sábado, 9 de janeiro de 2010

Gestão e disponibilidade da água é tema de coletânea de livros organizada por professores da USP

Água, um desafio à paz mundial
Um novo fenômeno entrou para a lista de preocupações prioritárias das forças militares internacionais. As mudanças climáticas têm tudo a ver com os complexos e novos desafios à paz mundial. Foi o que declarou o secretário da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), Anders Fogh Rasmussen. No cerne de todos os problemas climáticos, a água. Sua escassez irá agravar os problemas de falta de comida nos países pobres do Hemisfério Sul. Já o derretimento das calotas polares desenhará novos caminhos marítimos e acesso mais fácil a energia e recursos no Hemisfério Norte. Em suma, a água estará no cerne das disputas globais, em breve. A água em todas as suas dimensões é justamente o foco de uma coleção de livros recém-lançada pela Annablume Editora. Nada mais oportuno num momento de debates aquecidos e busca de acordos na maior cúpula sobre o clima, em Copenhague. Trata-se de quatro títulos organizados pelos professores Pedro Jacobi, da Faculdade de Educação, e Paulo Sinisgalli, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), ambas da USP. Reúnem estudos do Projeto GovÁgua, financiado pela União Europeia e sediado no Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental (Procam) da USP. A rede de dez instituições universitárias e de pesquisa que compõem o projeto investiga as dinâmicas de bacias hidrográficas periurbanas em áreas metropolitanas. O resultado é uma compilação de textos sobre as dimensões socioeconômicas, ambientais, territoriais e institucionais da governança da água na América Latina e Europa. O volume 1, Governança da água e políticas públicas na América Latina e Europa, abrange aspectos da gestão do recurso na Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Inglaterra, França e Holanda. A semelhança com alguns dos problemas de países sul-americanos, e também com o modelo institucional francês, relatada nos artigos, leva o leitor a compreender melhor a própria dinâmica brasileira de governança da água. Esse volume discute questões como demanda e disponibilidade do recurso, sistemas de distribuição, legislação e arranjos institucionais, entre outros. Nesse primeiro volume, Jacobi e Sinisgalli, organizadores da coletânea, juntam-se a outros dois autores, Yvonilde Medeiros e Ademar Ribeiro Romeiro, para assinar o artigo “Governança da água no Brasil: dinâmica da política nacional e desafios para o futuro”. Ao analisar a dinâmica nacional de gestão do recurso, trazem um estudo panorâmico com dados tão abrangentes que vão desde indicadores sociais e econômicos até questões específicas de balanço hídrico e distribuição de água nos Estados brasileiros. Discorrem sobre temas como o histórico institucional do setor, as mudanças na legislação, qualidade da água, balanço hídrico e a Lei das Águas de 1997. Avaliam as tendências do modelo de gestão de regiões hidrográficas, os avanços e contradições do novo arranjo organizacional. Dimensões político-institucionais da governança da água na América Latina e Europa é o título do volume 2. O texto de apresentação mostra que, no século 20, a utilização de água cresceu seis vezes, uma taxa de crescimento duas vezes superior à do crescimento populacional. Tal demanda requer ferramentas de gestão que façam frente à diversidade cultural e institucional dos países. Governabilidade, correlação de forças, poder e tecnologias de consenso na temática da água são alguns dos temas tratados nesse volume. O artigo de abertura, “Conflitos, poder e tecnologias de consenso”, de Carlos Crespo Flores, mostra teoricamente as relações de poder e construções de consensos, descrevendo visões que vão desde Michel Foucault e Friedrich Nietzsche até as mais novas abordagens da economia ambiental, do ecofeminismo e do ecologismo dos pobres. A importância da participação dos diferentes atores na discussão sobre a governança da água é debatida no volume 3 da série, Governança da água na América Latina e Europa: atores sociais, conflitos e territorialidade. O texto de abertura discute um assunto bastante debatido, mas nem por isso esgotado: “A disposição a pagar pelo uso da água na bacia do rio Paraíba do Sul – trecho São Paulo, Brasil”. Assinado pelo professor Sinisgalli e outros quatro autores, o texto analisa a importância de valorar monetariamente os recursos ambientais e as questões decorrentes desse debate. A pesquisa utilizou o método de valoração contingente (MVC) para avaliar a disposição de determinada população em pagar pelo uso da água. Os municípios selecionados para a pesquisa foram São José dos Campos, Guaratinguetá, Taubaté, Santa Branca, Cachoeira Paulista, São Luís do Paraitinga e Paraibuna. Chegou-se a um valor muito baixo, de R$ 0,067 (US$ 0,026) por residência por mês, o que, para os autores, pode estar associado à baixa renda familiar e ao descrédito associado aos governos locais, além da dificuldade intrínseca do método de valoração associado ao recurso avaliado. Alto Tietê – Atores e processos na governança da água no Estado de São Paulo é título do outro livro recém-lançado, que é independente dos três volumes da série, mas vai ao encontro do mesmo tema. Enfoca questões mais específicas das águas do Estado de São Paulo, com resultados de pesquisas realizadas na Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, no reservatório Billings e na porção metropolitana da bacia do rio Pirajuçara. Os artigos, em geral, tratam de conflitos na gestão compartilhada da água, a participação popular e a relação com comitês de bacias hidrográficas, os processos decisórios, as práticas de controle social e o enfrentamento dos problemas socioambientais. O artigo de abertura, “Estruturação e implantação da gestão compartilhada das águas: o comitê de bacia hidrográfica do Alto Tietê”, é resultado da tese de doutorado de Valéria Nagy de Oliveira Campos. Traz um estudo detalhado das etapas de estruturação do sistema de gestão naquela bacia e aponta limites e obstáculos ao funcionamento do comitê. No segundo artigo, o professor Jacobi mostra que o desempenho institucional está intimamente ligado à influência exercida pelo capital social, isto é, a interação, reciprocidade, cooperação e confiança estabelecidas numa determinada associação ou organização.Dada a sua importância estratégica, os estudos sobre as bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ) aparecem em toda a coletânea e nesse título sobre a problemática estadual não seria diferente. O artigo de Maria Castellano e Fabiana Barbi fecha essa compilação, destacando as disputas e os desafios da governança da água nessa região hidrográfica. O trabalho aborda, entre outros pontos, a descentralização da gestão no Sistema Cantareira e a implementação da cobrança pelo uso da água no sistema PCJ.

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