terça-feira, 27 de março de 2012

Barraginha para captação de água de chuvas

Barraginhas para captação de água de chuvas, recuperação de áreas degradadas e regeneração de mananciais
A, B, C e D Fases da Mobilização
1) O desmatamento desorganizado no Brasil Central, acelerado a partir da década de 70 para produção de carvão vegetal e a conversão desses ecossistemas naturais em lavouras e pastagens, sem a utilização de tecnologias adequadas, resultou em danos irreparáveis ao meio ambiente, principalmente em relação à conservação da água e do solo, em particular na compactação do solo causada por patas de bois e por pneus de tratores. A consequência imediata foi a redução da taxa de infiltração da água no solo; iniciando o escorrimento superficial da água de chuvas, provocando erosão, principalmente do tipo laminar, que degrada e empobrece o solo, além de carrear assoreamento e poluentes aos rios, também provocando enchentes e diminuindo a sustentabilidade produtiva agrícola.
Visando reverter esse quadro, durante o ano de 1995, em Sete Lagoas-MG, com média pluviométrica de 1.350 mm, foi criada uma unidade demonstrativa numa propriedade de 70 ha na micro bacia do Ribeirão Paiol, onde foram construídas dispersamente 30 barraginhas contentoras de enxurradas, complementadas com curvas de nível, que contêm também fontes poluidoras veiculadas pelas águas, além de forçar a recarga das reservas subterrâneas pela elevação do lençol freático, armazenando água de boa qualidade na esponja porosa do solo através da infiltração, revitalizando mananciais e rios, e ainda, amenizando os efeitos das secas e veranicos em lavouras localizadas nas partes baixas das propriedades. Cada barraginha recarrega 80m3, de 10 a 15 vezes ao ano, transferindo um volume de 800 a 1200 m3 ao lençol freático, ao custo de R$0,03/m3 (três centavos cada m3 no primeiro ano), e R$0,01/m3 acumulados em 3 anos.
2) Em virtude do êxito dessa unidade, após veiculação na mídia, dias de campo, visitações etc, durante 2 anos, resultou num projeto piloto com a construção de 960 barraginhas (mini açudes) a baixo custo, durante o ano de 1998, em 50 pequenas propriedades, envolvendo toda a micro bacia do Ribeirão Paiol, na comunidade da Estiva, em Sete Lagoas-MG. Isso só foi possível graças à mobilização e conscientização dos produtores durante os eventos citados, resultando na aceitação desta tecnologia e gerando expectativas. Também foi importante a parceria entre a EMBRAPA, a Secretaria de Agricultura Municipal, a EMATER e a Secretaria Nacional de Recursos Hídricos e associação comunitária da Estiva.
Inicia-se uma demanda de visitações, ocorrendo 32 nos últimos 5.0 anos, “fase B de mobilização”, sempre após um primeiro contato que pode ser uma palestra ou reuniões, constituindo a “fase A”. Todas visitas (fase B), foram complementadas com treinamentos em suas comunidades, “fase C”, sendo possível cortar o cordão umbilical e a partir daí, caminharem com os próprios passos, dando início à “fase D”, é a da disseminação na própria comunidade e vizinhas, gerando filhotes. Nesta fase D, após 3 a 6 meses normalmente são realizados dias de campo comemorando a barraginha de numero 50, 100, 200 etc, sendo uma forma de manter contatos, mantendo viva a mobilização, ficando marcado um próximo evento daí há 6 meses para comemorar a 500, ou 1000, etc, normalmente em forma de seminários regionais. Neste estagio temos no ano de 2002 os municípios de Janaúba e Bocaiúva no semiárido Mineiro e Minas Novas no Jequitinhonha. Passaremos a abordar de agora em diante a mobilização de Minas Novas em suas fases A, B, C e D. Fase A, primeiros contatos, ocorreu em abril de 2001, a fase B, visita ao projeto Piloto em junho de 2001, a fase C, treinamento em novembro de 2001 e a fase D, que é a caminhada com os próprios passos, iniciou-se a partir de janeiro de 2002, fase esta que abordaremos com riqueza de detalhes.
3) Abordaremos os custos no município de Minas Novas no Vale do Jequitinhonha e o do programa em geral no Estado.
Em Minas Novas:
Coordenação: Secretário Municipal de Agricultura, com 20% de seu tempo, durante 10 meses = R$ 6.000,00
Técnico agrícola para diagnóstico, escolhas de locais para construção das barraginhas, com 100 % do tempo durante 10 meses = R$ 8.000,00
Veiculo de apoio durante os 10 meses, 9.600 km rodados = R$ 3.800,00
Operador de máquina por 10 meses = R$ 5.000,00
Depreciação de uma máquina de custo R$ 180.000,00, (recurso do orçamento participativo) em 10 anos = R$ 18.000,00.
Óleo diesel: 14.400 litros por ano - R$ 21.000,00/ ano (recurso do orçamento participativo).
Custo total = R$ 71.8000,00, correspondendo a R$ 287,20/ barraginha, ao ser rateado pelas 250 construídas em 2002.
No Estado, em geral:
Nas 34 atividades ocorridas em 2002, os custos aproximados são os seguintes:
34 viagens a custo médio de R$ 250,00/viagem, (hotéis, alimentação, combustíveis, diárias do motorista, material didático e outros, todos os custos cobertos pelas prefeituras locais= R$ 8.500,00).
Salários do autor e coordenador do projeto com 100% do tempo disponível = R$ 50.000.00/ano.
Outros apoios de colegas indiretamente: 5% de 4 pesquisadores = R$ 10.000,00/ano.
Da Embrapa, telefone, veículos, salas etc, = R$ 5.000,00.
Total aproximado de R$ 73.500,00/ano.
4) A estrutura física e de recursos humanos utilizados no projeto provêm das Secretarias de Agricultura dos municípios participantes e das agências da EMATER-MG, que acompanham o trabalho, bem como do centro de pesquisa da Embrapa em Sete Lagoas, que aloca técnicos especializados para elaborarem e orientarem a condução dos projetos.
Anexos ilustrativos:
5) Durante o ano de 2002 foram implantados no Estado de Minas Gerais 34 ações, sendo 12 palestras na fase A, em primeiros contatos, 8 visitas ao Piloto na fase B, e 8 treinamentos na fase C e 6 dias de campo na fase D; em todos as 34 ações houve palestras mobilizadoras.
Nos últimos 5 anos foram realizadas 120 palestras, iniciando-se a mobilização direta de mais de 6.000 reeditores na fase A, sendo 1.200 técnicos. Hoje, dispersamente o projeto soma acima de 25.000 barraginhas no Estado de Minas Gerais, destacando-se em torno de 10.000 na região pioneira de Sete Lagoas, 2.000 em Buritis, 500 em Janaúba, 250 em Minas Novas, 1.000 em Pitangui, dentre outras.
6) Ao assumir a prefeitura de Minas Novas em 2001, D. Telma, mulher e freira, contrata um assessor em planejamento para elaborar um programa baseado em orçamento participativo, após pesquisa nas principais comunidades, de um total de 120, onde 70% das pessoas ainda vivem na zona rural. Para surpresa, a prioridade número um foi a coleta de água das chuvas em açudes.
A fase A, primeiros contatos, efetivou-se em abril de 2001, com a vinda da D. Telma à Embrapa para conhecer o projeto piloto de “barraginhas”. A fase B ocorreu em junho e em novembro ocorreu o treinamento (fase C), onde foram construídas duas barraginhas demonstrativas, gerando expectativas e após o corte do cordão umbilical, a prefeita sentiu que seria uma grande frustração não partir logo para a prática, porque já chovia e queriam armazenar as enxurradas, mas não tinham máquina. Devido a coordenação ter portas abertas com a FIAT, conseguiu-se uma máquina por empréstimo por 3 meses, de junho a agosto de 2002, provocando a decolagem das barraginhas no município. Nesse período ocorreu a construção das primeiras 150 barraginhas mediante cobertura com recursos do orçamento participativo para custeio do óleo. Encerrado o empréstimo, D. Telma resolveu adquirir uma máquina com recursos próprios, devidos as proporções da mobilização e geração de expectativas, e esta construiu a barraginha de numero 151 no dia 26/08/2002, em um dia de campo festivo, na comunidade de São Bento.
Durante o ano de 2002 foram construídas 250 barraginhas, em média de 500 a 1.000 m3 de volume cada, atendendo as necessidades de água para animais, hortas e lavouras na parte inferior, aproveitando os merejos úmidos para sub-irrigá-las, e também para consumo humano. Além de proteger o solo, regenerando-o e enverdecendo-o e principalmente criando nessas pessoas confiança, ânimo e dignidade, para continuar a trabalhar o solo, esquecer a migração, criando nos filhos uma atmosfera sustentável, fortalecendo o apego e amor à terra e à convivência comunitária.
Cria-se também um clima de solidariedade, onde eles sentem que aos açudes das cabeceiras, de cima beneficiam os localizados no meio e os medianos beneficiarão os abaixo e, no final, todos ganham, criando uma teia, onde todos saem fortalecidos, principalmente pela revitalização dos mananciais.
7) Encerrada a fase C, de treinamento, as comunidades começam a caminhar por seu próprios passos, a construir suas barraginhas, a disseminar a ideia e plantar sementes e aí corta-se o cordão umbilical, mas os laços de comprometimentos são mantidos através de dias de campo festivos, onde as demonstrações da tecnologia exercitada serão apresentadas pelos técnicos ou líderes comunitários aos visitantes, para comemorar a barraginha 50, ou 100 etc., sendo uma forma de dar manutenção e realimentar a mobilização.
Em 1998 foi implantado o Projeto Piloto I, em Sete Lagoas, atualmente está sendo implantado o Projeto Piloto II em Janaúba, no Norte de Minas, com 500 barraginhas contentoras de enxurrada, em uma parceria entre a Embrapa/ANA/Prefeitura de Janaúba, e o Projeto Piloto III, para o Vale do Jequitinhonha, que nasceu naturalmente em Minas Novas, em 2002, e estima-se que sejam construídos acima de 1.000 reservatórios colheitadores de águas de chuvas no município nos próximos dois anos.
O projeto de Minas Novas tem dados imensuráveis como: ao furar uma cacimba na parte inferior do lago e coletar água de boa qualidade, estão sendo evitadas caminhadas de 3 a 5 km de mulheres e crianças, para trazer água de qualidade duvidosa, ao garantir também hortaliças e lavouras nos baixios, em que o binômio “água e alimentos” garante saúde e sustentabilidade, eliminando-se as filas nos hospitais, liberando médicos e leitos hospitalares.
O projeto nunca se encerra, pois o exercício sistemático da consciência ambiental, a simplicidade, a clareza, o baixo custo e o alto benefício incentivam sempre estar fazendo mais tanques, coletando a água onde ela cai, sem deixá-la escorrer, cicatrizando-se as erosões do solo, regenerando e enverdecendo. Este somatório cria ânimo e confiança e as pessoas se abrem para receber novos ensinamentos e tecnologias.
8) Os itens 6 a 8 são os pontos fortes deste projeto, por serem soluções simples, criativas, de fácil execução e de baixíssimo custo, também por terem efeitos rápidos, dois meses após iniciadas as chuvas já são notados os seus efeitos, contagiando técnicos, prefeitos e comunidades, integrando parceiros e consolidando comprometimento. Também cria empregos, toda família trabalha e tem ingressos, como também ocorrem reflexos positivos no abastecimento de água para a cidade, pois as
águas oriundas destes vales terão poucos gastos com tratamentos; por isso, este projeto deve ser olhado com bons olhos pela sociedade urbana, pois ela também é uma beneficiária indireta sendo até possível excluir a palavra apagão de seu vocabulário, se ela apoiar ações nesse sentido.
Retornando de Kyoto no dia 25 de março último, onde participamos do 3º Forum Mundial da Água, trazendo muitas ideias, mais ânimo, muitos contatos e portas abertas, destacamos algumas frases que vimos: “Tank is Bank” (Nova Zelândia), “Water, Romance e Tradition” (Índia), “Rain falls on our land, it is ours” (Austrália). Estas expressões têm o mesmo sentido da analogia do namoro à moda antiga, a qual praticamos em nossas palestras sobre as quatro fases da mobilização: Fase A: primeiros passos seria o “pegar na mão”;
Fase B: visitas aos pilotos, o ”primeiro beijo”;
Fase C: treinamento, o “noivado” e a
Fase D, comemoração em dias de campo, o “casamento”. A fase D, contínua com atividades periódicas, para manter acesa a chama da manutenção e comprometimento, tornando longa e atraente a lua de mel. Assim, temos hoje acima de 6.000 reeditores, sendo 1.200 técnicos, frutos de diversas ações e mais de 120 palestras nos últimos 5 anos. Isto não é sonho, estamos hoje presentes em 32 municípios, em várias fases, e durante o ano de 2002 treinamos os 225 técnicos da extensão rural (EMATER) do vale do São Francisco Mineiro, para nivelar e falar a mesma linguagem da captação da água de chuvas e do sistema barraginhas. (multiplycontent)

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