quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Nova crise alimentar mundial

Ameaça de nova crise alimentar mundial no horizonte
O receio de que esteja iminente uma repetição da crise alimentar de 2007-2008 está a crescer a nível global. No mês passado, os preços dos alimentos aumentaram seis por cento nos mercados mundiais e os importadores estão a adquirir sofregamente a colheita de cereais dos Estados Unidos o maior exportador mundial deste tipo de produtos. Uma das principais razões está no facto de a produção dos EUA ter encolhido este ano, drasticamente, devido à seca, fazendo os preços do milho atingir novos recordes.
Um relatório governamental divulgado revela que um sexto da colheita de milho dos Estados Unidos ficou destruída em apenas um mês devido à pior seca dos últimos cinquenta anos.
O departamento da Agricultura dos EUA reviu em baixa as previsões para a colheita deste ano, diminuindo em 16,9% as estimativas de julho.
No que respeita à colheita de soja, as previsões também foram revistas em baixa, tendo havido uma redução de 11,7% em relação à estimativa feita no mês passado.
Estes números representam uma quebra, em relação a 2011, de 13% à produção de milho e de 12%, no que respeita à soja.
A presente conjuntura já levou a subidas de entre 25 a 50% dos preços do trigo, do milho e da soja. Sendo que no caso dos últimos dois cereais, os preços já ultrapassaram os da crise de 2007-2008.
"El Nino" piora situação
A somar-se às preocupações está uma previsão do serviço meteorológico do Japão, segundo a qual o fenómeno meteorológico conhecido por El Nino já se começou a produzir e deverá manter-se pelo menos até ao inverno, o que faz supor a continuação de condições meteorologicas desfavoráveis até o final do ano.
Estes dados aguçaram o apetite dos especuladores nos mercados mundiais de alimentos que funcionam como os de qualquer outro produto de consumo. O relatório do governo americano fez com que o preço de referencia dos futuros sobre o milho subisse imediatamente mais de 3%, atingindo um pico recorde de US$8.4375 por alqueire.
Face a este panorama, a agência alimentar da ONU está a pôr em guarda os governos para que evitem o tipo de práticas comerciais que, em 2008 contribuíram para agravar a crise.
“Existe o potencial para que a situação se desenvolva da mesma forma que em 2007/2008”, disse à Reuters o economista e analista da Organização da Alimentação e Agricultura Abdolreza Abbasian.
ONU adverte contra repetição das "más políticas"
“Espera-se que desta vez não se venham a produzir más políticas e intervenção nos mercados através de restrições” disse Abassian “ se isso não acontecer, não assistiremos a uma situação tão séria como a de 2007/2008. Mas se essas políticas se repetirem, tudo é possível”.
Recorde-se que a crise de 2007/ 2008 foi provocada por uma mistura de fatores que incluíam o alto preço do petróleo, a cada vez maior utilização de biocombustíveis, o mau tempo e uma série de políticas de exportação restritivas, proibições à exportação e aumento das tarifas, que fizeram disparar os preços dos alimentos e estiveram na origem de motins em mais de 30 países, do Bangladesh ao Haiti.
Segundo Abassian, desta vez, a existência de stocks abundantes de arroz, a crise económica mundial e o facto o preço do petróleo estar mais baixo do que em 2007/2008 pode ajudar a evitar uma subida drástica do preço dos alimentos.
No entanto já há alguns sinais alarmantes, que incluem indícios de que alguns governos estão antecipadamente a adquirir e a armazenar stocks invulgarmente grandes de cereais numa espécie de “açambarcamento” a nível estatal.
As exportações de milho dos EUA na última semana atingiram o segundo pico mais alto dos últimos dez meses, encontrando-se incluída neste número uma operação de aquisição única, quase recorde, feita por importadores do México, que é o segundo maior importador a nível mundial.
Ressurge o debate “alimentos vs combustíveis”
O perigo de uma repetição da crise alimentar, renovou o debate sobre a produção de biocombustíveis que consome uma parte significativa da produção de milho. No caso dos EUA, cerca de 40% da colheita destina-se habitualmente à produção de etanol.
O diretor-geral da Agencia das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, José Graziano da Silva, apelou a uma “suspensão temporária, com efeitos imediatos” do mandato federal dos EUA, que obriga a as companhias americanas de combustível a garantirem que, este ano, 9% das suas reservas sejam compostas de etanol.
“Uma grande parte da colheita já de si reduzida vai ser reclamada pela produção de biocombustíveis, para cumprir com os mandatos federais a esse respeito, o que vai deixar ainda menos [milho] para os mercados de alimentação de pessoas e gado” escreveu Graziano da Silva no jornal Financial Times.
“Uma suspensão imediata, temporária desse mandato daria algum descanso ao mercado e permitiria que uma porção maior da colheita fosse encaminhada para utilizações alimentares e para o gado”.
O diretor – geral da Agencia das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, não é o único a pressionar os Estados Unidos para que afrouxem as quotas de integração de etanol.
Esta semana, 25 senadores dos EUA pediram à Agência de Proteção Ambiental, para que ajuste o mandato, e o executivo-chefe do gigante de produção de cereais Cargill disse que deveria ser o mercado a ditar a utilização de biocombustíveis.
Os primeiros a fazer apelos neste sentido tinham sido os criadores de gado americanos, que são forçados a licitar contra os produtores de biocombustíveis e assim têm de pagar mais para alimentar os seus animais.
No entanto, a Agência de Proteção Ambiental ainda não recebeu nenhum requerimento oficial para mudar as regras, o qual, ao abrigo da lei, só poderia ser feito por um governador de Estado, ou por uma das companhias que se dedicam à mistura de combustíveis. (rtp.pt)

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