segunda-feira, 3 de maio de 2010

Irrigação capilar

Sistema de irrigação capilar aumenta a produção e reduz os impactos ambientais.
Conan Ayade Salvador, aluno de mestrado, mostra protótipo da tecnologia: uso eficiente de água, fertilizantes, defensivos agrícolas e energia elétrica. Uma linha de pesquisa coordenada pelo professor Roberto Testezlaf, da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Unicamp, avança no desenvolvimento tecnológico de um sistema de irrigação eficiente para utilização na produção de portas-enxerto de mudas cítricas no Estado de São Paulo. Contemplada pelo Edital Universal do CNPq em 2006 e novamente em 2009, a pesquisa, que envolve projetos de iniciação científica, mestrado e doutorado, está na fase de aprimoramento de um equipamento e automação do sistema capaz de garantir a redução de impacto ambiental causado pelos atuais sistemas de irrigação de portas-enxerto. “A ideia é ter um sistema fechado que garanta a recirculação da água na própria estufa em que os porta-enxertos de citros são produzidos, para redução total do descarte de soluções nutritivas ricas em nutrientes no solo”, explica Testezlaf. Para a redução de impactos, o Grupo de Pesquisa Tecnologia de Irrigação e Meio Ambiente da Unicamp propõe uma tecnologia inédita, utilizando o princípio de capilaridade. Os pesquisadores desenvolveram um equipamento de irrigação, em que a água é aplicada diretamente no substrato, evitando o umedecimento da parte aérea da planta, para ser utilizado na primeira fase de produção das mudas cítricas, conhecida como sementeira, quando as sementes são depositadas em tubetes de plástico rígido preenchidos com substrato, que, em seguida, são colocados em bancadas e irrigados. A técnica favorece o uso eficiente de água, fertilizantes, defensivos agrícolas e energia elétrica, além de evitar impactos ambientais significativos. A primeira parte da pesquisa, desenvolvida na empresa Citrograf, sediada no município de Rio Claro/SP, pelo aluno de iniciação científica João Paulo Fernandes e pelo aluno de mestrado Conan Ayade Salvador, identificou os principais componentes do processo de produção e caracterizou o perfil do produtor de mudas cítricas do estado de São Paulo, que no ano de 2007 tinha uma área de produção de até 3.000 m2 (representando 64% dos viveiristas) e produzia até 80.000 mudas anualmente (65% dos viveiristas). Os pesquisadores também constataram que 78% dos viveiristas utilizavam casca de pinus como substratos, 92% empregavam chuveiros ou tubos perfurados como sistemas de irrigação por aspersão com aplicação manual da água, 89% deles com fertirrigação, e 57% não utilizando técnicas de manejo da irrigação. As avaliações de desempenho da irrigação nesse setor da produção agrícola confirmaram que esta atividade é realizada sem controle efetivo da lâmina aplicada, gerando baixas eficiências de irrigação, com perdas significativas de água e fertilizantes. De acordo com Salvador, com o descarte de sais obtido na produção de 16,8 milhões de mudas em agosto de 2009, referentes aos seis primeiros meses do ano, seria possível produzir, utilizando os sistemas atuais de irrigação, mais 30 milhões de cavalinhos, como são chamados popularmente os porta-enxertos, o que se configuraria em lucro para o citricultor e evitaria o descarte de fertilizantes para o lençol freático. “Atuamos ao lado do produtor para mostrar que, além de contribuir para a preservação ambiental, ele pode ter lucro em razão da redução de custos e aumento da produtividade”. Imagens registradas por Salvador dão ideia do desperdício de água e solução nutritiva e da salinização provocada pela atual sistemática de fertirrigação. As experiências com o primeiro protótipo construído pelo grupo, durante os projetos de mestrado de Salvador e doutorado de Carlos Vinícius Garcia Barreto, comprovaram a capacidade de redução de impacto ambiental e de aumento da produtividade do sistema. Testada por Barreto, em sua tese de doutorado, a nova tecnologia de irrigação reduziu de 90 para 66 dias o tempo médio de produção de cavalinhos de Limão Cravo, o que garante ao citricultor uma produtividade maior ao longo do tempo em razão do maior número de ciclos de produção por ano. Após a finalização da fase de validação da viabilidade técnica para esse sistema de produção em condições experimentais, o projeto terá continuidade na iniciação científica de Antonio Carlos Ferreira Filho e no projeto de pesquisa de doutorado de Rhuanito Soranz Ferrarezi, que irão buscar a otimização da estrutura do modelo desenvolvido e a automatização do processo de fornecimento de água e nutrientes. Nessa próxima fase, o objetivo é estabelecer o manejo nutricional adequado e lançar um equipamento para ser usado em condições comerciais de produção, de acordo com Ferrarezi. O protótipo terá o seu método de automação desenvolvido no doutorado sanduíche de Ferrarezi em Athens, na Universidade da Georgia, EUA, local de destaque mundial nesse tipo de pesquisas, a fim de facilitar a operação eficiente pelos seus usuários. A expectativa é que o doutorado de ­Ferrarezi termine na escala industrial de fabricação, já que o foco da pesquisa do co-orientador norte-americano, Marc van Iersel, é automação em irrigação, a partir do monitoramento do substrato com sensores específicos, da análise de parâmetros fisiológicos das plantas e da realização da irrigação por meio de controladores eletrônicos. A escolha por trabalhar na produção de portas-enxerto de citros decorre do fato de atualmente a citricultura ser a terceira atividade de maior expressão no cenário do agronegócio do estado de São Paulo, depois da indústria sucroalcooleira e da bovinocultura de corte. Na safra de 2007/2008, o estado produziu 18,7 milhões de toneladas de laranja, representando 78,65% da produção nacional, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2009. Com valor agregado, a atividade no estado representou 97% das exportações brasileiras de suco de laranja congelado concentrado, movimentando US$ 3,2 bilhões. Atualmente, São Paulo conta com 15 mil citricultores e 540 viveiros. Em São Paulo, a produção de mudas cítricas, que são a base da citricultura por favorecer a produtividade e qualidade das frutas no campo, é regulada pela Portaria CDA-05 da Coordenadoria de Defesa Agropecuária da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, à qual os viveiros precisam estar credenciados para funcionar. Apesar de garantir a produção de mudas certificadas com controle fitossanitário em ambientes protegidos, a legislação não apresenta normas ou especificações que demonstrem preocupação com o impacto ambiental provocado pelas técnicas de manejo hídrico e nutricional empregadas na fertirrigação, durante o processo produtivo das mudas. A exigência de cobertura do solo com brita ou ráfia negra favorece o escoamento de água e nutrientes ao lençol freático, em razão da drenagem que esses materiais proporcionam. Testezlaf explica que a linha de pesquisa está voltada para o desenvolvimento de tecnologia apropriada para os viveiristas, com foco na redução total do impacto, mostrando também ao produtor de mudas a viabilidade econômica dessa mudança de paradigma com relação à prática de irrigação de portas-enxerto cítricos. A tecnologia de irrigação utilizada atualmente por viveiristas cítricos do Estado de São Paulo têm como característica a baixa eficiência e alta perda de água. Cultivados em tubetes, os portas-enxerto precisam ser irrigados todos os dias, e como a irrigação por chuveiros ou por tubos perfurados caracteriza-se pela utilização de metodologia empírica de aplicação, pode-se obter lâminas inadequadas para essa fase da produção, além da possibilidade de contaminação, segundo Salvador. Salvador salienta que, como a disponibilidade hídrica tornou-se uma recente preocupação nacional e mundial, tendo em vista que nos últimos 20 anos o consumo de água dobrou, a agricultura irrigada passou a ser o foco dos pesquisadores objetivando o uso racional deste insumo. Testezlaf acrescenta que a pesquisa desenvolvida pelo grupo começa e termina no produtor, desde a avaliação dos processos utilizados até o desenvolvimento de uma tecnologia que facilite e aprimore o trabalho dos produtores. Além da aplicação na citricultura, o sistema desenvolvido pelos pesquisadores tem potencial para ser usado em outros sistemas produtivos de mudas, como por exemplo, palmeiras diversas, mudas florestais (eucalipto, pinus e Teka), mudas de espécies nativas e exóticas (frutíferas e ornamentais), café e maracujá, entre outras espécies.

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