quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Na Suécia, rótulos indicam nível de CO2 na produção de alimentos

Prateleira de produtos ‘ambientalmente amigáveis’ em supermercado em Estocolmo (Suécia), onde os alimentos informam a emissão de CO2 envolvida na produção. Rótulos mostram aos suecos quanto carbono é liberado na produção dos alimentos. Ao procurar aveia na prateleira do mercado, Helena Bergstrom, 37, admite ter ficado confusa com o rótulo em uma caixa azul do produto que dizia, “Impacto climático declarado: 0,87 kg CO2 por kg do produto”. “Mesmo agora, não sei o que aquilo significa”, confessa Bergstrom, funcionária de uma companhia farmacêutica. Mas se uma nova experiência feita aqui tiver sucesso, ela e milhões de outros suecos logo descobrirão o significado daquela informação. Novos rótulos indicando o nível de emissão de dióxido de carbono associado à produção de alimentos, das massas feitas com trigo integral aos sanduíches das lanchonetes do tipo fast food, estão surgindo nas embalagens de alguns produtos de supermercados e menus de restaurantes e lanchonetes em todo o país. As pessoas que vivem para comer podem desprezar essa iniciativa, chamando-a de tola. Mas mudar a dieta de uma pessoa pode ser algo tão efetivo para reduzir a emissão dos gases causadores da alteração climática quanto trocar de automóvel ou deixar de usar máquinas de secar roupa, dizem os especialistas. “Somos os primeiros a tomar esta iniciativa, e para nós isto consiste em uma nova forma de pensar”, explica Ulf Bohman, diretor do Departamento de Nutrição da Administração Nacional de Alimentos sueca, que no ano passado foi incumbida de criar novas diretrizes alimentares, conferindo peso igual ao clima e à saúde. “Estamos acostumados a pensar na segurança e na nutrição como sendo algo desvinculado do meio ambiente”. Algumas das novas diretrizes alimentares propostas, divulgadas durante o último verão do hemisfério norte, podem parecer desnorteantes para quem não estiver acostumado a ver isso. Elas recomendam, por exemplo, que os suecos deem preferência ao consumo de cenouras, e não ao de pepinos e tomates (ao contrário das cenouras, na Suécia os pepinos e os tomates precisam ser cultivados em estufas aquecidas, o que consome muita energia). Eles não são aconselhados a comer mais peixe, apesar dos benefícios à saúde, porque as reservas de pescado da Europa estão praticamente esgotadas. E, de forma um pouco menos surpreendente, aconselha-se aos suecos que substituam a carne vermelha por feijão ou frango, devido ao fato de a criação de gado bovino gerar muita emissão de gases causadores do efeito estufa. “Para os consumidores, é difícil”, admite Bohman. “Eles estão recebendo orientações de ordem ambiental, mas precisam achar um denominador comum entre essas orientações e a questão: ‘O que devo fazer para me alimentar de forma mais saudável?”. Muitos consumidores suecos dizem que se está exigindo muito deles. “Eu gostaria de afirmar que esse tipo de informação me fez modificar a minha alimentação, mas isto não ocorreu”, confessa Richard Lalander, 27, que come um hambúrguer Max (1,7 quilogramas de emissões de dióxido de carbono) próximo a um menu que revela que um sanduíche de frango (0,4 quilogramas) teria causado menos danos ao planeta. Mas alguns especialistas dizem que se as novas diretrizes fossem estritamente seguidas, os suecos poderiam reduzir as suas emissões derivadas da produção de alimentos entre 20% e 50%. Em torno de 25% das emissões produzidas pelos seres humanos nas nações industrializadas estão vinculadas aos alimentos que eles comem, segundo uma recente pesquisa divulgada aqui. E o nível de emissões liberadas na produção de alimentos varia enormemente de um produto para outro. Embora os consumidores norte-americanos e europeus atuais possam estar acostumados a verificar o conteúdo de nutrientes, calorias ou gordura, eles frequentemente nada sabem quando se trata de determinar se o consumo de tomates, frango ou arroz é positivo ou negativo para o clima. Para complicar ainda mais a questão, o impacto em termos de emissões provocados, digamos, pela cenoura, pode variar de intensidade segundo uma escala multiplicativa de um a dez, dependendo de como e onde ela seja cultivada. Estudos anteriores sobre as emissões vinculadas à produção de comida concentravam-se nos altos custos ambientais do transporte de alimentos e da criação de gado. Mas pesquisas mais refinadas revelam que as emissões dependem de vários fatores, incluindo o tipo de solo usado para produzir alimentos e o fato de os produtores de leite utilizarem forragem local ou soja importada para a alimentação do gado. Grupos empresariais, cooperativas agrícolas e programas de rotulagem orgânica, bem como o governo, apresentaram corajosamente maneiras coordenadas de identificar opções alimentares. Max, a maior rede doméstica de lanchonetes especializadas em hambúrgueres na Suécia, exibe os cálculos de emissões ao lado de cada produto no seu menu. A Lantmannen, o maior grupo especializado em produtos agrícolas do país, passou a colocar rótulos precisos nas embalagens de certos alimentos vendidos nos supermercados, incluindo frango, aveia, cevada e massas. Os consumidores que prestarem atenção poderão, por exemplo, descobrir que o volume de emissões geradas pela produção do arroz, o grão mais popular no país, é duas ou três vezes maior do que o da pouco utilizada cevada. Alguns produtores argumentam que os novos programas são exageradamente complexos e que eles ameaçam os lucros. As recomendações alimentares, que estão sendo distribuídas para análise e comentários não só na Suécia, mas em toda a União Europeia, têm sido atacadas pelo setor de produção de carne do continente, pelos criadores noruegueses de salmão e pelos produtores de óleo de palmeira, para citar apenas alguns. Este é um processo de aprendizado à base de tentativas e erros; ainda estamos tentando determinar se isto funciona. No ano que vem, o KRAV, o principal programa escandinavo de certificação orgânica, começará a exigir que os produtores rurais adotem técnicas de baixa emissão para que possam exibir o cobiçado rótulo da organização em seus produtos, o que significa que a maior parte dos tomates produzidos em estufas não poderá mais ser classificada de orgânica. Esses padrões provocaram alguns protestos. “Há produtores reais felizes e outros que afirmam que estão arruinados”, diz Johan Cejie, gerente de questões climáticas do KRAV. “Por exemplo, os produtores que têm nas suas propriedades solos com elevada concentração de turfa poderão ver-se incapazes de produzir cenouras, já que o processo de aração da turfa libera grandes quantidades de dióxido de carbono. Para conseguir o rótulo de produto orgânico, eles talvez tenham que cultivar outras plantas que não exijam aração da terra”. No ano que vem, o Krav exigirá que sejam utilizados biocombustíveis para o aquecimento de estufas. Os produtores de laticínios terão que obter pelo menos 70% dos alimentos para o seu rebanho no mercado local; muitos deles costumavam importar soja barata do Brasil, que gera emissões com o transporte e destrói as florestas, já que árvores são derrubadas para dar lugar aos campos de plantio. A iniciativa sueca é derivada de um estudo conduzido em 2005 pela agência nacional ambiental da Suécia no sentido de identificar de que maneira o consumo gera emissões. Os pesquisadores descobriram que 25% das emissões nacionais per capita – duas toneladas métricas por ano – estão vinculadas à alimentação. O governo percebeu que se encorajasse uma dieta mais voltada para frango e legumes e informasse os produtores rurais sobre como reduzir as emissões, haveria um enorme impacto positivo. A Suécia é um dos líderes mundiais quando se trata de descobrir novas formas de reduzir emissões. O governo sueco prometeu que eliminará o uso de combustível fóssil para a geração de eletricidade até 2020 e que acabará com os carros movidos a gasolina até 2030. Para chegar aos números utilizados nos primeiros rótulos de dióxido de carbono da sua companhia, os cientistas da Lantmannen analisaram os ciclos de produção de 20 produtos. O processo leva em conta as emissões geradas por fertilizantes, combustíveis para as máquinas de colheita, embalagem e transporte. Eles decidiram examinar um produto que representasse cada categoria – por exemplo, massa -, em vez de realizar análises comparativas entre variedades diferentes, como fusilli versus penne. “A produção de cada rótulo climático exige bastante tempo”, afirma Claes Johansson, diretor de sustentabilidade da Lantmannen. Uma nova geração de líderes suecos está se mobilizando para fazer frente à alteração climática. Richard Bergfors, presidente da Max, a rede de lanchonetes especializadas em hambúrgueres que pertence à sua família, contratou voluntariamente um consultor para calcular a sua pegada de carbono e descobriu que 75% desta está vinculada à carne contida em seus produtos. Decidiram ser honestos e publicar toda a informação para o cliente, bem como dizer que farão tudo o que puderem no sentido de reduzir as emissões. Além de exibir os dados referentes a emissões no menu, Max eliminou as caixas das suas refeições para crianças, instalou lâmpadas de baixo consumo energético e passou a usar energia elétrica gerada por turbinas eólicas. Desde que os números referentes às emissões passaram a ser exibidos no menu, as vendas de produtos que agridem menos o meio ambiente aumentaram 20%. Mesmo assim, muita gente vai para as lanchonetes de fast food decidida a comer somente hambúrgueres tradicionais. Kristian Eriksson, 26, um especialista em tecnologia da informação, parece embaraçado quando lhe perguntam a respeito do hambúrguer que está comendo em uma mesa ao ar livre. “Nos sentimos culpados ao optarmos pela carne vermelha”, diz ele.

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