática global, não é possível reproduzir as observações de aumento
da temperatura do planeta registradas nos últimos anos. Ao integrar as
variações naturais com a ação antrópica, contudo, o modelo fica bem acomodado
com as observações, ela explicou.
Impactos desiguais
Os pesquisadores ressalvaram
que as mudanças climáticas não atingem os países de forma equânime. Alguns
países já estão sofrendo com um aumento de temperatura média da superfície
maior do que a estimada pelo IPCC, de 1,5ºC até 2040, e de entre 3ºC e 5ºC até
o final do século.
Na região Nordeste do Brasil,
por exemplo, a temperatura média aumentou 2oC nas últimas
décadas, ressaltou Artaxo.
“Um aumento médio de 3ºC a
5ºC na temperatura do planeta ao longo deste século pode resultar em um
aquecimento em áreas continentais superior a 5ºC, uma vez que elas se aquecem
mais do que as áreas oceânicas”, comparou.
“Imagine uma cidade como
Cuiabá (MT), onde a temperatura durante a tarde chega hoje a 41ºC, 42ºC,
conviver com temperaturas de 47ºC, 48ºC. Um aumento de temperatura como esse
tem impactos muito grandes, não só nas pessoas, como nas atividades econômicas,
na agricultura e no funcionamento de ecossistemas, como a floresta amazônica,
por exemplo”, apontou.
O nível do mar nos últimos
100 anos aumentou 24 centímetros em razão da dilatação da água com o aumento da
temperatura e o derretimento de geleiras continentais.
Temperaturas globais na
década de 1880 e 1980, comparadas à média no período entre 1951 e 1980.
Em regiões como na costa
brasileira o nível do mar aumentou 60 centímetros nos últimos 100 anos,
exemplificou Artaxo.
“Isso causa um aumento da
erosão costeira e na frequência e intensidade de inundações”, apontou.
Déficit democrático
Na avaliação de Câmara, o
ceticismo sobre a contribuição da ação humana para o aquecimento global deriva
da incapacidade de reconhecer que certos estilos de vida adotados nas economias
desenvolvidas, especialmente nos Estados Unidos, são incompatíveis com a
sobrevivência do planeta.
“Enquanto se gastar energia
absurdamente, utilizar carros que consomem muito óleo diesel e gasolina, e não
querer mudar esse estilo de vida sabendo que isso prejudica populações que
estão em outros países pobres, se arrumará desculpa para não fazer nada. Isso é
o que estamos vendo hoje no governo americano atual”, apontou o pesquisador.
Há um consenso político
internacional de que é preciso combater o aquecimento global e o Acordo
Climático de Paris, aprovado por 195 países – incluindo o Brasil – em dezembro
de 2015 durante a 21ª Conferência das Partes (COP-21), na capital francesa, é
uma prova disso.
O que tem faltado agora, na avaliação de Câmara, é a capacidade de os cidadãos dos países signatários do acordo cobrarem de seus governos o cumprimento de metas de contribuição de redução de emissões de gases de efeito estufa que apresentaram para estabelecer o acordo.
O que tem faltado agora, na avaliação de Câmara, é a capacidade de os cidadãos dos países signatários do acordo cobrarem de seus governos o cumprimento de metas de contribuição de redução de emissões de gases de efeito estufa que apresentaram para estabelecer o acordo.
O declínio do gelo flutuante
do Ártico é um dos sinais mais evidentes do aquecimento global. A animação
mostra a redução entre 1979 e 2010.
“O consenso político global
de que é preciso combater o aquecimento global existe. O que há, na realidade,
é um déficit democrático, ou seja, uma falta de capacidade das sociedades –
incluindo a brasileira – de exigir de seus governos cumprirem o que se
comprometeram”, afirmou.
Para aprovar o Acordo
Climático de Paris, cada país apresentou sua contribuição de redução de
emissões dos gases de efeito estufa – as chamadas Pretendidas Contribuições
Nacionalmente Determinadas (INDCs, na sigla em inglês) –, de acordo com o que
cada governo considerou viável a partir do cenário social e econômico local.
O Brasil comprometeu-se a
reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% abaixo dos níveis de 2005,
em 2025, com uma contribuição indicativa subsequente de redução das emissões de
gases de efeito estufa em 43% abaixo dos níveis de 2005, em 2030. Para isso, o
país se comprometeu a aumentar a participação de bioenergia sustentável na sua
matriz energética para aproximadamente 18% até 2030, restaurar e reflorestar 12
milhões de hectares de florestas, bem como alcançar uma participação estimada
de 45% de energias renováveis na composição da matriz energética em 2030.
Somada a INDC brasileira com
as dos 194 países signatários do Acordo do Clima de Paris, contudo, elas
levarão o planeta a uma trajetória de aquecimento de 3°C.
“Na mesma Convenção do Clima
que acordou que é preciso chegar em 2100 em um nível de aquecimento bem abaixo
de 2°C e perseguir a meta de 1,5°C, as INDCs, somadas, chegam a 3°C”, comparou Krug.
Muitas INDCs, como a do Brasil, foram apresentadas sem condicionantes. Mas muitos países afirmaram que conseguirão atingir suas metas de redução de emissões de gases de efeito estufa se conseguirem recursos financeiros e tecnologias.
Muitas INDCs, como a do Brasil, foram apresentadas sem condicionantes. Mas muitos países afirmaram que conseguirão atingir suas metas de redução de emissões de gases de efeito estufa se conseguirem recursos financeiros e tecnologias.
“Financiamento [de medidas de
adaptação e de mitigação] é uma questão muito sensível, especialmente para os
países em desenvolvimento”, disse Krug. “Se esses países não são os maiores
responsáveis pela mudança do clima, que já está aí, eles questionam por que têm
que pagar igualmente com o ônus de tentar refrear o aumento da mudança do
clima”, disse Krug. (ecodebate)
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