domingo, 29 de janeiro de 2012

A grande ausência da Rio+20

População: a grande ausência da Rio+20?
Nas últimas 3 décadas do século XX, a ONU fez Conferências sobre o Meio Ambiente (1972 e 1992) separadas das Conferências de População (1974, 1984 e 1994). Isto é um problema, pois é sabido que não há como resolver as questões do meio ambiente sem considerar os temas populacionais e não há como resolver as questões populacionais sem levar em consideração a temática do meio ambiente. Mas como são dois assuntos polêmicos foram tratados de forma separada.
Contudo, esta estratégia deixou de ser efetiva diante da dimensão dos problemas que foram se acumulando e chegaram a um ponto crítico neste início do século XXI. Existia uma grande expectativa de que as questões populacionais e de meio ambiente sejam tratadas de forma conjunta na Conferência Rio + 20, em junho de 2012.
No dia 10 de janeiro de 2012 a ONU disponibilizou o “Zero draft”, ou Rascunho zero do documento final da Rio+20 (UN, 2012), que foi fruto de reuniões, sugestões e contribuições dos países, grupos regionais, organizações internacionais e da sociedade civil. Não pretendo tratar da discussão de todo o documento, pois isto exigiria muito tempo e espaço. O objetivo aqui é avaliar se as questões da dinâmica demográfica tiveram a merecida atenção no “Zero draft”.
Analisando as 19 páginas do documento, percebe-se que a palavra população aparece apenas 2 vezes: a) “Estamos profundamente preocupados com o fato de cerca de 1,4 bilhão de pessoas ainda viverem na pobreza extrema e de um sexto da população mundial ser subnutrida, e com as pandemias e epidemias, que são uma ameaça onipresente” (p. 4); b) (…) “sendo particularmente sensíveis aos impactos sobre as populações vulneráveis”. A palavra Demografia não aparece nenhuma vez. Além disto há a seguinte constatação: “Nosso planeta suporta sete bilhões de pessoas, que deverão chegar a nove bilhões, em 2050”.
Quanto às Conferências e Declarações passadas, o “Zero Draft” faz referencia à Carta da ONU, à Rio/92, à Agenda 21, à Declaração de Johannesburg/2002, aos ODMs/2000, à Estratégia de Barbados e Mauritius, ao Consenso de Monterrey, à Declaração de Doha e Progama de Istambul. Mas não faz referência à Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (CIPD) do Cairo/1994 e nem à Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial de Mulheres, de Beijing/1995.
As Conferências do Cairo/1994 e Beijing/1995 foram fundamentais para a aprovação e a formulação dos conceitos de “Direitos Sexuais e Reprodutivos” e “Empoderamento das Mulheres”. O documento também não cita a revisão de 2005 dos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODMs) que estabeleceu a meta de número 5B: “Alcançar, até 2015, o acesso universal à saúde reprodutiva”.
Ou seja, ao não incorporar estes e outros conceitos importantes para o entendimento da dinâmica demográfica e que já haviam sido tratados ou aprovados em Conferências anteriores, o Esboço zero do documento deixa uma lacuna que pode ser muito ruim para o resultado final da Rio+20.
É sabido que existe um debate acirrado entre algumas correntes que jogam todas as culpas do mundo na população e outras correntes que consideram que a população não importa (Alves, 2011). Mas também existe visões que buscam o “caminho do meio” e consideram que pode existir uma sinergia entre dinâmica populacional e desenvolvimento sustentável e que o tratamento adequado destas questões, discutidas de forma democrática, podem ser fundamentais para o bem-estar da população e do meio ambiente. Já existem diversas iniciativas internacionais apontando caminhos nestas áreas (UNFPA, 2011 e IIASA, 2011).
Nos meses de janeiro e fevereiro vão acontecer debates em todo o mundo sobre estas questões e as negociações vão prosseguir até o mês de março de 2012. Portanto, ainda há tempo para incorporar o resultado do debate da população (humana e não-humana) no documento final da Rio + 20. Mas para tanto, as forças democráticas e progressistas precisam se mobilizar e dizer o que querem aprovar em junho de 2012. (EcoDebate)

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