IPCC: ferramentas para reduzir
aquecimento global já existem.
O último relatório do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) divulgado em 04/04/22,
indica que desde 2010, houve reduções sustentadas de até 85% nos custos de
energia solar, eólica e baterias.
Embora traga um resumo assustador
do quanto a humanidade tem sobrecarregado o planeta com suas emissões de gases
de efeito estufa, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC)
tenta frisar que ainda há espaço para frear a pior das catástrofes, segundo a
última parte do 6° relatório (AR6) divulgado em 04/04/22.
As análises feitas pelo Grupo
III, que reúne 278 autores voluntários, mostram que a última década foi marcada
pelo mais alto nível de emissões já registrado pela humanidade. Em 2019, foram
despejadas 59 giga toneladas de CO2 equivalente (GtCO2e)
na atmosfera, o que representa 54% a mais do que o registrado em 1990. Em
comparação com 2010, a marca é 12% maior.
Praticamente nenhum setor escapou
dessa alta. Globalmente, energia (34%), indústria (24%), agricultura e mudanças
no uso do solo (22%) foram as principais fontes em 2019.
"Isso é o resultado da atual
política de energia", comentou sobre a alta de emissões António Guterres,
secretário-geral das Nações Unidas, durante coletiva de imprensa.
Apesar do cenário preocupante, os
cientistas tentam ressaltar que há saídas. "As decisões que tomamos agora
podem garantir um futuro habitável. Temos as ferramentas e o know-how
necessários para limitar o aquecimento", pontuou Hoesung Lee, presidente
do IPCC.
Para que o aquecimento do planeta
não ultrapasse a marca de 1,5°C, as emissões globais devem chegar ao pico antes
de 2025. Nos cinco próximos anos, até 2030, elas precisariam cair 43%. Ainda
assim, é muito provável que esse limite seja ultrapassado por um período, com
chances de a temperatura média cair até o final do século - o que os cientistas
chamam de "overshooting".
"Passar o limite de 1,5°C,
mesmo que temporariamente, é extremamente perigoso. Se isso acontecer, como os
relatórios passados mostraram, teremos eventos extremos mais fortes e mais
frequentes. Ainda que temporariamente, esse certamente não é o futuro que queremos
ter", declara Mercedes Bustamante, pesquisadora da Universidade de
Brasília e uma das autoras do atual relatório, em entrevista à DW Brasil.
Fim da era fóssil
A discussão em torno das
contribuições do Grupo III do IPCC, que analisa como mitigar as mudanças
climáticas e as soluções para limitar o aquecimento a 1,5°C, foi uma das mais
intensas da história do painel.
Os temas causam embates por
abarcarem políticas, tecnologias e quantias de dinheiro necessárias para
reduzir as emissões.
A primeira parte, dedicada à
ciência física das mudanças climáticas publicada em agosto do ano passado,
alertou que havia uma pequena chance de limitar o aquecimento global a 1,5°C. A
segunda, publicada no fim de fevereiro, praticamente quando a Rússia invadia a
Ucrânia, chamou a atenção para os impactos catastróficos e a importância das
medidas de adaptação a algumas mudanças já irreversíveis.
"A guerra da Ucrânia, com
todos seus horrores e sofrimento, trouxe ainda toda a questão da dependência do
combustível fóssil. Já sabemos o que essa dependência causa para o clima, agora
o mundo está vendo também o aspecto geopolítico", comenta Bustamante.
O abandono por completo das
fontes fósseis precisa ser imediato, afirma o relatório. A transição energética
envolve ainda eletrificação generalizada, eficiência e uso de combustíveis
alternativos - como o hidrogênio verde.
Os custos estão caindo e já
competem com o petróleo em vários lugares, dizem os autores. Em 2021, por
exemplo, fontes renováveis como solar e eólica foram responsáveis por 90% das
novas fontes de energia globalmente, pontua o World Resourses Initative.
Esperar que tecnologias com eficiência ainda comprovada salvem a humanidade, como captura e armazenado de CO2, é muito arriscada, pontuam os cientistas. "A única tecnologia testada em larga escala e comprovada é a fotossíntese", comenta Bustamante sobre o papel das árvores na remoção de gases estufa da atmosfera. "Nós temos que trabalhar agora para não contar tanto com métodos de captura que ainda não estão disponíveis", complementa.
O peso da floresta
Em todo o globo, o desmatamento tem um peso grande nas emissões. Segundo o relatório, ele representa a maior parte do setor classificado como agricultura, floresta e outros usos do solo. No Brasil, a destruição das florestas impulsiona o aumento das emissões no país: em 2020, elas foram responsáveis por 46% do total (998 milhões tCO2e), com aumento de 23,6% em relação ao ano anterior, segundo os dados do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) do Observatório do Clima.
"O Brasil viu o aumento
significativo do desmatamento, da pressão na floresta. A emissão hoje é maior
que há cinco anos”, declara Alexandre Prado, diretor de Economia Verde do
WWF-Brasil.
Por essa e outras políticas, o
país está longe de cumprir o que prometeu no Acordo de Paris e, dessa maneira,
contribuir efetivamente para o mundo se mantenha na rota de limitar o
aquecimento a 1,5°C. "Na última conferência do clima, vimos o governo
fazer uma pedalada metodológica pra aumentar as emissões até 2030. O Brasil não
está cumprindo uma das coisas essenciais do Acordo, que é o aumento de
ambição”, critica Prado.
Mercedes Bustamante lembra que as
florestas guardam um enorme potencial de reduzir as emissões. "Seja por
redução do desmatamento ou reflorestamento, a capacidade das florestas é enorme
e tem custos baixos comparado a outros”, afirma.
Anders Haug Larsen, da Rainforest
Foundation Norway, concorda sobre o destaque dado pelo IPCC à conservação da
natureza. "Preservação de áreas naturais importantes, como a floresta
tropical, é destacada como particularmente importante, pois contribui para a
conservação da diversidade biológica, bem como para a segurança alimentar e
hídrica”, analisa.
"É uma das opções de
mitigação mais econômica. Não só é rentável, mas a proteção da floresta
tropical é uma medida necessária para parar o aquecimento global”, complementa.
Ainda há muitas lacunas a serem
preenchidas sobre financiamento, reconhece o IPCC, principalmente na área de
florestas. Por outro lado, reflorestamento, conservação e combate ao
desmatamento são apontadas pelos cientistas como essenciais não só para frear
as mudanças climáticas, mas também para que os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável sejam alcançados, como segurança alimentar, saúde e bem-estar.
"Maximizar sinergias e
gerenciar compensações depende de práticas específicas, escala de
implementação, governança, capacitação, integração com o uso da terra existente
e o envolvimento de comunidades locais e povos indígenas”, conclui o relatório.
As principais florestas do mundo
precisam de proteção
Na COP26, 100 países se comprometeram a acabar com o desmatamento e revertê-lo até 2030. Quais são as ameaças às florestas mais importantes do mundo?
Floresta Amazônica
A floresta amazônica é um importante sumidouro de carbono e um dos lugares com maior biodiversidade do mundo. Mas décadas de exploração intensa e criação de gado dizimaram cerca de 2 milhões km2, e menos da metade do que restou está sob proteção. Um estudo recente mostrou que algumas partes da Amazônia agora emitem mais dióxido de carbono do que absorvem.
Taiga
Esta floresta subártica nórdica, composta principalmente de coníferas, se estende pela Escandinávia e por grandes partes da Rússia. A conservação da taiga varia de país para país. Na Sibéria Oriental, por exemplo, a rígida proteção da era soviética deixou a paisagem praticamente intacta, mas a crise econômica que se seguiu na Rússia gerou níveis cada vez mais destrutivos de extração madeireira.
Floresta Boreal do Canadá
As taigas subárticas da América do Norte são conhecidas como florestas boreais e se estendem do Alasca ao Quebec, cobrindo ⅓ do Canadá. Cerca de 94% das florestas boreais do Canadá estão em terras públicas controladas pelo governo, mas apenas 8% são protegidas. O país, um dos principais exportadores mundiais de produtos de papel, derruba delas cerca de 4 mil km2 por ano.
Floresta Tropical da Bacia do Congo
O Rio Congo nutre uma das florestas tropicais mais antigas e densas do mundo, abrigando alguns dos animais mais icônicos da África, entre os quais gorilas, elefantes e chimpanzés. Mas a região também é rica em petróleo, ouro, diamantes e outros minerais valiosos. A mineração e a caça impulsionaram seu rápido desmatamento. Se não houver mudanças, a mata desaparecerá totalmente até 2100.
Florestas Tropicais de Bornéu
A região ecológica de 140 milhões de anos se expande por Brunei, Indonésia e Malásia e abriga centenas de espécies ameaçadas, como o orangotango vermelho e o rinoceronte de Sumatra. Grandes áreas são degradadas pela exploração de madeira, azeite de dendê, celulose, borracha e minerais. O desmatamento proporcionou acesso a áreas remotas, impulsionando o comércio ilegal de animais selvagens.
Floresta de Primorie
Localizada no extremo leste da Rússia, a floresta de coníferas abriga o tigre siberiano e dezenas de outras espécies ameaçadas de extinção. Por ficar junto ao Oceano Pacífico, a floresta tem condições tropicais no verão e clima ártico no inverno. Sua localização isolada e esforços de preservação a deixaram em grande parte intacta, mas a expansão do corte comercial tornou-se uma ameaça crescente.
Floresta temperada valdiviana
A floresta valdiviana cobre uma estreita faixa de terra de Chile e Argentina, na costa do Pacífico. Árvores perenes, de crescimento lento e longa vida, dominam partes da floresta, mas sua extração extensiva ameaça a vegetação endêmica, que está sendo substituída por pinheiros e eucaliptos de rápido crescimento, mas incapazes de sustentar a biodiversidade da região.
(dw)
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