quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Milhares de toneladas de lixo são jogadas anualmente no mar

Praia em Mumbai, Índia: mais plástico do que fitoplancton. Fracassaram medidas globais para proteção dos oceanos – Um relatório confidencial do governo alemão, obtido pela Spiegel Online, indica que os esforços da ONU e da União Europeia para limpar nossos oceanos fracassaram totalmente. Como os oceanos do mundo são imensos, poucas pessoas parecem se incomodar em despejar lixo neles. Mas os plásticos se degradam em um ritmo muito lento e uma grande quantidade deles está espalhada pelos nossos oceanos. Os animais marinhos consomem pequenos pedaços deles, fazendo com que muitos morram, já que os plásticos estão cheio de venenos. E, como alertam os especialistas, nós chegamos a um ponto onde está ficando até mesmo perigoso para os seres humanos consumirem peixes e frutos do mar. Dadas estas condições, a comunidade internacional vem lutando há quatro décadas por enormes esforços burocráticos visando limpar o lixo nos oceanos. Em 1973, a Organização das Nações Unidas (ONU) patrocinou um pacto protegendo os oceanos do despejo de lixo. Artigos adicionais foram acrescentados à chamada Convenção Marpol, uma abreviação de “marine pollution” (poluição marítima), em seis ocasiões diferentes. E há nove anos, a União Europeia colocou diretrizes nos livros que proíbem qualquer despejo de lixo marítimo no oceano. Ainda assim, segundo um documento confidencial de estratégia do governo alemão obtido pela Spiegel Online, se for somado tudo de bom que essas medidas fizeram, o resultado ainda seria zero. Na verdade, segundo o documento confidencial, os esforços internacionais visando proteger os oceanos fracassaram de modo geral. Nossos oceanos se transformaram em vastos depósitos de lixo. Mesmo as leis rígidas não foram capazes de fazer nada para ajudar os oceanos, declara o documento. Veja o caso dos mares do Norte e Báltico. Apesar do despejo de lixo neles ser ilegal desde 1988, a quantidade de lixo encontrada nesses mares ainda “não melhorou”. O governo também estima que, a cada ano, 20 mil toneladas de lixo chegam apenas ao Mar do Norte, principalmente de navios e da indústria pesqueira. O relatório conclui que tudo relacionado aos acordos internacionais foi “malsucedido”. Enfiando o lixo no ‘armário azul’ À primeira vista, pode parecer que a União Europeia está fazendo muito para limpar os mares do lixo. Por exemplo, a mais recente diretriz da UE sobre o assunto, de julho de 2008, visa garantir a “boa condição” dos mares da Europa até 2020. Além disso, a Comissão Europeia anunciou sua intenção de criar uma “agência dedicada, para lidar com os problemas por trás da má implantação e fiscalização da legislação europeia para o lixo”. Ainda assim, o documento de estratégia alemão não deposita muita fé nesses planos. Como veem seus autores, é “extremamente improvável” que um consenso eficaz sobre a não poluição dos oceanos surgirá no futuro previsível. Na verdade, os especialistas do governo parecem acreditar que a criação de novos acordos internacionais não é o modo certo de tratar do assunto. Em vez disso, eles acreditam que a viabilidade de futuros pactos visando proteger os oceanos deve “ser investigada antecipadamente”. Em público, entretanto, o governo federal alemão assume tons menos críticos. Em abril de 2008, a então grande coalizão de governo, composta pela União Democrata Cristã de centro-direita da chanceler Angela Merkel e pelo Partido Social-Democrata de centro-esquerda, declarou que considerava a regulamentação existente visando conter o despejo de lixo como “em princípio suficiente”. Na época, o Ministério do Meio Ambiente, Preservação da Natureza e Segurança Nuclear alemão se recusou a fornecer qualquer comentário adicional para a “Spiegel Online”. Oportunidades insuficientes de descarte Os defensores da proteção ambiental, entretanto, não são tímidos em expressar seu desalento. “Na ausência de controles e penas”, diz Onno Gross, presidente da Deepwave, uma organização de conservação do oceano com sede em Hamburgo, “aparentemente é tentador descartar seu lixo no ‘armário azul’”. Ainda assim, segundo o relatório interno do governo, o descarte do lixo marítimo de modo apropriado não é tão fácil quanto precisa ser. Como veem os autores do relatório, “oportunidades insuficientes de descarte nos portos, altas taxas e logística complicada” frustram esses esforços. Mesmo assim, eles também admitem que colocar um fim a uma maior poluição é urgentemente necessário. Os especialistas do governo por trás do relatório notam um “agravamento do problema econômico e ecológico” que terá efeitos negativos sobre os animais marinhos, assim como “custos imensos”. Eles também alertam para várias consequências sérias de saúde para os seres humanos. Por exemplo, partículas de plástico poderiam desequilibrar completamente nosso complexo equilíbrio hormonal, segundo um estudo publicado no ano passado pelos cientistas do Hospital da Universidade Charité de Berlim. Da mesma forma, segundo Richard Thompson, um biólogo marinho da Universidade de Plymouth, no Reino Unido, pedaços de plástico podem se transformar em armadilhas de veneno, nas quais substâncias insolúveis causadoras de câncer, como o DDT, ficam contidas. Um estudo recente coloca a concentração desses venenos nesses pedaços de plástico como sendo um milhão de vezes maior do que o normal. E, como alerta Gross, “quando as pessoas consomem peixe, elas ingerem esse veneno”. Quando Thompson olha para este problema, ele se preocupa com as chances de existir uma reação em cadeia perigosa. Quanto maior o animal na cadeia alimentar, mais veneno ele provavelmente terá em seu corpo. Os cientistas estão atualmente analisando quanto veneno os seres humanos ingerem quando comem alimentos vindos do oceano. Comendo plástico até a morte As aves frequentemente têm dificuldade em distinguir entre pequenos pedaços de plástico e alimento. Segundo um estudo conduzido em 2002, 80% das aves examinadas ao longo do Mar do Norte continham partículas de plástico em suas bocas. Da mesma forma, os pesquisadores do Centro Westcoast de Pesquisa e Tecnologia, com sede na cidade alemã de Büsum, apontaram recentemente que quase todas as aves marinhas (93%) no Mar do Norte apresentavam pedaços de plástico em seus estômagos. Outro estudo encontrou uma média de 32 pedaços de plástico nos estômagos dos fulmares do norte, um parente dos petréis. Com todos esses pedaços em seu estômago, as aves sempre se sentem satisfeitas, de forma que consomem menos, obtêm menos nutrientes e, em muitos casos, morrem. Um painel de especialistas disse à UE que as aves migratórias alimentam seus filhotes na Antártida com os pedaços de plástico que encontram no Oceano Atlântico. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, há, em média, cerca de 18 mil pedaços de plástico visíveis flutuando em cada quilômetro quadrado de mar. Alguns nós de lixo flutuante são até mesmo visíveis em fotos por satélite. Os pesquisadores da Fundação Algalita de Pesquisa Marinha testaram 11 locais escolhidos aleatoriamente no meio do Oceano Pacífico e descobriram que a massa de plástico era seis vezes maior do que a massa de plâncton. O plástico, com o tempo, se desintegra em pedaços cada vez menores. Mas ele leva séculos para se decompor totalmente. O fundo do Mar do Norte está saturado de plástico Um exemplo particularmente crasso de lixo marítimo está presente na Baía Alemã, uma parte da costa da Alemanha no Mar do Norte. Oito milhões de pedaços de lixo podem ser encontrados lá. Na parte sul do Mar do Norte, uma média de 575 pedaços de lixo podem ser encontrados por metro quadrado. Ao longo das praias do Mar do Norte e do Atlântico Norte, segundo o relatório do governo, cerca de 712 pedaços de lixo podem ser contados em cada trecho de 100 metros, em média. Alguns trechos contêm até 1.200 pedaços. “Não basta limpar as praias de vez em quando”, diz o biólogo Gross. De fato, até 67% do lixo vai parar no fundo do oceano. Sob as águas do Mar do Norte se encontram 600 mil metros cúbicos de lixo, segundo cálculos oficiais, aproximadamente o volume de duas pirâmides de Gizé. Cada quilômetro quadrado do leito do Mar do Norte contém um metro quadrado de lixo. Não há escassez de sugestões sobre como lidar com o problema. O documento de estratégia do governo alemão propõe começar de modo modesto. Primeiro, ele diz, critérios sobre um mar saudável devem ser definidos e a vida marinha deve ser melhor pesquisada para corrigir o “estado difuso de nosso conhecimento”. A questão sobre se métodos-padrão de pesquisa são suficientes permanece um “problema sem uma solução satisfatória”. Mas o governo também possui algumas medidas concretas que gostaria de ver implantada. “Sacos de lixo fortes” devem ser distribuídos aos pescadores, para que 500 deles possam servir como coletores de lixo do Mar do Norte. O relatório do governo também aponta as redes de pesca soltas como um grande problema enfrentado pela vida marinha no Mar do Norte. O documento de estratégia aconselha uma avaliação sobre se as redes de pesca devem ser equipadas com dispositivos localizadores no futuro. Sistemas de reciclagem também devem ser promovidos a bordo dos navios, propõe o documento. A separação do lixo também é desejada –mas não prensas de lixo, porque então o lixo “não pode mais ser identificado”. “Controles mais rígidos e penas mais altas” também devem ser introduzidos. “Os livros-registro de lixo a bordo finalmente nos dariam uma ideia do volume real de lixo produzido, diz Onno Gross, da Deepwave. Um navio de transporte comum produz cerca de 100 quilos de lixo por dia. Caso os navios descartem pequenas quantidades suspeitas de lixo ao chegarem ao porto, eles devem ser forçados a pagar “penas drásticas”, diz Thilo Maack, do Greenpeace.Gross propõe o uso das taxas portuárias para financiamento do descarte de lixo. “O sistema normalmente encontrado nas áreas de camping deveria ser usado na marinha mercante”, ele diz. Mas o governo alemão não nutre grandes esperanças de avanços. O documento argumenta que o descarte de lixo deve permanecer gratuito caso alguém espere mudar o comportamento dos marinheiros.

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