terça-feira, 15 de outubro de 2024

Brasil reclamou e Alemanha pede que lei antidesmatamento seja adiada

Depois do Brasil reclamar, Alemanha pede que lei antidesmatamento seja adiada.

Dois dias depois de o Brasil pedir à União Europeia (UE) o adiamento de lei editada pelo bloco para barrar a importação de produtos oriundos de áreas desmatadas, a Alemanha anunciou em 13/09/24 ter encaminhado um pedido nesse mesmo sentido à Comissão Europeia.
A movimentação vem num contexto de negociações do acordo de livre comércio entre Mercosul e UE, que tem sido defendido pela Alemanha.

Alegando falta de clareza sobre pontos-chave do dispositivo, Berlim pediu para que ele passe a valer só em 1º/07/2025, 6 meses depois do prazo atualmente previsto –a norma foi aprovada em junho do ano passado e, pelo calendário atual, entra em vigor em 30/12/24.

"As empresas precisam de tempo suficiente para se prepararem", argumentou o ministro alemão da Nutrição e Agricultura, Cem Özdemir, do partido verde.

Özdemir alegou que a entrada em vigor da lei já no final do ano pode levar ao colapso das cadeias de suprimento, prejudicando as economias alemã e europeia, pequenos produtores de fora do bloco e consumidores.

Um dia antes, o chanceler federal Olaf Scholz já havia dito a jornalistas que defendeu a suspensão da lei em conversa com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, até que alguns pontos sejam "esclarecidos".

Críticos do dispositivo se queixam de "requerimentos impraticáveis" e "fardos burocráticos" sobre produtores e empresas.

A maior bancada do Parlamento Europeu, o conservador Partido Popular Europeu (PPE), do qual von der Leyen faz parte,chamou a lei de "monstro burocrático".

Outros partidos europeus afirmam que o bloco ainda tem que esclarecer como as regras vão funcionar na prática.

O que diz a lei antidesmatamento

Elogiada por ambientalistas, a lei europeia institui uma espécie de marco temporal do desmatamento, barrando produtos como café, cacau, soja, madeira, óleo de palma, carne bovina, papel, borracha e derivados, como couro ou móveis, produzidos em florestas destruídas após dezembro de 2020.

O bloco é, depois da China, o maior mercado para esses produtos e responde, segundo a ONG ambientalista WWF, por 16% do desmatamento global.

O texto prevê que empresas importadoras na UE serão responsáveis por rastrear suas cadeias de suprimento, a partir de dados de satélite e de geolocalização, para provar que não adquiriram commodities de áreas desmatadas.

Países exportadores considerados de alto risco teriam ao menos 9% de seus produtos inspecionados, com esse percentual caindo em países onde o risco de desmatamento é considerado menor –essa categorização, porém, foi deixada de lado por ora em meio a críticas de países que veem nela um "instrumento político" que permitiria ao bloco escolher quem teria acesso "especial" ao mercado europeu.

Pela normativa, a Comissão Europeia também "pode" levar em consideração a "existência, conformidade ou efetiva aplicação de leis que protejam os direitos humanos, os direitos dos povos indígenas, das comunidades locais e de outros detentores de direitos de posse tradicionais."

À agência de notícias AFP, um diplomata disse que a UE ainda não apresentou regras de compliance nem um sistema claro para categorizar os países segundo escalas de risco.

Outra crítica da lei, a chefe da Organização Mundial do Comércio, Ngozi Okonjo-Iweala, fez queixa semelhante em entrevista ao Financial Times, dizendo que a falta de regras claras de compliance provoca incertezas para exportadores que não saberiam se teriam seus produtos barrados.

O que diz o Brasil

O governo brasileiro teme que a lei possa ser usada para reduzir a cota de commodities que o país exporta para a UE e quer alguma forma de compensação caso ela seja implementada. Também afirma que ela eleva os custos de produção e exportação, principalmente para pequenos produtores.

Segundo carta assinada pelos ministros Mauro Vieira (Itamaraty) e Carlos Fávaro (Agricultura) e enviada à Comissão Europeia, 30% das exportações ao bloco são de produtos afetados pela normativa, ou o equivalente a US$ 15 bilhões (R$ 83,5 bilhões).

Vieira e Fávaro afirmam que o regulamento gera "séria preocupação para diversos setores exportadores brasileiros e para o governo", e pedem à UE que não a implemente no prazo previsto e "reavalie urgentemente a sua abordagem sobre o tema". Alegam ainda que a lei é um "instrumento unilateral e punitivo, que ignora as leis nacionais sobre combate ao desmatamento" e contraria o "princípio da soberania" brasileira.

No passado, outros países latino-americanos e africanos fizeram objeções semelhantes à lei, assim como os Estados Unidos.

Como nasceu a lei antidesmatamento

A Amazônia, que cobre quase 40% da América do Sul, perdeu cerca de 20% de sua cobertura ao longo do último século por causa do avanço do agronegócio, da mineração, da exploração de madeira e da ocupação urbana.

Isso é um problema porque as florestas absorvem carbono e são cruciais para o enfrentamento das mudanças climáticas e o equilíbrio de ecossistemas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal da Amazônia até 2030, tarefa que pressupõe contrariar interesses já bem consolidados na região.

"O Brasil acha que a regulação antidesmatamento é problemática porque cobre um terço de suas exportações ligadas ao desmatamento. Cabe ao Brasil banir o desmatamento, não à UE mudar suas regras", afirmou via X o eurodeputado Pascal Canfim, da bancada centrista Renovar a Europa.

"Sabíamos desde o início que essa é uma batalha que afeta interesses econômicos muito grandes", disse Canfim à agência de notícias AFP.

Segundo ele, a UE importa €$ 15 bilhões/ano (R$ 92,5 bilhões) em commodities associadas ao desmatamento– especialmente a soja. "É precisamente esse problema que queremos resolver."

Representantes do bloco sinalizaram que a Comissão Europeia avalia de fato adiar a implementação da lei, ou simplificá-la. Mas isso demandaria a reabertura da legislação, o que poderia criar uma briga política ainda maior– ainda mais dado que a Comissão Europeia terá nova (e mais conservadora) composição a partir da semana que vem, como resultado das últimas eleições europeias.

Essas conversas preocupam grupos ambientalistas.

"No ano passado, o mundo perdeu uma área de floresta do tamanho da Suíça", disse Nicole Polsterer, da ONG Fern. "O debate sobre adiar a lei traz o sério risco de abandoná-la completamente, como alguns estão determinados a fazer".

Outros grupos afirmam que muitas empresas e países já se prepararam para cumprir a lei e estão bem avançados. (biodieselbr)

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